sexta-feira, 14 de outubro de 2022

 

 


Missa de 30º dia






INÁCIO MAGALHÃES DE SENA

Os amigos de Inácio convidam para a Missa de 30º dia

que mandarão celebrar em sufrágio da alma do

pranteado confrade e agradecem aos que

comparecerem a esse ato de piedade cristã.

DATA: 18 DE OUTUBRO (terça-feira).

LOCAL: Igreja de SANTA TERESINHA (TIROL)

HORÁRIO: 17,30 horas.

quarta-feira, 12 de outubro de 2022

 SENTIMENTO TELÚRICO 

Valério Mesquita*

mesquita.valerio@gmail.com

 

 

Conversa recente num encontro social, motivou tema interessante ainda não suficientemente estudado. Quais os estados brasileiros bairristas, dotados de forte sentimento de teluricidade? No nordeste, à primeira vista, a Bahia, o Ceará e Pernambuco assumem e assomam o patamar dos notáveis. Pernambuco, por exemplo, existe o “senso de pernambucanidade”, permanente disposição afetiva e “patriótica” em defesa das coisas da terra, com tal entusiasmo e emoção que até parece religiosidade. Assim também se diz do bahiano e cearense que exageram seus intrínsecos valores de ordem intelectual, espiritual, consuetudinários e econômicos a extremos, ao ponto de menosprezar e hostilizar tudo que se refira as demais unidade federativas.

O médico e articulista Elmano Marques suscitou o assunto com relação as regiões e municípios do Rio Grande do Norte. Existe aqui comportamento bairrista e onde? De antemão, estabeleceu-se a premissa do potiguar não ser um telúrico como o gaúcho. Poderia sê-lo, posto que, motivações religiosas, culturais, históricas, econômicas, além de belezas naturais sem fim, constituírem o seu rico patrimônio universal de orgulho e auto-estima. Mas, quais os “bolsões” de bairrismo acendrado existentes? Natal primeiramente, assume essa identidade de cidadela querida e resguardada pelos seus habitantes? Pouco provável porque as opiniões são díspares. Que causas inibem a maioria dos natalenses em manifestar seu sentimento pela capital como fazem os cearenses, pernambucanos e bahianos? O problema é que quando assim procedem, se mostram tímidos, sob tensão de notório complexo de inferioridade. Bem, o que afirmo é uma impressão. Pode ser que outros não enxerguem assim.

Todavia, a razão de trazer à baila a discussão desse assunto é para suscitar entre os sociólogos, professores e pesquisadores sociais a elaboração de um trabalho ou de uma tese. Por que Mossoró é tida e havida como cidade bairrista? Que sentimentos alimentam o seu povo para assim se conduzirem? Emulação com Natal? Perscrutar a psique social é uma tarefa para os cientistas dessa área. A antropologia cultural, por outro lado, irá apreciar as características inerentes a cada homem no que tange aos costumes e as crenças, de par com outras ciências, a fim de determinar a teluricidade comportamental dos naturais de cada município ou região. Trata-se de apaixonante assunto que acredito interessar a todos os interioranos do Rio Grande do Norte. Macaíba, Parnamirim, Ceará-Mirim, São Gonçalo, que integram a região metropolitana preservam algum bairrismo? Ou a proximidade com a capital é motivo de dispersão ou de falência sentimental? O que dizer do Seridó, região mais hermética e de características sociais atípicas? E como a abordagem é perfunctória e indagativa, que outros ingredientes como o clima e o solo influem na formação do sentimento telúrico? Ficam as indagações para os estudiosos.

 

(*) Escritor



 

COISAS DO TREM DE PRATA

Tomislav R. Femenick – Jornalista

 

O início dos anos 1970, quando fui morar em São Paulo pela segunda vez, fundei a Entreprise Press, uma agência jornalística que fornecia notícias, crônicas e ”conteúdos” para mais de quarenta jornais do país; de Manaus a Porto Alegre. Era uma época diferente da de hoje. O grande problema foi como montar a logística para fazer as matérias chegarem aos jornais. Tudo era difícil, não havia internet e o grande instrumento de comunicação – restrito para somente algumas empresas – era o teletipo; e essa foi a nossa grande arma.

Por indicação do meu amigo Dorian Jorge Freire, fui buscar o jornalista Fausto Cesar Alcazar, que trabalhava como “freelance” nas revistas Veja e Realidade, da editora Abril, para se juntar a nossa equipe. Como se diz, “foi um grande achado”, principalmente no setor de “conteúdo”, algo relativamente inusitado na imprensa brasileira. Tradicionalmente, as agências nacionais distribuíam quase que somente notícias prontas e nenhuma fornecia conteúdos, ou seja, não forneciam os tópicos que compõem as notícias, tais como as fontes, as divergências de intepretações, o significado e mesmo a sua importância em contextos diversos, de tal forma que, em jornais diferentes, o mesmo fato poderia aparecer de forma diferente, conforme a sua interpretação, dando relevância latente às palavras.

   O Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro, e a Folha de São Paulo, na capital paulista, eram os nossos maiores clientes de “conteúdos”, e isso exigia reuniões frequentes entre nós e as chefias de redação desses jornais, pois se as notícias são fluidas, os “conteúdos” são mais que isso, são voláteis. Depois das matérias serem divulgadas, elas despertam pouco ou nenhum interesse do público, a não ser que haja fatos novos que lhes deem substância e continuidade.

O Jornal do Brasil era o cliente que mais exigia reuniões para discutir os conteúdos, mesmo que nunca tenha tido êxito nos seus questionamentos. Por conta dessas ocorrências, quase que passamos a morar nos aeroportos de Cumbica e Santos Dumont. Não suportávamos mais o barulho das turbinas da Ponte Aérea São Paulo-Rio de Janeiro-São Paulo, os cafés frios e os pães de queijo amassados e caros, vendidos nas áreas de espera, o ambiente gélido da madrugada nos aeroportos, vez que as reuniões sempre eram marcadas para as primeiras horas do expediente da manhã.

Eis que descobrimos o serviço ferroviário chamado de Trem Santa Cruz (depois de Trem de Prata), que fazia o mesmo percurso Rio-São Paulo-Rio. Mais barato e com lampejos de luxo. Destinados aos passageiros, havia vagões dotados de cabines com dormitórios e um carro-restaurante, tudo servido por cerca de vinte tripulantes. Experimentamos uma vez e logo o adotamos como o nosso meio de ir e vir entre as duas cidades. Logo ficamos conhecendo os outros passageiros habituais. Havia Júlio, um alegre e comunicativo representante comercial, o padre Alberto, Mussum dos trapalhões, Dona Arlete, uma senhora dona de uma confecção e outros mais. Mussum ia dormir logo depois do jantar. Com os outros ficávamos conversando e, vez por outra, jogando um biriba despretensioso, apostando caroços de feijão, pois se convencionou que era proibido jogar a dinheiro. Um dia ficamos sabendo (dito pelo colega que o substituiu) que Júlio tinha ficado doente de meningite, coisa greve mesmo, a ponto de ter recebido a extrema-unção. Só estavam esperando a sua morte.

Meses depois ele reapareceu no trem. Magro, trazendo na face o resultado da doença, mas ainda alegre e conversador. Contou-nos sobre os dias que esteve hospitalizado, as dores horrendas e o medo de morrer. Em seguida perguntou sobre o padre Alberto, pois queria pedir-lhe um favor. Logo em seguida, como se fosse numa deixa de teatro, o padre Alberto entrou no vagão-restaurante, dirigiu-se ao nosso amigo e o abraçou. Júlio, como bom brincalhão que era, disse-lhe.

   – Padre dá para anular a extrema-unção, que me deram? Eu desisti de morrer. Pelo menos por enquanto. 

 

Tribuna do Norte. Natal 12 out. 2022.

 

 

terça-feira, 11 de outubro de 2022

 

Professor Severino Lopes, o desportista      

 

 

Severino Lopes da Silva (Dr. Severino, Professor Severino) nasceu no município de Macaíba, em 1924. Conheci-o no começo da década de 1960, quando iniciava a minha jornada como profissional do futebol, na simpática e admirada equipe verde-branca do bairro mais popular e populoso da cidade, o Alecrim FC. Há relatos de que  foi um bom jogador, defendendo a equipe esmeraldina e, inclusive, em passagem em terras da Espanha, durante o tempo da sua pós-graduação; um atleta viril, brigador, duro nas jogadas, porém, um obediente e disciplinado jogador dentro das quatro linhas. Fizemos uma boa, sólida e fiel amizade no campo do futebol e da medicina.

Na época, o professor Severino já fazia parte como um dos abnegados cardeais do time “periquito”, chegando a sua presidência.                                                                         

Conseguimos juntos o primeiro bicampeonato oficial de futebol da cidade (1963/4). Em plena efervescência da disputa do título do bi, fui aprovado para fazer o curso de medicina; o tempo passou a encurtar, a apertar para poder conciliar a “bola e o estudo”. Porém, fui sempre aconselhado e orientado pelo professor, nas buscas das soluções.

Como seu aluno na cadeira de Psicologia Médica, relembro algumas passagens interessantes: ele gostava de convidar um grupo de estudantes para jogar uma “pelada” em sua fazenda, na Lagoa do Bonfim. O time dele nunca perdia (de maneira superesportiva). Sempre arranjava um jeito de sair vitorioso no final do embate. O local era super arenoso, com areia frouxa e muito quente (a pelada sempre começava depois das onze horas); convidava e levava alguns bons jogadores do time do Alecrim, de solado grosso, que corriam na areia quente e fofa, como se estivessem correndo em cima de um excelente gramado sintético em noite fria. Não dava outra, ganhava todas. Não sabia o que era derrota. Contam que, certa vez, convidou para uma arrojada peleja, um time de peladeiros, cujo goleiro era o bom e famoso Bastos (Alecrim FC); início de jogo, o goleiro intransponível, não entrava nada, nem vento! Preocupado, pensando em perder a longa invencibilidade, o professor Severino “deu uma de doido”, lembrou-se do valente e feroz cão da fazenda. Não deu outra, foi apanhar o cachorro e amarrou na trave do bom goleiro. O defensor arregalou os olhos e chispou, abandonando a trave. Aí, pegue a entrar gols e mais gols, final da peleja: uma senhora goleada, tendo como grande protagonista o valente cão artilheiro que ele chamava de Bozó II (alusão ao bom ponta direita Bozó do Alecrim FC, seu contumaz convidado). No final, todo mundo morto de sede, fome e muito bem derrotado, e ele sorrindo à toa, descascava pacientemente um abacaxi para distribuir com todos. Era pouco abacaxi para muitos derrotados e esfomeados.

Na nossa convivência no Magistério Universitário, ele na chefia do Departamento de Medicina Clínica, me indicou para a vice-diretoria do Hospital Universitário Professor Onofre Lopes, o que muito me honrou e enalteceu.                                           

No seu currículo, constam trabalhos pioneiros da mais alta relevância em prol da psiquiatria do Estado: a criação do primeiro hospital de psiquiatria – a Casa de Saúde Natal, (1956) – hoje, Hospital Psiquiátrico Professor Severino Lopes; o primeiro curso de residência médica em psiquiatria; a criação e fundação da Clínica Pedagógica Professor Heitor Carrilho, instituição de caráter filantrópico, onde presta atendimento eficaz e humanizado às crianças excepcionais, dando-lhes total apoio psicopedagógico, e a APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais). O professor Severino sempre enxergou e usou o trabalho, o esporte e o lazer, como elementos fundamentais e coadjuvantes na terapia psiquiátrica.

Deixou um imensurável legado para psiquiatria do Estado, com a formação de gerações e gerações de seguidores. Sua imagem, sua figura, sua pessoa, suas ações jamais serão esquecidas.

Faleceu em 2002, aos 78 anos, vítima de infarto do miocárdio, na Casa de Saúde São Lucas; era portador de diabetes. Foi casado com a farmacêutica Isabel Fernandes de Góis Lopes, com quem teve cinco filhos: Carlos, Márcia, Marcos, Cláudio e Cláudia Lopes.

segunda-feira, 10 de outubro de 2022

 

O futebolês

 

 

Ultimamente, os canais de televisão têm ocupado grande parte dos seus horários às narrações, discussões e aos comentários sobre o futebol. Não falta pano para manga. Haja torneios, copas, taças e campeonatos nacionais e internacionais, todos transmitidos pela mídia esportiva. Coisa de louco! Alguns canais são específicos e chegam a ser enfadonhos, é o dia todo e todos os dias, só futebol e mais futebol. Com isso, temos observado que o vocabulário da pelota tem se enriquecido, se inovado e ampliado bastante, com inovações bem interessantes e curiosas.

Passamos, dessa forma, a ter mais uma nova variedade da nossa língua-mãe – o futebolês.

Assim, quando assistimos ou ouvimos uma transmissão de futebol e seus comentários, ficamos surpreendidos com essa nova linguagem, que chega a nos tirar de tempo; daí a necessidade de uma boa reciclagem para entender esse rico e variado palavriado. Vamos ao que escutamos:

 

– É um jogador cascudo; o time foi muito cirúrgico, usa muito a transição ofensiva; aproveita bastante a linha vertical; foi muito agudo no transcorrer da partida; o time iniciou usando muito a linha baixa; o adversário preferiu a linha alta; o time está precisando de um 9 plantado e terminal; tem que jogar enfiado; está faltando um bom meia de contensão; o meia de armação está fugindo do seu quadrado; tem que flutuar; a transição não está perfeita; é preciso manter a retenção; tem que fazer o facão para poder guardar na casinha; o ala tem que se apresentar bem na linha do gramado; a aproximação tem que ser feita no losango; o volante tem que cobrir o corredor; o jogador tem pouca minutagem; tem que se manter com jogo apoiado e reativo; ocupar bem o terço final; dar sempre amplitude; exercer sempre a contrapressão, usar bem os externos desequilibrantes; o primeiro e o segundo volante têm que ocupar o triângulo central; bom de vestiário; boa atmosfera.

E, por aí segue a nova comunicação na mais pura e moderna linguagem – o  futebolês. Difícil de entender, não?

O que diria o nosso filósofo maior do futebol, o carioca botafoguense Neném Prancha, e o nosso lendário narrador mineiro e flamenguista até a medula Ary Barroso, com sua inseparável, insuperável e precisa gaita, diante dessa estranha narração: – o jogador, cascudo e terminal, invadiu pela vertical de forma aguda, envolveu o time adversário em linha alta, flutuou no losango, fez o facão e com ação cirúrgica guardou na casinha?

No mínimo, achariam muito estranho e inconcebível e teriam enfarte fulminante em suas coronárias.

 

Saidinha equivocada
​Do meu tempo de doutorado em Londres, recordo-me, com saudade, de haver estudado bastante em duas maravilhosas bibliotecas: (i) a Biblioteca do Instituto de Estudos Jurídicos Avançados da Universidade de Londres, que se acha situada no número 17 da Russell Square, no charmoso e mui visitado bairro de Bloomsbury; (ii) e a queridíssima Maughan Library, uma das nove bibliotecas do King’s College London – KCL (no qual fiz o meu doutorado), localizada na Chancery Lane (rua famosa da “Central London”), que é por muitos considerada a mais bela biblioteca do Reino Unido.
​E se outrora já escrevi sobre essas duas maravilhas, eu hoje vou contar um causo sucedido comigo, relacionado a uma longa noite de estudos passada na Maughan Library.
No Reino Unido, nos últimos meses do período letivo, coisa de maio e junho (o ano letivo lá começa em setembro), as bibliotecas universitárias restam abertas 24 horas. Dão uma redonda, como dizemos, embora para outros fins, digamos mais festivos.
Esse era o caso da tal Maughan Library, onde começa o meu causo. No doutorado, foram dias e noites habitando entre aquelas estantes, muitas vezes perdido no labirinto de salas e corredores, lendo e escrevendo, sempre na boa companhia dos autores e dos livros de minha predileção. Como morava perto, dava até para fazer três expedientes de estudo, misturados a uma boa caminhada ou a uma siesta à moda espanhola. Maravilha!
​Acontece que a ambiência da Maughan Library, embora belíssima, é também meio “sinistra” no sentido “Harry Potter” ou “O nome da rosa” do termo. Tudo lá é meio “fantástico”. As suas primeiras edificações retroagem ao período medieval. O prédio principal foi edificado nos anos 1850 para abrigar o Public Record Office do Reino Unido. O complexo foi adquirido pelo King’s College em 2001. Reformado (é um edifício tombado), foi reinaugurado em 2002, como biblioteca, com a presença da Rainha Elizabeth II (1926-2022). Seu interior é antigo e austero. Imensas portas de madeira antiga ou de ferro fundido separam um ambiente do outro. Só as janelas enormes, algumas preenchidas com vitrais, nos roubam a sensação de isolamento. Apesar das orientações, é bem labiríntico. E, se é para misturar realidade e fantasia, Robert Langdon e Sophie Neveu, em “O código Da Vinci”, de Dan Brown (1964-), estiveram xeretando por lá. Inconscientemente, vez por outra nos vem à mente (vinha à minha, ao menos) os sete dias de “crimes e castigos” imaginados por Umberto Eco (1932-2016) em uma antiquíssima abadia medieval e sua biblioteca. Esquisito! E isso tem a ver com o meu causo.
​O fato é que, em certa ocasião, já bem tarde da noite, cansado, exausto mesmo, saí da Maughan Library em direção à minha casa. No caminho, tive vontade de ir ao banheiro. Como tinha um McDonald’s na rua, tive a péssima ideia (vendo agora retrospectivamente) de entrar ali para, rapidinho, fazer o número 1. Dei aquela fingida de estilo, de que iria escolher algo, e parti em direção ao subsolo do prédio.
Em Londres (e nas demais metrópoles europeias), em cafés, bares e comércios de estilo, os subsolos são normalmente destinados para os banheiros necessários aos clientes, aos turistas ou, quiçá, aos estudantes exaustos como eu. Mas é uma adaptação. Meia boca. As localizações são confusas. Labirínticas, diria, como no caso da minha Maughan Library. Esquisito!
​Bom, achei o banheiro. Fiz meu pipi em um dos vasos pregados na parede. Até aí tudo bem. O infortúnio aconteceu na saída do banheiro. Quando empurrei a porta, ela não abria. O pior: havia alguém segurando ela do outro lado. E com muita força. Naquele momento, em questão de segundos, tudo me passou pela cabeça (que já não andava bem). Querem me assaltar. Me violentar. Me matar. Meu corpo será encontrado em uma terra que não é a minha. Imaginei o desespero dos meus pais. E comecei a gritar: “Help! Socorro! You are crazy, man!”. E tudo mais que sabia em inglês, português e nas demais línguas da Torre de Babel. Tudo alto e desesperadamente! Nesse desespero, tive mais forças que o meu oponente. Abri a porta violentamente!
​Graças a Deus, pelo menos para mim, tudo não passava de um engano. Exausto, misturando os labirintos de “O nome da Rosa” e do subsolo do McDonald’s, confundi as portas de saída e da casinha do sanitário. Estavam em lados opostos. Fui para o lado errado. Do outro lado da porta, que rompi aos berros numa mistura de línguas incompreensível, de olhos esbugalhados, estava um homem moreno (talvez estrangeiro como eu, da África ou do Subcontinente Indiano), sentado no bojo, calças arriadas, tentando fazer o seu número 2. Veio a epifania...
​Desde então, comparando com o meu, imagino o desespero desse cidadão, calças arriadas, indefeso, lutando com um maluco à sua porta que gritava coisas nonsense. Pelo que me recordo, disse um “Sorry” pelo meu “crime” e saí correndo, fugitivo, Londres noite afora, com o medo de um “castigo” deveras merecido.
​​
Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL