terça-feira, 20 de abril de 2021

 

A Basílica de Acari

Padre João Medeiros Filho

Nossa Senhora da Guia é uma invocação mariana ligada ao dogma da Assunção, cuja festa é celebrada em 15 de agosto. Subindo aos céus, Ela tornou-se guia de nossa peregrinação em busca da Pátria definitiva. Historicamente, a devoção teve origem na Igreja bizantina, no século VII, onde a Mãe de Cristo é venerada como "Hodegétria” (orientadora de caminhos). Um ícone retrata Maria com o Menino Deus no colo, indicando-o como o caminho (Jo 14, 6). Por esta razão, passou a ser louvada como “estrela nos mares de nossa vida”, segundo o poeta Claudel. O culto foi adotado no Ocidente, desde o século XI, difundindo-se em vários países, inclusive Portugal. 

Os lusitanos trouxeram a veneração para o Brasil. Na corte, comemorava-se a solenidade junto com a do Senhor do Bonfim. Segundo pesquisadores, nas primeiras décadas de 1700, um capitão da Marinha Real aportou em Salvador (BA), trazendo as imagens de Nossa Senhora da Guia e do Senhor do Bonfim. Ambas foram entronizadas na Igreja da Penha, em Itabagipe. Portugal de antanho voltava-se para as atividades marítimas, associando o orago à proteção contra os oceanos bravios. À época, nos sertões seridoenses, de atividade pastoril, havia necessidade de tanger rebanhos por fazendas e lugares incertos (potiguares e paraibanos). Os tangedores suplicavam o auxílio da Virgem Mãe da Guia para chegar aos seus destinos. Começa assim tal crença, nas plagas do Acari, em 1737. Posteriormente, em 1790, chegou a Patos (PB), uma das possíveis rotas dos tropeiros.

Inegavelmente o culto secular a Maria Santíssima, no Seridó, já seria motivo digno de todas as homenagens dos fiéis. A Paróquia de Acari é a primeira freguesia do Seridó dedicada à Mãe de Deus e a segunda erigida naquela região. Foi desmembrada de Santana de Caicó, em 1835. Na sua criação, pertencia à diocese de Olinda (PE), cujo bispo Dom Frei João da Purificação Marques Perdigão era natural de Viana do Castelo (norte de Portugal), onde se reverencia também Nossa Senhora com tal invocação. Entretanto, não bastariam apenas argumentos históricos para elevar a matriz acariense à dignidade de basílica, a única do RN até o presente.

Acari sempre se distinguiu por sua piedade mariana. Hoje, fala-se em Terço dos Homens. No entanto, já nos idos de 1950, a oração era ali rezada piedosamente com significativa presença masculina, liderada por Artur Cortez, pai do inolvidável Padre José Dantas Cortez. “A liturgia e os atos religiosos na Matriz do Acari nada deixam a desejar aos ritos e cerimônias dos importantes templos brasileiros e europeus”, ressaltava Dom José Adelino Dantas, segundo bispo de Caicó. É digno de encômios o esmero do canto sacro nas missas e novenas solenes, legado do exímio compositor Felinto Lúcio Dantas. A vivência espiritual mariana da Matriz da Guia marcou também as paróquias dela nascidas. Primeiramente, Jardim do Seridó surgiu sob a égide de Nossa Senhora da Conceição. Florânia floresce com o culto à Senhora das Graças (Santuário do Monte). Cruzeta tem sua matriz consagrada à Virgem dos Remédios. Currais Novos, além de uma comunidade paroquial devotada à Imaculada Conceição, herdou de Acari o amor ao Coração de Jesus e a Cristo Eucarístico: “Rei eterno, Deus humanado..., milagre sublime de amor”, na poesia de Monsenhor Paulo Herôncio. Em Carnaúba dos Dantas, as capelas do sopé e cimo do Monte do Galo são sentinelas do amor à Virgem Santíssima. Alguns afirmam que a advocação de Nossa Senhora do Ó, em Serra Negra do Norte, teve influência dos boiadeiros acarienses.

Celeiro de vocações religiosas é Acari. Doze de seus filhos foram ungidos presbíteros. Destaca-se Dom Eugênio de Araújo Sales, primeiro cardeal norte-rio-grandense, figura notabilíssima no cenário da Igreja. Cabe registrar o contributo do Padre Flávio José de Medeiros Filho, que vem prestando relevantes serviços ao Vaticano. Terra agraciada com ilustres sacerdotes, berço de uma linhagem de músicos sacros, monumento erguido à fé católica e a Maria, eis Acari! Indubitavelmente, sua matriz é merecedora do título de basílica. Etimologicamente, o termo significa casa do rei e da rainha. De modo inspirado e solene, o Papa Francisco proclamou que no solo seridoense há uma morada especial para a Rainha do Céu, o templo de Nossa Senhora da Guia!

segunda-feira, 19 de abril de 2021

 


Minhas Cartas de Cotovelo – verão de 2021-24

Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes

 

A FORÇA DO PROGRESSO

        Em minha última passagem por Natal, forçosamente visitei as paisagens de costume do Barro Vermelho. Contudo, apesar de previsto, tomei um grande e emocional susto, quando diante de mim estavam as demolições das casas da Rua Meira e Sá, 118, 120 e 128, respectivamente de propriedade do meu sogro Rocco Rosso, do meu pai José Gomes da Costa e do meu tio Dr. Sérgio Guedes da Costa, para ali ser erguido o Residencial Rocco Rosso, denominação do edifício, escolhido democraticamente por sorteio.

        Eram três edificações antigas, a mais longeva era a 118, do imigrante Rocco Rosso, que chegou ao Brasil no ano de 1926, passando por diversos estados, até chegar ao Rio Grande do Norte, em Natal, onde peregrinou por várias residências, de Parnamirim e Natal, até adquirir a casa que pertencia a família Bandeira; as outras duas são dos anos 40 e 50. Todas elas com muitas histórias de esperança, dor, projetos, sonhos, amores e desamores, doenças e desencarnes, alegrias, tristezas, certezas e incertezas, grandes momentos de fraternidade, estudos,  enfim, luzes que clareiam o mundo, vidas que se criam e se apagam, nada mais, sonhos e devaneios – o que se foi prá nós não voltará jamais – agora é só saudade.


 

 

 

 



Onde vais tu,esbelto infanter?

                Hoje é o DIA DO EXÉRCITO, a força amada onde, com muita honra, servi durante o ano de 1959 na Companhia de Comando e Serviços - CCS, como Cabo Carlos, nº 604.

            Nesse período fiz inúmeras amizades que ficaram fincadas no solo fértil da lembrança e recebi os ensinamentos mais sagrados do amor à Pátria.

            Todos os hinos fundamentais do Brasil ali foram ensinados e cantados com o ardor de jovens soldados engajados para manter a liberdade e a democracia.

            Registro, em especial, que o Comandante Geral do meu tempo foi o Tenente Coronel DIÓSCORO GONÇALVES VALE, do Seridó potiguar, pessoa honrada e educada, que sabia ouvir os apelos dos soldados e tomar as medidas necessárias ao atendimento. Seu auxiliar foi o Coronel Rolindino Manso Maciel.

            O meu Comandante de Companhia foi o Capitão Mílton Freire de Andrade, homem que vibrava com a caserna e transmitia aos seus subordinados confiança e patriotismo.

            No comando do setor de serviços gerais, espécie de Prefeito, estava o meu tio Major S1 Francisco Gomes da Costa, de quem me escondia no término do expediente, onde todos se encaminhavam para a saída do quartel, para que ele não me visse e oferecesse carona – eu fazia questão de não aceitar nenhuma facilidade por conta dele.

            Aliás, uma vez fiz referência ao seu nome quando chegou o dia 7 de Setembro e quiseram proibir o meu desfile por estar com grande contusão na canela, fruto de uma trombada de Osmar, na pelada do sítio de vovô. Então resolveram permitir que eu desfilasse pelo setor de enfermaria, que só levava uma bolsa de medicamentos e não o fuzil. Não senti nada durante o desfile, mas ao retornar ao Regimento já não tinha condições de andar. Já pensou, servir o Exército e não desfilar no Dia da Pátria!

            Lembro bem algumas figuras marcantes, como o Sargento João Gregório Filho, Sargenteante  e Evilásio, subtenente encarregado dos suprimentos.

            Na Seção Mobilizadora, encarregada da atualização do Corpo de Reservistas do 16º RI, chefiada pelo Tenente Carvalho, conhecido como Carvalhinho, local onde  passei a dar expediente na atualização de alterações dos militares e do quadro de reservistas do Regimento, o que fiz até ser licenciado, aliás, tendo para isso  autorização para frequentar alguns dias, já como paisano, para terminar o serviço.

            Dos soldados, são tantos que prefiro não nominar para não ser traído pela memória. Contudo, cito um único que era o Xodó da Companhia, pela excessiva pureza de espírito de homem do interior, sem nenhuma escolaridade, sonâmbulo e que nunca acertou o comando do corneteiro, parecendo os filmes do Gordo e o Magro – seu nome JOÃO GUALBERTO, que deixou saudades em todos, praças, sargentos e oficiais. Foi meu aluno na Escola Regimental, mas não aprendeu a ler.

Que Deus o proteja onde estiver.