sábado, 10 de janeiro de 2015

A   H O R A   D O S   Q U E   S A B E M   M O R R E R
Gileno Guanabara, do IHGRN

Horácio Arturo Ferrer nos deixou, no dia 14 de dezembro passado, um dos últimos suspiros sentimentais do tango, em Buenos Aires. Nascido em Montevideo, em junho de 1933, foi letrista e o parceiro mais importante do genial Astor Piazzolla. Dentre as criações que compuseram estão a Balada para un loco (1968), ou loca, como se tornou conhecida na Argentina, ou louco, na versão difundida no Brasil pela voz de Moacyr Franco, e a Balada para mí muerte (1971). Compôs inúmeras outras canções para os álbuns En persona; Maria de Buenos Aires – Primeira parte; Maria de Buenos Aires. Poeta e escritor, registrou as origens do tango, sem distinguir diferenças entre o tango portenho e o uruguaio.
Residiu na capital Buenos Aires, para onde se transferiu em 1960. Chamou a atenção de Piazzolla, que o apelidou El Duende e lhe convidou para fazer uma parceria: Isso que você faz na poesia, eu faço com a música. Venha trabalhar comigo.  O que Ferrer se propunha fazer como poeta, letrista e inovador, era senão perverter o tango. Aceitou a parceria que durou mais de quarenta anos, a mais duradoura e fértil da história musical oriunda das zonas portuárias de Buenos Aires. Costumava dizer que o tango era imortal, mesmo que não se lhe acrescentasse uma nota, um passo de dança, nem mais o acompanhamento de um bandoneón. Equiparava-o em importância ao jazz ou ao flamenco.
A partir dessa parceria, jamais o tango argentino seria o mesmo, difundido sem fronteiras, ao que Jorge Luis Borges nominava essa forma de caminhar pela vida. Conhecedores e sócios na leitura dos clássicos, os parceiros encartaram melhor do que os demais as transformações do tempo, sem que o tango deixasse de ser da milonga e da nostalgia. Guardavam semelhanças no jeito de viver as emoções. Igual ao parceiro, Ferrer era boêmio, notívago e, em especial, demonstrava sensibilidade para com as artes plásticas. Trabalhavam até quando o sol se punha, numa jornada de mais de doze horas por dia, quando então juntos davam vazão ao prazer etílico, afinal ninguém é de ferro.
Ferrer considerava a Balada para un loco o seu maior sucesso, cuja poética dizia ter influências do cubismo e do surrealismo em voga ao final dos anos de 1960, como também tinha o apelo ao visual que visualizava nos versos do poeta espanhol Garcia Lorca. A Balada estreou no Luna Park, centro de Buenos Aires, no encerramento do Festival Ibero-americano de Dança e Canção, ocorrido no ano de 1969.
Segundo Ferrer revelou, numa pausa durante a montagem da ópera-tango Maria de Buenos Aires, a dupla foi assistir ao filme Le Roi de Coeur (O Rei de Coração), de Fillippe de Broca (1966). A fita trata de um soldado britânico (Alan Bates) que se refugia num vilarejo da França, após o fim da Primeira Grande Guerra. Lá estavam liberados os loucos do manicômio da cidade: o soldado viu que os loucos tinham um enfoque da vida melhor que aqueles que viviam fora do manicômio. Eis a inspiração para a Balada para un loco. Ao afinar o concerto, como se estivessem em transe, num orgasmo alucinante, um fazia a leitura teatral do seu poema, enquanto o outro fazia e refazia os reparos da pauta musical, para enfim concluirem a melodia: temos um míssil em nossas mãos, disparou um para o outro.
Na primeira apresentação da Balada para un loco, a interprete Amelita Baltar, a primeira esposa de Ferrer, foi tragada pela emoção da plateia que lhe hostilizava. Começou a declamar os versos: Las tardecitas de Buenos Aires tienen esse que sé yo, viste? salgo de casa por Arenales, lo de siempre en la calle y en mí, cuando de repente... O público foi-se tomando de profunda reverência e de pé passou a aplaudi-la até o final da apresentação. Amelita de tanto forçar a respiração, enquanto cantava, rompeu o vestido na parte de traz, tendo de ausentar-se do palco em marcha-ré, para chegar na coxia. Embora não tenha granjeado a vitória perante o juri popular do Festival, - de que o poetinha Vinicius de Morais era um dos jurados - a Balada vendeu 200 mil cópias, sucesso imediato na semana que sucedeu a festa.
Horacio Ferrer residiu no apartamento de Piazzolla, na Avenida Libertador e, com a morte do seu parceiro, em 1992, passou a ocupar um dos apartamentos do Hotel Alvear, no decaído centro boêmio de Buenos Aires, onde faleceu. Enquanto crescia a sua popularidade, ao final da segunda metade do século, assistiu o crescimento da hegemonia política do peronismo. Faz sentido o diversionismo da temática musical do tango, extravasando o sentimentalismo imposto às massas obnubiladas, ao tempo em que se consolidava o mito da la Dama de la Esperanza, La jefa Espiritual de la Nación, em que pontificava Evita, a saldo do presidente Peron, na ação deletéria de controle do país. A par da difusão radiofônica dos efeitos vocais inebriantes de um Carlos Gardel, nada mais longevo do que a criação poética/melódica de Piazzolla e Ferrer, para sublimar as dores do coração sofrido, enquanto o peronismo se consolidava no poder político. 

Na vida atribulada de boêmio, compositor, cantor e poeta/letrista, Horacio Arturo Ferrer antecipou a sua legião de admiradores o sentimento premonitório de sua morte. Buenos Aires querida, a sua segunda pátria, dera curso ao seu talento, onde galgou o prestígio popular de suas composições. Foi lá, entre os portuários enamorados que caminhavam pela vida que, apesar dos pesares, no ano de 1971, compôs com Piazzolla a Balada para mí muerte. Há na canção um destino imanente, uma predeterminação de seu passamento ocorrer em Buenos Aires, naquela rua e no momento em que assistia decair a boemia, perenizadas as lembranças das casas de abajur lilás, a poesia, o tabaco e o tango que lhe fizeram feliz a si a aos outros, por toda a vida. Saber morrer na hora certa, em que morrem consigo as melhores tradições, no apagar do verso de quem soube antecipar: Moriré em Buenos Aires, será de madrugada, guardaré mansamente las cosas de vivir,/ mi pequeña poesia de adiosas y de balas, mí tabaco, mí tango, mí peñado de esplin. ... /Moriré en Buenos Aires, será de madrugada,/ que es la hora en que mueren los que saben morir./ Flotará en mí silencio la mufa perfumada/ de aquel verso que nunca yo te supe decir.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015


        Um fio de esperança

Augusto Coelho Leal, do IHGRN

                Este artigo, não é sobre o filme, nem tão pouco sobre o livro que tem o mesmo título deste. Embora esteja eu em uma nave chamada Brasil, pilotada por vários pilotos e com uma tripulação enorme, voando a deriva e causando pânico entre seus passageiros, o que parece um pouco como filme.

 Lendo os últimos jornais do começo deste ano, fiquei surpreso com as declarações do Governador do Estado e do Desembargador Claudio Santos, Presidente do Tribunal de Justiça. Vi nascer um fio de esperança em um homem descrente das palavras dos homens, em especial, homens públicos.

                Mas porque falo isto? Então vamos por parte. O Governador Robinson Faria em entrevistas dadas aos jornais e emissoras de televisão, diz que seu governo vai ser um governo prioritariamente técnico, e que dentre estas prioridades estarão nos primeiros lugares à saúde, segurança e educação. Até aí nada demais, pois todos que assumiram os governos passados também falaram a mesma coisa, ou as mesmas coisas, e nada ou quase nada fizeram.

                Mas, senti um pouco de humildade e sinceridade nas palavras do Governador, e passei ha ter, até um pouco de esperança de haver dias melhores. Principalmente na esperança que os mais humildes tenham uma saúde e uma educação mais dignas. Quanto à segurança, todos nós precisamos, seja pobre, classe média ou rica, a violência continua muito grande e o policiamento muito falho.

                Mas em particular, eu quero fazer um pedido ao governador. Não sei dos conhecimentos técnicos e administrativos do colega Eduardo Pagnoncelli principalmente em estradas, indicado para o comando do Departamento de Estradas de Rodagem. Já fui engenheiro do DER e nunca vi nenhum órgão sofrer um desmonte tão violento como esse vem sofrendo. Acabaram com quase todo seu patrimônio físico, diminuindo as instalações administrativas e técnicas, pois até o laboratório de ensaio e estudos deram sumiço, acabaram com todos os equipamentos técnicos ou quase todos, com toda frota de manutenção, com a usina de asfalto, inclusive o prédio das Oficinas Centrais, pasmem até a Diretoria de Planejamento sumiu. Os funcionários desmotivados, com salários baixíssimos, sem especialização ou atualização nas suas funções. Os Distritos Rodoviários (escritórios no interior) fazem vergonha. É muito triste ver o DER do meu tempo e comparar com o DER de hoje. É muito triste andar por lá e ver os corredores vazios, os colegas fogem de lá. É muito triste ver as obras construídas hoje pelo DER. Tenhamos como exemplos os acessos ao novo aeroporto, ou o prolongamento da Avenida Prudente de Morais, sem dúvida nenhuma, uma vergonha para a nossa população.

                Peço ao Governador e ao  Diretor Geral, que façam um esforço grande   de incentivar os funcionários, qualificar melhor, atender o apelo de melhores salários, luta de mais de vinte anos sem sucesso.

                Quando fui funcionário de lá, todos tinham orgulho da nossa repartição. Havia sim, as lutas por melhorias salariais, pela melhoria de trabalho. Isto sempre houve e haverá.

                Lamentavelmente vejo hoje o DER como um Golias doente, moribundo, atingido por uma doença que se chama incompetência, descaso e irresponsabilidade.

                Na nossa época, as nossas estradas estaduais, eram. quase todas pavimentadas Era um dos maiores ou o maior patrimônio em termos de valores financeiros, do Rio Grande do Norte, e nos cuidávamos razoavelmente bem e com certo carinho desse patrimônio.

                Hoje faz pena andar pelos poucos corredores vazios que ainda restam. Digo sem dúvida de errar. Qualquer colega que voltar a andar por esses corredores vai sentir a mesma coisa que seu sinto. Tristeza, vergonha, a sensação de está em uma repartição que um dia foi grande, mas que está prestes a desaparecer.

                 Quanto ao Dr. Claudio Santos, só tenho elogios às suas palavras. Não conheço as teias que envolvem a nossa justiça, mas conheço e vejo o clamor popular por uma justiça mais ágil, por uma justiça mais digna. Todos nós queremos uma justiça mais justa, muito mais honesta. Uma justiça que veja unicamente a verdade, que trabalhe para o povo, não para as luzes dos holofotes da vida.

                Senhores governantes, não deixem morrer a esperança.

               

 

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015


CARTAS DE COTOVELO 04

(versão 2015)

Carlos Roberto de Miranda Gomes

 

            No veraneio nem tudo são flores, porquanto os ranços do cotidiano, insistem em nos acompanhar em qualquer tempo e lugar.

Os propósitos de um ano alvissareiro logo parecem nos sufocar quando algum ato ou fato surpreendem a família, trazendo um pouco de amargor ao período que somente deveria ser de alegria.

No caso ocorreu um ato que colheu de perplexidade um dos nossos integrantes: exoneração de um filho, após 16 anos de bons serviços prestados ao TCE deste Estado, sem qualquer justificativa razoável, senão propósito pessoal do governante. 

Relutei muito em exteriorizar meu sentimento de revolta, mas mercê da solidariedade dos meus amigos consegui superar a adversidade e caminhar no rumo da Luz Divina, que nunca deixa de abrir uma janela, quando alguma porta é fechada para os seus filhos.

Noite passada, após vislumbrar a força do Criador, com um luar que nos aproxima da transcendência, dormi o sono de uma criança, reconfortado pelo aconchego dos filhos, netos e agregados e dos amigos que não faltaram com o carinho efetivo esperado e acordei com o espírito refeito – o sol renasceu no novo dia, as xananas abriram os seus copos e a brisa refluiu nas árvores dando-nos o tom agradável de uma bela manhã.

O caminho, a verdade e a vida estão no Verbo que se fez Carne, mas hoje reina nos céus e nos guarda nesta dimensão da terra.

Para tudo há um tempo certo.

O Senhor é a minha luz e a minha salvação; a quem temerei? O Senhor é a força de minha vida; de quem me recearei? (Salmos, 27.1)
.........

Ainda que um exército me cercasse, o meu coração não temeria..... (Salmos, 27.2)

Afinal, o SENHOR é o meu Pastor; nada me faltará... (Salmos, 23.1). TE agradecemos pela luz que apontará nossos caminhos.
                             O que desejo em 2015

Augusto Coelho Leal, do IHGRN
           
            O meu desejo para 2015 e um desejo que talvez se realize em 2035. O que desejo é um povo ordeiro, decidido, corajoso, valente. Não um povo indolente, omisso, subserviente, covarde, sem educação, despolitizado. É assim que vejo o povo brasileiro hoje em sua maioria.
            Na verdade a ausência de lideres honestos neste país nos leva a essa situação de descrença, de desânimo, e o povo vai se acomodando a esta situação, não reage, aceita calado. Faltam pessoas que guiem o povo, que motivem o povo, faltam conhecimentos para que o povo siga o caminho correto.
            A falta de lideres no Brasil é tão grande, que basta um cidadão honesto fazer unicamente a sua obrigação que vira notícias do dia para noite, sai em capas de revistas e são manchetes de jornais. Como exemplo, cito os de Joaquim Barbosa e do tenente Estyvenson que não fizeram ou fazem nada menos, do que suas obrigações. Ser honestos e respeitar a ética e a moral no serviço público, coisas que muito pouca gente faz hoje, por isso são tidos como heróis. Em um país onde todos querem levar vantagens sobre todos, até em um simples estacionamento de shoppings ou supermercados, convivemos com a imoralidade. Faltam educação e respeito, coisas que muitos poucos brasileiros conhecem. Este é o país de imorais e da falta de ética. Até a nossa polícia militar –RN- que devia dar exemplo, não faz.
            Temos uma Associação em Cotovelo, um prédio construído pelos veranistas. Pois bem, A Associação fez um convênio com a polícia, para reforçar o policiamento naquela região. Resultado a polícia depois de certo tempo, abandonou o prédio, não comunicou a Associação e o prédio ficou abandonado. Foi depredado e invadido por pessoas sem moradia. Vejam a falta de responsabilidade, de onde? De uma instituição que deveria primar pela ética, pela responsabilidade.
            Aos sábados e domingos a policia faz uma blitz gigantesca do posto policial de Pium. Quem por lá passa tem a impressão que estamos seguros, que podemos pelo menos dormir tranquilos, pois tem mais policial do que mosquito da dengue, o que não é verdade, não existe policiamento pelo menos em Cotovelo. Estou há quatro dias lá e neste espaço de tempo, houve um assalto e roubo de um carro, e um assassinato. O que eu acho esquisito nisto tudo é que o policiamento fica numa vitrine dia de sábado e domingo, justamente os dias que a população flutuante das praias aumenta muito, depois tchau, e os veranistas e moradores aceitam tudo calados, ninguém reage, ninguém pelo menos fala, denuncia este estado de coisas.
            A Prefeitura de Parnamirim também faz parte deste contexto de imoralidade e desrespeito ao povo. Pagamos o IPTU mais caro da região, mas as ruas são esburacadas, poucas pavimentadas. A iluminação pública precaríssima, a sujeira (o lixo) é de fazer vergonha. Tive contato com uma turista do Paraná que me disse             – Como os senhores permitem que aconteça isto? Esta Praia é muito bonita, mas a sujeira envergonha qualquer turista. E vocês vivem aqui sem pelo menos um policial?
            Esta é a nossa verdade. Aceitamos tudo calado, perdemos a capacidade de reação, de se indignar com as bandalheiras deste país. Lembro-me de uma música cantada por Zé Ramalho que em uma parte diz. “Tô vendo tudo, tô vendo tudo, mas fico calado faz de conta que sou mudo.” Triste realidade, mas é a pura verdade. Somos um país de mudos e surdos, e isto me envergonha. Já disse em meus escritos e vou repetir. Acho que todos nós nascemos com tendências homossexuais, pois, vivemos levando “pau nas costas” e achando bom, nada se leva a sério neste país. Embora saiba que todos nós nascemos de uma gozada, acho que vivemos gozando demais e vivemos fugindo das nossas responsabilidades cívicas e morais.  Vivemos de festas, isso sabemos fazer muito bem. Gozar é a nossa matéria prima, somos gozadores natos e assim vamos deixando a vida nos levar.
            Disse Rui Barbosa em sua ORAÇÃO AOS MOÇOS. “Ora, senhores bacharelandos, pesai bem que vos ides consagrar à lei, num país onde a lei absolutamente não exprime o consentimento da maioria, onde são as minorias, as oligarquias mais acanhadas, mais impopulares e menos respeitáveis, as que põem, e dispõem as que mandam, e desmandam em tudo; a saber: num país, onde, verdadeiramente, não há lei, não há moral, política ou juridicamente falando.” Isto em 1920. Nada mudou em termos de moral, talvez tenha piorado Vivemos em um país sem leis, ou em que as leis são brandas demais ou não cumpridas, talvez sejam comprimas demais. Vivemos ao “Deus dará.”
            De quem é a culpa? Nossa. Culpamos os políticos, a justiça, a polícia, mas não fazemos nada para mudarmos esta situação. Talvez educando as crianças de hoje, vejamos um Brasil melhor.
             “Este ano que paz no meu coração, quem quiser ter um amigo que me dê a mão.”


terça-feira, 6 de janeiro de 2015

RECADO DE EDUARDO ALEXANDRE

Eduardo Alexandre Garcia
Eduardo Alexandre Garcia 6 de janeiro de 2015 11:51
Ontem, fui ver a Festa de Reis de Santos Reis.

Festa centenária das mais tradicionais de Natal, antes comemorada com Lapinhas, Bois de Reis, Pastorinhas, Fandangos, brincadeiras infantis diversas, como Gato no Pote, Pau de Sebo, Corrida de Saco, procissões, missas, cortejos náuticos e terrestres, romarias, novenas; o sacro e o profano irmanados em busca de fé, celebrando o início das obras da Fortaleza dos Reis Magos, no distante 06 de janeiro de 1598, quando, de fato, em pedra e cal, tem início a história de Natal.

Pouco do folclórico restou desta festa, hoje distante de suas origens.

Hoje, vou para São Gonçalo do Amarante. Lá, há uma tentativa de se voltar a celebrar O Dia de Reis com a alegria e a diversidade cultural que um dia já existiu aqui.

É preciso tomar-se esse exemplo de São Gonçalo, mais precisamente do Ponto de Cultura BoiVivo, para que se tenha parâmetro de programação para as nossas festas de reis dos próximos anos.

Capitania das Artes, alô, ô!

Cartas de Cotovelo 03

(versão 2015)
Carlos Roberto de Miranda Gomes

TRÊS ANOS DA PARTIDA DE ENÉLIO 

 

Foi um baque a triste notícia, em pleno dia dos Reis Magos. Enélio Lima Petrovich, o guardião do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte por 48 anos encantou-se naquela data de 2012.
A cidade, nesse período, tem uma debandada para viagens e para o veraneio. Mas logo os amigos foram retornando a Natal e o velório aconteceu no próprio Instituto, deixando saudosos os seus familiares e amigos, que estiveram presentes na solenidade fúnebre.

Os jornais do dia seguinte noticiaram o acontecimento, com destaque, correspondendo à importância daquele tão festejado intelectual, cuja característica marcante era o de sempre se fazer presente a todas as solenidades comemorativas da cultura e da história potiguar.

Yuno Silva e Tádzio França - repórteres da Tribunal do Norte escreveram:

A clássica “Royal Cinema”, composição do potiguar Tonheca Dantas, anunciou aos amigos e familiares que era chegada a hora do derradeiro adeus a Enélio Lima Petrovich, nome que entra para a história como o mais longevo dos gestores à frente de uma instituição pública no Estado. Lembrado por sua dedicação à preservação de documentos e registros históricos que guardam a memória social, cultural e política do RN, Petrovich fez questão de deixar escrito de próprio punho seu último pedido na contra-capa de um CD: “Para meu velório no salão nobre do IHG/RN. E quando? Só Deus sabe...”
Alex RégisMorre o advogado e escritor Enélio Lima Petrovich. Ele esteve à frente, por quase cinco décadas, da mais antiga entidade do Estado, o Instituto Histórico e geográficoMorre o advogado e escritor Enélio Lima Petrovich. Ele esteve à frente, por quase cinco décadas, da mais antiga entidade do Estado, o Instituto Histórico e geográfico


Rodrigo SenaO velório na sede do Instituto Histórico foi um dos pedidos dele. 
O velório na sede do Instituto Histórico foi um dos pedidos dele.

Mais uma vez estamos em pleno veraneio e voltamos nossas
lembranças àquele querido amigo, que certamente será motivo
de muitas orações em sufrágio de sua alma.
O Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte,
a partir do seu falecimento, voltou-se para realizar aqueles
sonhos de que tanto falava - a recuperação do rico acervo,
que já tem projeto para sua recuperação, digitalização e
colocação em forma de mídia eletrônica para a preservação
dos originais, conforme a meta prioritária do Presidente
Valério Mesquita.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

LR



Crônicas de um multiservidor público!
Luciano Ramos
Procurador-Geral do Ministério   Público de Contas do RN.

“E malandro é malandro, Mané é mané! Podes crer que é!

Malandro é o cara que sabe das coisas. Malandro é aquele que sabe o que quer. Malandro é o cara que tá com dinheiro. E não se compara com um Zé Mané.

Malandro de fato é um cara maneiro, que não se amarra em uma só mulher...” (Malandro é malandro, mané é mané, Bezerra da Silva)

Não é de hoje, nossa cultura valoriza o malandro, como um indivíduo esperto, com a espinha flexível, driblador de limites e controles, até alcançar aquilo que quer.  Do lado oposto, muitos cansados de ver a malandragem começam a enxergar-se como um Zé Mané: vale a pena cumprir as leis?

Quando pensamentos deste tipo se generalizam, a sociedade está à beira do abismo, a um passo do salve-se quem puder – e como puder.

Algumas áreas são mais sensíveis à gestação da cultura do levar proveito, especialmente a Administração Pública, sobretudo por conviver com o obscuro e deturpado pensamento de que o bem público não tem dono. Ciente disto, o desafio para quem atua no controle externo é não permitir que se multipliquem os desmandos, sob o risco de contaminação generalizada.

E, neste ponto, um dado em especial chamou a atenção do Ministério Público de Contas do Rio Grande do Norte, obtido às vésperas do fim do ano e ainda a ser aprofundado: a potencial quantidade de servidores com três vínculos ou mais com o Poder Público.

Além de a Constituição Federal proibir objetivamente estas situações, normalmente a multiplicidade de vínculos significa que o servidor não está cumprindo carga horária, recebendo além do trabalho que realmente realiza – sem se descartar a usual hipótese de sequer trabalhar, muito mais grave do que simplesmente “não se amarrar em uma só mulher”.

Tomemos o caso de um multiservidor, detentor de um verdadeiro harém de vínculos com a Administração Pública – sem contar com a iniciativa privada onde também dá o ar da graça. Supostamente, com as ressalvas do contraditório e da ampla defesa por vir, sua força-trabalho divide-se entre 7 vínculos com o Poder Público, distribuídos em pelo menos 6 municípios potiguares – há quem já o tenha visto “servindo” pelas bandas da Paraíba e além.

E é possível que ele não seja o recordista, pois ainda há vínculos de fortes candidatos a serem apurados – em Pernambuco, tem-se notícia de um sultão com 14 vínculos detectados pelo Tribunal de Contas.

Se ele quisesse comparecer regularmente em todos os locais que o dinheiro público lhe remunera, ainda que superasse a vedação física à ubiquidade – não há como estar em dois lugares diferentes ao mesmo tempo – e se deslocasse na velocidade da luz, pois a soma das distâncias entre as cidades pagantes supera 10 horas, mesmo assim, a conta não fecharia. Apesar destes malabarismos impossíveis, encontraria uma barreira intransponível para fazer jus a uma remuneração equivalente a 238 horas semanais.

Ainda não se inventou malandragem capaz de superar o fato de que a semana “só” tem 7 dias e o dia “só” tem 24 horas – o que dá no mínimo 70 horas impossíveis de serem trabalhadas, mas pagas, isso se ele não fizesse outra coisa da vida senão trabalhar para a Administração Pública, nem mesmo dormir.

Felizmente, a maioria dos servidores não se vale destes expedientes – até aqui, não ultrapassa 1% dos remunerados pelo Poder Executivo do RN. Porém, grande é o peso deles nas contas públicas, com significativo impacto de R$ 4 milhões (mais de três vínculos) ou R$ 14 milhões mensais (mais de 60 horas semanais) na folha que o Estado pagou tropegamente em 2014.

Pior, se não houver controle e sanção, os que se sentem um Zé Mané poderão jogar-se nos braços da malandragem. E aí é o caos. Podes crer que é!

domingo, 4 de janeiro de 2015


O PADRE VISIONÁRIO QUE 

APRIMOROU SUA CIDADE

Tomislav R. Femenick – Historiador, membro da diretoria do IHGRN.
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Nascido em 1897, Luiz Ferreira da Mota administrou a sua cidade por quase dez anos.
O Padre Mota foi prefeito de Mossoró em três condições diferentes, porém contínuas. Na primeira fase (de 19.01.1936 a 07.09.1937), ele assumiu o cargo de Prefeito Provisório, atendendo a um pedido de Rafael Fernandes Gurjão, então interventor do Rio Grande do Norte; a segunda fase, a de Prefeito Eleito pelo voto popular (de 07.09.1937 a 30.12.1039), foi interrompida pelo golpe getulista que criou o Estado Novo; e o terceiro período, o dePrefeito Nomeado (de 30.12.1937 a 03.04.1945), até quando renunciou.
Luiz Ferreira da Mota nasceu no dia 16.04.1897, em Mossoró, onde estudou no Colégio Diocesano Santa Luzia e no Grupo Escolar Trinta de Setembro. Depois foi aluno do Colégio Santo Antonio, em Natal, e do Colégio Salesiano, no Recife. Matriculou-se no Seminário da Paraíba, mas sua meta era ir para o Colégio Pio Latino-Americano, em Roma. No entanto havia um obstáculo: lá todas as aulas eram em latim. Em dois meses aprendeu o suficientemente para atender essa necessidade e, com apenas 17 anos, embarcou rumo à Itália. Lá foi ordenado padre. Depois de quase nove anos, desembarcou no Rio de Janeiro, no dia 07.09.1922, data em que o Brasil comemorava o centenário de sua independência.
Os recursos
Quando Padre Mota tomou posse, as finanças da Prefeitura estavam totalmente desorganizadas. O orçamento era uma peça de ficção, sem qualquer compromisso com a realidade. As despesas eram medidas com um grau de incerteza absoluta, e as receitas tomadas com base nas “visões” do governante da ocasião. Na fase de execução, tudo era pior.
Como o orçamento não existia concretamente, o Padre Mota tomou uma medida radical: somente fazer qualquer gasto, se houver “dinheiro no cofre”, e depois de pagar aos funcionários da Prefeitura.
Em 1936 a Prefeitura arrecadou 442,4 contos; em 1945, no fim de sua gestão, mais de dois mil contos de reis.
O Funcionalismo
Antes do Padre Mota assumir a Prefeitura de Mossoró, os funcionários eram escolhidos por parentesco ou por ligações pessoais, sem levar em conta os conceitos de capacidade e eficiência no trabalho. Muitos lá estavam simplesmente por ocupar “seus” cargos há muito tempo. Havia, também, os simplesmente ineficientes, por incapacidade ou omissão. Por outro lado, todos ganhavam pouco e estavam com os salários atrasados; muitos funcionários não recebiam há mais de seis meses.
O novo prefeito resolveu essa situação do seu jeito, sem causar traumas, porém sem transigir. Conseguiu que muitos se demitissem por iniciativa própria e outros foram afastados. Somente permaneceram aqueles necessários à Prefeitura. Com esse corte, deu para aumentar os salários e colocar a folha em dia.
A Luta pela Água
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Recém-nomeado prefeito, às cinco horas da manhã do dia 20.01.1936 o Padre Mota percorreu a cidade que iria governar. Poucas eram as ruas pavimentadas com pedras calcárias irregulares. A poeira cobria as fachadas das casas com uma camada acinzentada. As águas do rio corriam livremente e adentravam pelo perímetro urbano. Quando o sol estava mais alto, um mormaço começou a se levantar do chão seco das ruas limpas de árvores. Havia poucas plantas em algumas praças, mas eram raquíticas e de pequeno porte. Por toda parte, sujeira e lixo.
Uma das suas primeiras providências foi solicitar ao interventor do Estado a presença urgente de um engenheiro em Mossoró, sem dizer o motivo. Uma semana depois, o padre refez o mesmo itinerário daquela outra manhã, dessa vez acompanhado do engenheiro vindo da capital, “um rapazinho novo, quase sem pelos no rosto”. Expôs suas ideias: canalização do rio aqui, uma ponte ali, calçamento acolá e, assim, foi desfiando o seu rosário de obras. O engenheiro recém-formado ficou meio sem jeito, mas perguntou aonde o padre-prefeito iria arranjar tanto dinheiro para fazer tantas coisas. O padre simplesmente riu.

Ponte Jerônimo Rosado, inaugurada na gestão do Padre Mota.
Em 1936, Mossoró tinha somente quatro ruas calçadas. Em 1940, já eram 14, “sem que sejam incluídas várias travessas”. Em sua gestão, foi construída a ponte Jerônimo Rosado, foram assentados quase 50.000 metros quadrados de calçamento e mais de 6.500 metros de meio-fio. Foram construídos cinco jardins e reconstruídos outros dois, o rio Mossoró foi canalizado na área central da cidade, com a construção de 643 metros de balaustradas na margem esquerda, dotadas de 41 postes de iluminação pública. Sua ideia era que ali fossem instalados hotéis, restaurantes e outros estabelecimentos do gênero, transformando essa arborizada e larga avenida em um verdadeiro boulevar.
Ecologia e Estética Urbana

Inauguração da ponte Jeronimo Rosado - 19.04.1944 - 470

Ponte Jerônimo Rosado, inaugurada na gestão do Padre Mota.
Em 1936, Mossoró tinha somente quatro ruas calçadas. Em 1940, já eram 14, “sem que sejam incluídas várias travessas”. Em sua gestão, foi construída a ponte Jerônimo Rosado, foram assentados quase 50.000 metros quadrados de calçamento e mais de 6.500 metros de meio-fio. Foram construídos cinco jardins e reconstruídos outros dois, o rio Mossoró foi canalizado na área central da cidade, com a construção de 643 metros de balaustradas na margem esquerda, dotadas de 41 postes de iluminação pública. Sua ideia era que ali fossem instalados hotéis, restaurantes e outros estabelecimentos do gênero, transformando essa arborizada e larga avenida em um verdadeiro boulevar.
Ecologia e Estética Urbana
Nos anos trinta, nem a palavra ecologia nem a percepção desse conceito eram de conhecimento comum, mas Luiz Ferreira Cunha da Mota também não era um nordestino comum. As suas preocupações para com as coisas da natureza e do ser humano o levaram, quando jovem, a pensar em se formar em Agronomia, antes de querer ser sacerdote. Segundo Vingt-un Rosado, foi a junção dessas duas características – o apego à estética e o horror às feiuras físicas e intelectuais – que levaram o Padre-Prefeito a encher as ruas, praças e avenidas de Mossoró com árvores de Fícus Benjamim. As mudas eram plantadas em terra adubada, eram protegidas por engradados e, caso vingassem, os donos dos imóveis em frente aos quais elas tinham sido plantadas recebia um desconto no imposto predial.
Entre 1936 e 1940, Padre Mota mandou plantar mil árvores; de 1941 a 1945, mais 500. As mudas que não cresciam por qualquer motivo eram substituídas por novas. Sempre havia 1.500 pés de Fícus Benjamim. A grande copa de folha verde escuro amenizava o calor irradiado do sol, que a cidade recebe constantemente. As ruas, agora pavimentadas, já não permitiam que o vento nordeste levantasse a poeira do chão e desse uma cor de cinza às fachadas das residências e casas comerciais. A cidade ficou mais acolhedora e humana. Mesmo nos períodos de secas, o verde da fronde dos fícus permanecia e se destacava do imenso pardavasco em que a região se transformava.
O Ensino
Quando Padre Mota assumiu o cargo de prefeito, em Mossoró existiam 42 escolas administradas pelo Município. Querendo se inteirar da situação, mandou fazer um levantamento das condições e das necessidades de cada uma delas. O resultado foi um retrato desolador. Em algumas mal cabiam cinco crianças, em outras, os mestres não tinham condições de ensinar, pois eles mesmos careciam dos conhecimentos mais elementares. Em todas havia carência de material escolar.
Ele mesmo redigiu o que chamava de “Modelo Educativo para as Escolas Públicas do Primeiro Ensino”, com algumas ideias básicas sobre o assunto. Considerava que a escola pública (como meio de instrução do povo) deveria ser voltada para três fatores que se inter-relacionariam. O ensino e a aprendizagem seriam dois deles. A formação do cidadão, o outro, deveria ser o conjunto dos conhecimentos adquiridos na escola.
Novas escolas foram abertas, houve substituição de professores, transferências das aulas para salões paroquiais, igrejas, capelas e até para templos protestantes, bem como aquisições de quadros, giz, livros, cadernos, lápis e outros materiais escolares. Em todas houve reformulação das matérias ensinadas, incluindo-se algumas voltadas para a realidade local, como formação de hortas, higiene, comportamento cívico etc. Em menos de dez anos, o número de alunos mais que dobrou.
Durante o seu período de governo, foram criadas doze novas escolas municipais. Todas bem aparelhadas e com professores habilitados.