A NUDEZ DA SOLIDÃO
Valério Mesquita*
Existe uma doutrina
defendida pelos monges trapistas do Tibet – até hoje não superada – de que ninguém administra sozinho. E um
corrente mais ortodoxa complementa: não se ganha eleição sozinho. No Brasil,
desde 1947, os pleitos majoritários e democráticos que elegeram Getúlio,
Juscelino, Jânio, Fernando Henrique, Collor de Melo, Lula da Silva e Dilma
Rousseff, resultaram de uma miscelânea de partidos. Todos governaram (?) com as
facções que davam suporte político, não apenas no Congresso mas também nos
aluguéis dos ministérios. Os novos tempos da Lava a Jato e seus registros
criminais sepultaram as disputas ideológicas além das político-partidárias.
Abriu-se uma fenda abissal na cabeça do povo que sepultou imenso contingente de
seletos malfeitores. Posturas de governos de cama e mesa morrem todo dia
vitimas da inexorabilidade do tempo e do fastio do povo.
Levantando-se voo do
aerofágico campo de aviação de Brasília, aterrisso no aeroporto Aluízio Alves.
Logo na pista de pouso pergunta-se: pode um governante administrar o Rio Grande
do Norte sem o apoio popular e com o silêncio do poder legislativo? Nesse
quadro de incertezas costura-se o longo caminho de alianças partidárias,
políticas, lotéricas, familiares, sindéticas, assindéticas, históricas e
histéricas. Fica evidenciado que governo não pode ser de um homem só. E que a
política nesse verão é um mar de naufrágios fatais. Para o povo, o político
continua sendo aquele indivíduo fraco e defeituoso. E não somente ele, mas
todos os poderes institucionais. A máquina estatal tem que diminuir de tamanho
e extirpar os privilégios. Vai ter que poupar mais ou tanto quanto a mulher de
Patufas que era tão econômica em todas as coisas, que, mesmo fazendo amor,
poupava o gemido.
A preocupação hoje é
com a voz rouca das ruas para que não se torne amanhã uma bronquite pneumônica.
É quando o verbo votar passar a ser intransitivo e irrefletido. Dir-se-á que os
políticos abominam mudança eleitoral. O sufocamento da verdade e da
transparência nessas transações eleitoreiras, eles consideram um charme e não
uma feiura, uma paranoia, tal o corporativismo. No Rio Grande do Norte há um
cheiro de pólvora no ar. As aparências não enganam. Vultos furtivos, à
espreita, preparam escaramuças. Mãos anônimas tecem fios de discórdia. Há muita
vaidade em jogo. A praça 07 de Setembro lança labaredas mais altas que as
torres da telefonia celular lá nas dunas que serpenteiam Natal. A meu ver, a
aliança da governabilidade está trincando. O compadrio do poder deixa escapar
surdos gemidos e não nega, sequer, as flatulências. A temporada gastronômica
que precede os abalos sísmicos da política estadual já começou. Querem almoçar
bacurau ao molho pardo. E numa churrascaria um grupo de partisans pediram
tucanos ao vinagrete.
O fato é que os
observadores da cena política, mesmo sendo dezembro um período natalino, estão
se surpreendendo sem razão. O ano da graça de 2018 está às portas. Aqui, hoje,
sorrisos punhais escondem. Nessas incertezas, se outra for a leitura é porque
tá todo mundo enrolando. E a sucessão governamental? Li numa coluna de estudos
científicos que a seca no Rio Grande do Norte possui um estranho designo de
engravidar os partidos políticos. As alianças repentinas sem uso de
preservativo podem produzir efeitos deformadores. Estudiosos no assunto já
classificam a promiscuidade política como transtorno de conduta. E se ocorrer
inverno no inicio de 2018, a sua fúria pode romper adutoras e até velhos
compromissos que não são eternos. Por enquanto, disse-me um prefeito, que “é
melhor sofrer no poder do que longe dele”. Lembre-se o gestor público que o
verdadeiro dono do mapa e da mina é o povo.
(*) Escritor.