quarta-feira, 20 de outubro de 2021

 

Minhas Cartas de Cotovelo – verão de 2021-45

Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes

ENCONTROS E REENCONTROS

   

        Que alegria é a liberdade. Depois de um longo período de reclusão       involuntária, decorrente da pandemia, eis que tive a oportunidade de reentrar em um ambiente que no passado era o meu cotidiano – individualmente ou com a minha inesquecível Therezinha.

Estava no Supermercado Nordestão e lá, entre as suas prateleiras, encontro o meu estimado amigo Rubens Lemos Filho – Rubinho, com quem troquei abraços e registramos em foto. Na oportunidade parabenizei-o pela vitória do ABC e seguimos nossa vida a fazer compras.

Titubeei entre as prateleiras, pois algumas mudaram de lugar, mas logrei, sem jeito, completar a minha missão de tantos anos.

Descendo ao térreo, novos encontros na lanchonete de Verinha – o meu ex-aluno, Desembargador Federal Eridson Medeiros, Djalma Praxedes, Professor José Antônio e Isabel de José Correia de Azevedo (Zequinha). Bons e alegres papos, tudo numa manhã só.

Na semana anterior já tivera um reencontro maravilhoso com os meus companheiros do Rotary Clube Natal – Sul, onde a satisfação estava estampada no sorriso de cada um, como também outros dois momentos gratificantes – um em reunião formal da ALEJURN, quando fui orador de homenagem ao querido colega Eider Furtado e ocasiões das reuniões pontuais do café com letras (ou com leite também!) e o outro na Academia Norte-rio-grandense de Letras, na solenidade do centenário do acadêmico Aluízio Alves, onde reinava a alegria do reencontro, posto que os homenageados mereciam esse sentimento porque estão em lugar privilegiado, perto de Deus.

Voltou à normalidade o nosso encontro semanal da Confraria do Café Avenida, onde voltamos a resolver os problemas locais e do mundo. Também a frequência nas padarias e lanchonetes. O Sebo Vermelho de Abimael

Em Cotovelo o reencontro familiar foi rico, com os filhos, netos e amigos, voltando a alegria em torno da lembrança da eterna dona da casa, em seu santuário ali criado, com suas fotos e os santos da sua devoção. Ainda deu tempo para visitar a Primeiro Agro-feira de Pium, onde comprei dois livros do meu interesse.

Com essa liberdade recupero a minha estabilidade emocional, pois a física ora está boa, ora claudicante por conta das pernas – nada que impeça minha passagem pela passarela em direção do mar aconchegante.

Enfim, a vida está – gradual e vagarosamente voltando ao normal, aguardando os trancos que teremos no próximo ano, com a campanha eleitoral, não participando, mas observando e orando nas minhas missas diárias pela internet pelo bem do Brasil, algumas vezes de forma presencial, com o meu amigo da Paróquia de São Pedro, Padre Francisco Motta ou a Igreja de São Francisco de Pirangi.

Tudo isso para registrar a beleza da liberdade – bem maior da natureza humana, como proclamava o grande Emmanuel Kant, invocado repetidas vezes pelo meu saudoso Professor Floriano Cavalcanti.


 ACOMODAÇÕES DA 25ª HORA


Valério Mesquita*

Mesquita.valerio@gmail.com


A frase do ex-deputado federal pernambucano Thales Ramalho de que “maior que a ilusão política só a ilusão do amor” é de uma verdade tão cristalina que me fez refletir mais ainda sobre os últimos dias de Pompéia. A deterioração dos costumes políticos, as debandadas, as infidelidades à 25ª hora, a substituição das coligações eleitorais pela proliferação de legendas partidárias, as adesões no varejo e no atacado em tom promocional e de liquidação; a troca de legendas antes mesmo de o candidato assumir o mandato, tudo conduz o eleitor ao descrédito da vida pública, estarrecido com a conduta pérfida dos seus protagonistas. Em nome da mudança, do novo, do diferente, alguns agentes políticos estão destruindo a própria biografia no jogo vantajoso das premissas e das facilidades dos governos que estão por vir. Nunca a flauta mágica do fisiologismo tocou tão alto desbotando clichês, ruborizando os céticos e dissolvendo bancadas tal e qual o efeito sonrisal.


O que está acontecendo hoje com a chamada classe política? Deu a louca no mundo? É tão grande assim o impacto das dívidas e das dúvidas pendentes da campanha que passou? Dir-se-á que os partidos vencedores quando trocaram a ideologia pela convivência dos contrários, os partidos de direita e de centro perderam o pudor e se misturaram no mais estranho e promíscuo hibridismo partidário da história política do país.


Já que não posso entender, após exaustivas reflexões, espero que tanta gente junta dê certo, tanto aqui quanto alhures, como diria o nosso saudoso Paulo Macedo. Talvez isso tudo seja mesmo uma fogueira das vaidades. E ponto final. Tudo é mesmo ilusão. Nada além de uma ilusão, sobre a qual nos falava o saudoso ator e comunista Mário Lago.


Refletir sobre os fatos e factóides da vida talvez seja a melhor postura diante do mar de Cotovelo. O dom da observação é importante para aprender a viver e dissipar os contrapontos insurgentes. Ergui-me da rede para repensar o imponderável. Vamos devagar com o andor que o santo é de barro e não faz milagre.


Para o conhecimento do crítico de cinema Valério Andrade, o cenário é o mesmo, os figurantes idem. Mudam os atores, os diretores, produtores e roteiristas. A trilha sonora continuará sendo o hino nacional de Fafá de Belém, e por aqui a velha e ilusória marchinha carnavalesca “mamãe eu quero, mamãe eu quero mamar...”. E o filme? O filme é o mesmo para que muitos, mais tarde, possam repetir novamente: já vi essa fita antes.  Está escrito que, na história da humanidade, todos haverão de passar e que o Messias prometido só existiu um. E uma Cleópatra, também. Política, enfim, é mais do que circunstância. É ilusão, mesmo. E muita vaidade. É ilusão gratulatória.


(*) Escritor.


 

 

A PRIMAZIA DA INSENSATEZ

Tomislav R. Femenick – Mestre em economia, com extensão em sociologia e história

 

Alguns psicólogos, neurocientistas e outros estudiosos da mente e do comportamento humano admitem que a cosmovisão e a maneira de agir dos indivíduos têm origens em três fatores: a) a genética, isto é, o conjunto de qualidades transmitidas dos pais aos seus descendentes; b) o meio ambiente em que eles vivem, considerando, também, o lugar e a época; e c) a autodeterminação, ou seja, o dom de decidir por si mesmo, fazendo livre escolha para sua forma de pensar e agir perante fatos e ideias. Os pensadores divergem entre si sobre qual determinante é mais preponderante. Entretanto, é aceito que esses elementos – a genética, o meio ambiente e a autodeterminação – são a base da inteligência (do latim “intelligens, entis”, que compreende, que conhece), a capacidade que as pessoas têm para formulações lógicas, para a abstração e, principalmente, para a compreensão das narrativas e dos fatos.

Recentemente, a revista Veja publicou uma matéria sobre o assunto, em que constata um fato constrangedor. Depois de décadas em que a inteligência humana (medida pelo QI) evidenciava um crescimento constante, desde o início deste século o quadro se inverteu. Se antes os filhos se mostravam mais argutos que seus pais, hoje eles são menos interessados e mesmo alheados sobre assuntos do mundo em sua volta.    

Por outro lado, o jornalista Spike Dolomite, do site norte-americano “Medium Daily Digest” (spikedolomite.medium.com) publicou uma matéria intitulada “O Desfile dos Idiotas” (tradução livre) na qual ele cita alguns exemplos: embora o Texas tenha ultrapassado quatro milhões de casos de covid, aquele Estado e mais vinte e três outros estão planejando processar Presidente Biden pela obrigatoriedade das vacinas. Isso só vem a comprovar que, desde a eleição de Trump, houve uma regressão cognitiva lá “pras bandas dos states”. 

Diz ele: “Nunca seremos capazes de superar a Covid, a menos que esses estados admitam que estão errados e mudem seus caminhos. Latinos e negros americanos estavam relutantes em tomar a vacina, por razões culturais, mas, desde a obrigatoriedade, ambos os grupos alcançaram o grupo caucasiano em números. O único grupo indiferente são os republicanos. O número de republicanos que foram vacinados é de pouco mais de 50%. Os democratas são mais de 90%. Os democratas usam máscaras e são vacinados para proteger a si mesmos e aos outros de um vírus mortal. Os republicanos se recusam erroneamente e deliberadamente a usar máscaras e a se vacinar porque querem que o mundo inteiro saiba que eles não estão evoluídos e não dão a mínima para outras pessoas”.

Como lá, aqui por estas plagas abaixo da linha do Equador, onde nada é pecado, temos um presidente negacionista, ministros se vacinando escondido (para não contrariarem de Sua Excelência), a primeira-dama recebendo a vacina em Nova York, e mais de seiscentos mil óbitos atribuídos à covid 19. No entanto, o senhor presidente continua achando que quem toma vacina pode virar jacaré. Isso tudo enquanto o Conselho Federal de Medicina e alguns planos de saúde se apegam à autonomia médica, para justificar receituários fora da ciência, tão somente por convicção política ou por obstinação pessoal. E tome entrevistas em rádios e TV’s, aparições de vídeos nas redes sociais, tudo em busca de se transformarem em celebridades; se possível recebendo uns trocados, miúdos ou graúdos. Realmente este é um país da consagração das idiotices.

   Será que esse é o Brasil em que eu nasci? Basta ver as notícias do cotidiano escalafobético. Dois esteios do liberalismo econômico pátrio, ocupantes de altos cargos da administração federal foram pegos “em arapuca de pegar gambá”. O Ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central, responsáveis por dar credibilidade à política econômica do governo, têm dinheiro aplicado em paraísos fiscais. É legal? É. É moral ou pelo menos recomendável que assim ajam?  Não. Como esperado, o Congresso fez alarde, convocou os maljeitosos agentes públicos, etc. e tal. E nós? Nós vamos esperar os próximos capítulos dessa horrenda novela mexicana.

 

Tribuna do Norte. Natal, 20 out. 2021