sábado, 4 de março de 2023

 

Cartas de Cotovelo – Verão de 2023 – 9

Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes

AS ÁGUAS DE MARÇO FECHANDO O VERÃO

Terminamos fevereiro com muita chuva pelo Brasil afora, prenunciando um período bem molhado para amparo dos homens do campo, apesar da proximidade, apenas, da Primavera.

Em alguns lugares, as quedas pluviométricas foram exageradas. Castigo de DEUS? Não, advertência ao mau uso da natureza, das dádivas que recebemos e recalcitrância na busca de exploração desordenada do solo, ferindo as encostas das dunas e dos morros, despertando o Poder Público e a própria consciência dos empreendedores para uma reposição dos bons costumes.

Nada é de graça nem sem motivo – existe o princípio da reciprocidade que faz retornar tudo aquilo que empreendemos. Não temos sido fiéis às melhores tradições dos colonizadores e insistimos em buscar vantagens de qualquer forma.

Esses prolegômenos, (lembrei-me do meu querido Professor Floriano), é para registrar que aqui em Cotovelo o dia amanheceu radioso, luzento e com uma brisa confortadora.

O ambiente é convidativo para nos encantar com boas leituras e assim o fiz desde os primeiros raios do Rei Sol, sempre no conforto de uma rede sertaneja, equipamento essencial em uma casa de caboclo. Aqui na praia não trago os meus autores mais eruditos para não quebrar a simplicidade da natureza e cultuar um pouco mais o intimismo das leituras espiritualistas.

As minhas motivações para escrever as Cartas de Cotovelo são sempre as mais simples, seja porque sou de ascendência campesina, onde a natureza é mais preferida ou de um praiano de infância até a madureza. Não dispenso uma varanda, especialmente quando acaba o ruge-ruge do veraneio e retorna o gorjeio na minha janela, logo que chega a quarta hora de cada dia.

Confesso que vinha retraindo o meu hábito de escrever diante de tanta erudição de alguns parceiros. Contudo, após meditar, decidi que cada um dá o que tem e a minha trouxa intelectual é pequena, quase aquela que canta Patativa do Assaré:

Meus versos são como semente
Que nasce arriba do chão;
Não tenho estudo nem arte,
A minha rima faz parte
Das obras da criação

 

GRAÇA E ILUMINAÇÃO

                                    -  Horácio Paiva *

Apesar de haver lido bastante Schopenhaeur, não sou do bloco dos pessimistas... E quanto a Bertrand Russel, o meu ceticismo é diferente do dele. Não o é em relação a Deus, mas ao domínio do conhecimento pelo homem. Neste caso, estou com Sócrates, que dizia: “de uma coisa, sei: que nada sei”. 

Tenho buscado a imaginação, a poesia e a teologia como ferramentas para ampliação da consciência. A lógica cartesiana não nos leva muito longe, embora importante nas coisas, sonhos ou ilusões ditas práticas do dia a dia. Nos “Fragmentos” de Novalis, pensador e poeta romântico alemão, há uma frase que diz: “Se tivéssemos uma Fantástica como existe uma Lógica, ter-se-ia descoberto a arte de inventar.” Quando perguntado se acreditava em Deus, Iung respondeu: “Se acredito? Eu não acredito, eu sei!” Também respondo de forma parecida: “Percebo e sinto Deus”, o que me dá grande liberdade e coragem. E a vida se torna uma aventura criativa, ou sonho.

Para Santo Agostinho, somente somos salvos pela graça de Deus. Thomas Merton, monge trapista, teólogo e escritor moderno, autor do célebre “O Zen e as Aves de Rapina”, identificava a Graça (cristã) com a Iluminação (zen-budista).

No mais, e apesar de minha ignorância humana, sou livre e feliz (pela graça ou pela iluminação) e alegre na maior parte do tempo  -  embora navegando ora em mar calmo, ora em mar agitado, o que me traz, algumas vezes, mudança no humor. Mas a felicidade é profunda e o humor superficial.

A propósito do Zen, o monge católico trapista Thomas Merton, na obra acima citada, procura demonstrar a aproximação dessa doutrina com o Cristianismo. Curiosa e interessante a relação que estabelece entre a “iluminação” zen-budista e a “graça” cristã. Cita São João da Cruz, que “compara o homem a uma janela através da qual brilha a luz de Deus.” Com efeito, são palavras do próprio santo, extraídas de sua obra “Subida do Monte Carmelo”: “Quando a alma dá lugar (que é apartar de si toda névoa e mancha de criatura, tendo a vontade perfeitamente unida à de Deus  -  porque amar é trabalhar em despojar-se e desnudar-se por Deus de tudo o que não é Ele), logo fica esclarecida e transformada em Deus, e o Senhor comunica-lhe o seu ser sobrenatural de tal maneira que parece ser o próprio Deus e, de fato, é Deus por participação.”

Novalis dizia ser a Poesia a mais importante fonte do diálogo do homem com Deus. Costumo dizer que Poesia e Profecia são irmãs. Ambas trabalham o alargamento da consciência. Muitas vezes compartilhei esse pensamento com o meu saudoso amigo Nelson Patriota. E agora concluo com esse meu poema, entre a graça e a iluminação:


ZEN

quando estiver salvo

ou iluminado

não precisarei

mais nada perguntar  -

 

são ilusórias as perguntas

e ainda mais as respostas

.......................................................................................................................

(*) Horácio de Paiva Oliveira  -  Poeta, escritor, advogado, membro do IHGRN, da UBE-RN e presidente da Academia Macauense de Letras e Artes – AMLA.

sexta-feira, 3 de março de 2023

 SENHOR, NÃO DEIXES QUE O MUNDO O SUPERE!

 

Valério Mesquita*

Mesquita.valerio@gmail.com

 

As Sagradas Escrituras, desde Gênesis, registram a participação direta de Deus na condução do povo escolhido. Abrão, Elias, Jacó, Moisés, Josué, Davi, Salomão e os relatos dos profetas Samuel, Ezequiel, Daniel, Jeremias, Isaías, Zacarias, Malaquias, todos narram fatos: vários ouviram a voz de Deus e foram inspirados nos ensinamentos e procedimentos. Receberam mensagens divinas através dos anjos, foram guiados, sofreram e quantos não morreram até a chegada do Messias? Quantas batalhas vitoriosas não foram travadas pelo povo Judeu que depois foi escravizado por inúmeras potências estrangeiras até a fase dominadora dos romanos quando Jesus nasceu? Numa medida extrema para salvar o mundo apodrecido daquele tempo, Deus enviou o seu filho Jesus com a missão da boa nova a fim de tirar os pecados dos homens e remir a humanidade degenerada.

Mas estava escrito que, cumprida a missão, o Cristo seria crucificado para depois ascender ao Pai. Ressuscitado, Êle ainda permaneceu na terra ultimando junto aos apóstolos suas recomendações finais, cujo ponto alto foi a unção do Espírito Santo para todos eles enfrentarem o imenso mundo hostil e ímpio que estava deixando. Em verdade, não fosse o milagre da transferência do Espírito Santo teria sido impossível aos apóstolos realizarem a ingente tarefa de pregação e de cristianização. E Paulo de Tarso se destacou entre todos como o mais sábio e operoso obreiro. Hoje, a humanidade se repete no tempo. A imensa maioria do globo terrestre não é cristã. A obra evangelizadora não atingiu seus objetivos na Ásia e no Oriente, barrada pelo islamismo, o budismo, o bramanismo além dos regimes políticos de exceção da era stalinista, hitlerista e maoísta, entre outros da mesma escória.

Que razões poderiam ser elencadas? Teria sido a divisão das correntes do cristianismo no século XVII? A ligação, à época, da Igreja Católica com os governos absolutistas e colonialistas da Europa que se dispuseram a impor coercitivamente o domínio político e religioso aos gentios da Ásia, África e Oriente? As igrejas cristãs teriam optado pelo regime de “cada um por si e Deus por todos”,  na presunção de que a divisão do rito, da obediência, da interpretação discrepante,  bíblica e dogmática da descentralização - a doutrina e a evangelização não se espalhariam mais pelo mundo?

O fato é que, do século XX para cá, o poder econômico tem se concentrado nas mãos dos maus em todas as esferas. Por maior que seja o esforço dos evangélicos e católicos de recriarem o universo, persiste a impressão que a humanidade sucumbe ao poder do Demônio. Na sua primeira vinda, Jesus redimiu o mundo dessa escravidão, comissionando aos discípulos anunciar as duas opções: crer para se salvar ou descrer para condenação. Tudo está em Mateus 7.13 e Marcos 16.16. Todavia, para essa segunda e definitiva etapa, vejo como leigo, que se torna imperativo que o Senhor amplie pelo Espírito Santo a tarefa dos seus discípulos no mundo de hoje. Daquele tempo de Jesus para a ultramodernidade dos nossos dias, o número da população global atingiu a casa dos bilhões; a máquina mortífera da comunicação de massa e o dinheiro permanecem com os ímpios e pecadores que destroem o trabalho ”formiguinha” dos  discípulos hodiernos; nos tempos bíblicos a intolerância cristã dos chefes de estados era o óbice; ao passo que, na atualidade, as ações da intolerância estão nas leis e nos códigos que se multiplicam, nos costumes, nos lares, nas ruas e que somente o esforço do Espírito Santo com maior intensidade e vigor, haverá de derrotar o Diabo novamente. Por isso, não cesso a oração: “Senhor, não deixes que o mundo o supere!”.

O grande Mário Andrade (1893-1945), na sublime reflexão do “Valioso Tempo dos Maduros”, disse: “Já não tenho tempo para conversas intermináveis”. “Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa”. Quero caminhar perto de coisas e pessoas de verdade. O essencial faz a vida valer a pena. E para mim, basta o essecial”. Quanto a mim, Jesus Cristo é essencial!

(*) Escritor.