segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

 

 


Para além da trilogia
  • ​O australiano Morris West (1916-1999) é um dos meus romancistas favoritos. West foi seminarista por vários anos. Abandonou a vocação por não suportar o celibato, uma espécie de Santo Agostinho (354-430) às avessas. Mas manteve sua fé católica. Foi combatente na Segunda Guerra Mundial. Trabalhou no rádio. E, sobretudo, misturando política internacional com o papel da Igreja que segue, escreveu e vendeu livros, bem e muito. West faleceu de um ataque cardíaco, na sua mesa de trabalho, no seu país natal, quando escrevia “A última confissão” (2000), obra publicada postumamente.
  • ​Ponho Morris West no mesmo time de Graham Greene (1904-1991) e John Le Carré (1931-1920), como escritor que foi bestseller e realmente escrevia bem, no conteúdo e na forma. Fazia entretenimento e boa literatura, se é que me faço entender. Foram uns trinta romances, acho que todos traduzidos e badalados no Brasil, sendo que os meus preferidos são aqueles que formam a denominada “trilogia católica”: “O Advogado do Diabo” (“The Devil’s Advocate”, 1959), “As Sandálias do Pescador” (“The Shoes of the Fisherman”, 1963) e “Os Fantoches de Deus” (“The Clowns of God”, 1981).
  • ​Li-os e reli-os – falo da trilogia acima – quase de uma tirada só. Quando bem jovem e, uma última vez, pouco antes de ir passar uma temporada em Roma, em 2013, estudando a língua italiana e o direito (a proteção jurídica dos bens culturais, para ser mais específico) na Cidade Eterna. Aliás, é uma coisa que sempre faço, com o maior deleite, antes de viajar: ler um livro, frequentemente um romance, ambientado na cidade ou no país para onde eu vou. Ajuda muito.
  • ​Estou certo de que essa minha estada em Roma ficou positivamente marcada pela impressão cultural – e mesmo visual – deixada em mim por “As Sandálias do Pescador”, o livro e também o filme, e por “Amor a Roma” (Nova Fronteira, 1982), do nosso Afonso Arinos de Melo Franco (1905-1990), que também reli à época. Por falar em filme, “As Sandálias do Pescador”, de 1968, direção de Michael Anderson (1920-2018), é fantástico. Tira-se já pelo elenco: Anthony Quinn, John Gielgud, Laurence Olivier, Vittorio De Sica, Oskar Werner, David Janssen e outros craques. Foi indicado ao Oscar em algumas categorias e ganhou um Globo de Ouro. Recomendo bastante!
  • ​Ademais, é importante registrar os dons antecipatórios – os mais espiritualizados dirão premonitórios – dos romances de Morris West quanto ao papado romano. Se em “As sandálias do pescador” ele previu a eleição de um Papa do leste europeu quinze anos antes da entronização de Karol Wojtyła (1920-2005) como João Paulo II, em “Os Fantoches de Deus” ele imaginou um Papa que renuncia ao trono de São Pedro para viver em reclusão, mais de trinta anos antes da abdicação do hoje Papa Emérito Bento XVI, Joseph Aloisius Ratzinger (1927-).
  • ​E, dito isso, informo agora que explorarei para além da trilogia católica. Vou ler “A eminência” (“Eminence”, 1998), o último livro publicado em vida por Morris West, também ambientado em Roma. Nele, já nas franjas do terceiro milênio, mais uma vez temos um processo sucessório no Vaticano. Surge a figura de um cardeal argentino, um homem violentado “pelos militares em seu país que – mesmo convivendo com revelações, dúvidas e questionamentos – é um dos principais candidatos ao trono de Pedro”. E isso tudo obriga a “Igreja Católica a refletir sobre seu passado e redefinir o seu futuro”. Isso me lembra algo. Ou alguém. Certeza!
  • ​Bom, quem sabe não descubro o segredo dessas premonições de Morris West? Ou, melhor, quem sabe essa leitura não será um sinal de que, qualquer dia desses, devidamente vacinado, partirei para uma nova estada na Cidade Eterna?​
Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
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SERÁ QUE JESUS VOLTARÁ? E SE VOLTAR? 

Valério Mesquita*
Mesquita.valerio@gmail.com 

Tudo parte de um questionamento do amigo jornalista Paulo Tarcísio Cavalcanti, publicado anos atrás, em jornal da capital, que reflete, com exatidão a dúvida inquietante de milhões de pessoas no mundo, quer sejam religiosas ou agnósticas. Suas reflexões constituem um verdadeiro questionário ao qual me propronho responder como posso. 

A primeira é se o Filho de Deus voltará, como asseguram as Escrituras. O próprio Jesus foi categórico: “Não vos deixarei órfãos. Eu voltarei para vós” (João 14,18). Não definiu a forma nem o tempo de sua volta. Está presente cada dia no testemunho e na fé de cristãos convictos, na energia cósmica de sua palavra. Há uma forma espiritual, mística e amorosa de sua presença naquele que crer. Jesus retornando ao mundo continuará afirmando os mesmos valores eternos e imperecíveis: justiça, paz, misericórdia, caridade, o perdão e o amor. 

Indaga, refletidamente,  se Jesus escolherá local para residir como se a sua vinda fosse biológica ou fisiológica, fato que já se cumpriu no Segundo Testamento por permissão do Pai, segundo inúmeras profecias. “Eis que estarei convosco até a consumação dos séculos”, disse o próprio Messias. Essa forma de renascer diuturnamente no coração dos mortais já resume um pressuposto de sua mensagem aos seres humanos do século 21, porque Ele é Espírito e não carne como o foi para expiar os pecados da humanidade através da morte na cruz. Se o mundo da informática fala com veemência na presença virtual, nós temos em Cristo a presença espiritual e mística, ambas poderosa e forte. 

“Quem Jesus escolherá para segui-lo ou em que condições procederão os convidados?”. Da primeira vez Ele escolheu doze homens simples e iletrados, e com essa dúzia construiu o arcabouço de sua doutrina, unificada pela crença inabalável no Pai, no Filho e no Espírito Santo. Milhares morreram pela fé, ao longo do tempo. Se os potentados não o levaram a sério naquele tempo, posso afirmar que já são bilhões no mundo que pensam de forma diversa. Ora, o Filho de Deus conclamará todos que tiverem as mãos vazias e o coração pobre mas rico do Espírito Santo que inclina o homem para o Bem. Ninguém precisa ter diploma como você alude. Diploma é uma formalidade do mundo. E na atualidade além de pessoas simples, humildes, pobres e de diferentes camadas, há também doutores em teologia, padres, pastores, obreiros de diversas matizes. A mensagem do Senhor não é meramente social mas de palavra e de vida. (“Vim para que todos tenham a vida e vida em abundância” – João 10.10). Sobre os castigos a Ele impostos, devo dizer que a lógica de Deus não é a lógica dos homens. Cristo aceitou e enfrentou todos as felonias e dores humanas para cumprir o que já estava escrito desde os profetas Jeremias e Isaías. Ele próprio pregou o padecimento, a morte e a ressurreição. Seria enfadonho e não caberia citar as referências dos quatros evangelhos. 
Jesus não anunciou a sua volta nas mesmas condições que veio ao mundo da primeira vez. Imolou-se em sacrifício, como forma emblemática, marcante, demarcadora perante a história da humanidade. Não regressará a terra para se submeter mais a nenhuma paixão. O que aconteceu com Ele foi um evento divino e não profano. Filme e novela sim, têm reprises. Aquele sacrifício foi único, indivisível, histórico e individual. Jesus Cristo nunca sentou no trono de Davi, nem de Salomão, portanto, denominá-lo Rei dos Judeus constituiu-se mais num deboche do império romano, depois, destruído pelos bárbaros. 

Sabemos que na modernidade a violência, a corrupção, a desobediência, a falta de solidariedade e o desamor ao próximo são as práticas que ainda o crucificam na cruz, diariamente. Lembre-se que o sacrifício daquele corpo, do Homem-Deus, foi fazer a vontade de Deus. Ele que era Deus, era vida. “Derramou um sangue espiritual, divino, dando de si Deus em si”, na maravilhosa síntese de Chiara Lubich no seu livro “O grito”.