sábado, 21 de dezembro de 2013

 “DIAGNÓSTICO DE NOSSO TEMPO”

PADRE JOÃO MEDEIROS FILHO (pe.medeiros@hotmail.com)

Em 1943, Karl Mannheim (1893-1947), sociólogo húngaro, de origem judaica, escreveu um ensaio com o mesmo título, traduzido para a língua portuguesa e publicado no Brasil, em 1961, pela Zahar Editora. Ali, o ilustre escritor analisou os paradoxos do seu tempo, como posteriormente fizera o cronista e comediante americano George Carlin (1937-2008), quando endereçou uma carta a sua esposa. Na verdade, verificam-se situações contraditórias e controversas no comportamento humano e social.

Estamos chegando ao tempo do Advento, que nos prepara para o Natal. As casas e edifícios, lojas e shoppings, ruas e cidades engalanam-se em nome da grande festa do cristianismo. Mas, o personagem principal (Cristo) fica esquecido e relegado a um plano inferior. Fala-se de tudo, menos Dele. Urge que Deus e o Sagrado sejam presentes. No entanto, o Divino parece cada vez mais distante da terra. Em seu lugar, cultuam-se e cultivam-se o consumismo, o egoísmo, o hedonismo e outros tantos ismos. No passado, dava-se primazia à alma. Quando éramos jovens, costumavam perguntar: “Quantas almas tem sua paróquia?” Atualmente, o corpo tomou o seu lugar. Há uma sacralidade corporal. Não a que entende o apóstolo Paulo, quando adverte: “Acaso ignorais que vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que mora dentro de vós”? (1Cor 6, 19).

Temos a sensação de que o mundo perdeu o seu rumo, como um trem que se descarrilha. Hoje, Deus torna-se a autoimagem, a sede e fome da beleza exterior. A religião é o culto do corpo. A fé reside na estética. O ritual virou malhação, aludiu o músico paraibano Herbert Vianna (1961-). Leva-se mais tempo nas academias do que nas missas. Temos mais novelas do que novenas.

Vários consideram o amor ultrapassado. A sinceridade para muitos é insignificante. Para outros a honestidade é ridícula. É válido roubar, perverter, trapacear, seduzir, subornar, corromper etc. Mas, envelhecer e enrugar são motivos de vergonha. Não raro, ser desonesto é sinônimo de sucesso. A ética é sufocada por interesses políticos, socioeconômicos. Pouco importa o bem, o que vale é a “realização” pessoal. O outro não conta. Deus é realmente um substantivo abstrato, etéreo (nada de eterno) e desconhecido.

Dissera Carlin: “Multiplicamos nossos bens, mas reduzimos nossos valores. Falamos demais, amamos raramente, odiamos frequentemente.  Aprendemos a sobreviver, mas não a viver. Adicionamos anos à nossa vida e não vida aos nossos anos”. Fomos à lua e voltamos, mas sentimos dificuldades em cumprimentar o vizinho no elevador. Lançamos foguetes, satélites, numa palavra, conquistamos o espaço, mas não o nosso. Chegamos a dominar o átomo, mas não os preconceitos. Aprendemos sim a nos apressar e não a esperar. Uma frase desse autor norte-americano resume bem: “Temos edifícios mais altos e pavios mais curtos; estradas mais largas e pontos de vista mais estreitos”.

Dirigimos automóveis cada vez mais velozes e sofisticados, porém somos lentos para compreender ou perdoar. Por vezes, ficamos acordados até tarde, mas a caridade não é a causa de nossa insônia. Lemos pouco, passamos horas vendo televisão, filmes, navegando na internet etc. e oramos raramente. Hoje, temos mais remédios e menos saúde. Há pílulas para tudo: obesidade, tristeza, impotência, insônia etc. Quando vão descobrir algo que nos desperte realmente para Deus ou nos sacie Dele?

Será que neste Natal vamos nos lembrar da frase de Cristo à samaritana, junto ao poço de Jacó: “Ah! Se tu conhecesses o dom de Deus”? (Jo 4, 10).

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