sábado, 6 de julho de 2019



OS SÁBADOS DA MINHA VIDA
Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes, escritor

         Dia de luz, festa do sol e o barquinho a deslizar no imenso azul do mar da minha saudade.
        Os sábados sempre foram os meus dias preferidos – seja, quando jovem, porque não tinha escola ou trabalho e propício para aventuras e passeios. No correr da vida as coisas mudaram um pouco, já agora com o costume de acordar cedo e fazer o café matinal para ouvir, sempre, a expressão da minha eterna Therezinha: Carlos que cheiro bom de café! Esse costume só era suspenso no período de veraneio em Cotovelo, pois tinha as assistentes domésticas que permitiam madornar um pouco mais com ela.
        Na praia, aproveitava o sono da criança (ela) dormindo, sorrateiramente abria a porta da varanda para ouvir a rádio Senado, com o desfilar das suas canções da época de ouro da MPB. Ali ficava até o chamado para tomar o café, após o que nos preparávamos para um passeio pela praia, lugar escolhido para os meus devaneios e alimentar nosso amor. Ali, com ela passei por mais de 30 anos até fevereiro de 2019, com a esperança de retorno em março para participar da 3ª Cotovelada da PROMOVEC. Nosso desejo foi interrompido pela vontade de Deus, que a levou no dia 31, ficando apenas as camisas para a reverência ao Rei Momo.
        Em Natal, o costume era diferente. Logo após o café íamos para a cidade alta fazer, inicialmente, um lanche numa modesta lanchonete da Rua João Pessoa, defronte à Livraria Paulinas, depois um passeio pelas lojas (ver vitrines e fazer compras), uma passagem pelo Beco da Lama e adjacências, um pulo no Chorinho da Praça Padre João Maria, comandado por Carlos Zens, terminando na lojinha de flores VivArte da Felipe Camarão.
        A propósito do lanche, sempre encontrávamos no batente uma idosa senhora, pedinte, a quem dávamos a ajuda semanal, travando uma empatia que se tornou tradição, até mesmo agora que minha Thereza partiu. No caminho da volta em busca do estacionamento da rua General Osório, nos fundos da Caixa Econômica, comprávamos algum conjuntinho caseiro para uso doméstico, para ela e para Rachel.
        E agora, com a sua ausência? Insisto em manter o costume, agora na companhia de Rosa Lígia e, algumas vezes, também, com Thereza Rachel, Carlinhos e Gabriela, para reviver os caminhos radiosos de cada manhã de sábado. Afinal, ela deixou um recado que estaria por perto, em alguma nuvem!
        De repente lembrei, figurativamente, de uma velha canção: A caixinha (ela), já não existe mais, só ficou a saudade do seu trá-lá-lá....
        Oh! Meu Deus, por que?

segunda-feira, 1 de julho de 2019






O casarão construído por Luís Cúrcio Marinho entre 1948-1949,
na Rua João Pessoa, centro de Macaíba e que,
foi repassado ao comerciante Cícero Luís e Silva,
começou a ser demolido hoje, dia 24 de junho de 2019.
Macaíba perde parte da sua memória histórica
arquitetônica para a especulação imobiliária.

MEMÓRIA DEMOLIDA
Por Carlos Roberto de Miranda Gomes, da AML

            Para as pessoas de mais idade, a demolição de uma obra tradicional representa um golpe na memória, porque altera não apenas a geografia física do lugar, mas igualmente a sentimental.
            Senti isso no sábado retrasado quando resolvi visitar a Galeria B-612, na tradicional rua Dr. Barata, quase toda destruída pelo descaso, representando um oásis no oceano do esquecimento dos anos famosos entre 1942 e 1945.
            O fato repetiu-se neste último sábado, quando atendi ao chamamento para uma reunião da Academia Macaibense de Letras, outro oásis no pandemônio da desfiguração da cidade das macaibeiras, que já destruíra a casa de Auta de Souza, ameaça o Grupo que tem o seu nome e agora começa a demolir o casarão construído por Luís Cúrio Marinho, que vi ser construído e compareci à inauguração, quando vivia os melhores dias do começo da minha adolescência e gravei aquela construção de cores vivas, aquela primeira da Rua João Pessoa, à esquerda logo que se atravessava a ponte em direção ao centro.
            Essa casa fazia parte da minha vivência naquela terra hospitaleira, quando morei numa velha construção na Rua Pedro Velho, defronte ao Major Andrade, perto dos Maciel, dos Leiros, dos Fagundes e dos Marinho, do Cine Independência e do antigo Pax, que ostentava um belíssimo quadro do balão de Augusto Severo, que um dia alguém tocou fogo como coisa velha.
            Na minha antiga morada, desfigurada arquitetonicamente, ainda restam os dois janelões no alto onde vislumbrava a rua e assistia à passagem de pessoas feridas, carregadas em cadeiras, para o hospital que ficava bem perto, logo depois da Igreja dos Crentes, prédios que ainda estão de pé, mas com destinação diferente.
            A feira livre ainda funciona na mesma rua, mas também desfigurada, em menor extensão, sem o encantamento dos vendedores/cantadores de cordéis e dos animais de cargas que, na época do cio, desembestavam derramando os produtos que levavam para a venda. Hoje só automotores. Mesmo assim comprei algumas bananas prata, que me adoçaram a vida neste fim de semana.
            Lembrei do mercado velho, defronte do obelisco de Augusto Severo, com suas árvores que davam sombras refrescantes, parada dos ônibus que traziam os jornais e os meus gibis, da passagem dos “mixtos” tocando nas buzinas as músicas de Luiz Gonzaga, senti falta da festa da padroeira com o pau de sebo e os cordões azul e encarnado. Onde está Padre Chacon, de quem fui coroinha nas procissões. E o meu Cruzeiro jogando no campo vizinho ao cemitério, que tinha algumas partidas interrompidas quando a bola caía no campo santo e ninguém encontrava em tempo dos últimos lampejos do sol (principalmente quando estava se saindo bem contra algum time de fora e este pressionando para a virada).


            Não é mais a Macaíba do meu tempo, nem de outros mais próximos, que curti algumas vezes na companhia da minha inesquecível Therezinha. Está mais adensada fisicamente e mendicante das boas lembranças. De bom mesmo só o resultado da reunião da nossa Academia.
            Voltei triste para o meu exílio de Natal e conversei com ela, contando tudo, inclusive umas lembranças que comprei numa livraria religiosa da rua do Cruz (ou da Cruz?) para marcar a passagem pela terra que me outorgou a cidadania honorária, que muito me orgulha.