quinta-feira, 30 de novembro de 2023

 ONDE ESTÃO OS DISCOS VOADORES?


Valério Mesquita*
Mesquita.valerio@gmail.com

O oculto está à nossa volta. O mistério circunda as nossas vidas.
Quando Jesus virá novamente? Quero trazer sempre à memória aquilo que me
dá esperança. Por isso, creio no invisível para não me suicidar no palpável. O
visível encerra vícios redibitórios. Mas, também, sem ser ufólogo, preocupo-me
com os extraterrestres que sobrevoaram o mundo tantas vezes e hoje, em que
galáxia se escondem? Desde o início do século vinte, ocorrências de objetos
voadores não identificados foram manchetes de jornais em todo o mundo.
Avistados por milhares de pessoas, fotografados, filmados, televisionados e até
restos de naves foram recolhidas para exame, sem explicações satisfatórias até
agora.

Observador atento dos canais de televisão nacionais e internacionais
e dos jornais, nunca mais tomei conhecimento de nenhuma aparição luminosa
nos céus que me devolvesse a curiosidade cientifica ou a percepção da
existência de seres interplanetários, como aprendi na meninice com “Flash
Gordon”. Outros, impressionados, chegaram a indagar: “Seriam os deuses
astronautas?” A terra, pelos seus governos, preocupou-se bastante, por décadas,
com os recados dos céus. Mas, surpreendente e inimaginável é o fato dos discos
voadores não aparecerem mais no firmamento. “Não há mais registros, nem
aqui, nem alhures”, como dizia o saudoso amigo e jornalista Paulo Macedo.
O sentimento atávico do homem pelo sobrenatural não é apenas
bíblico. Remonta às civilizações pagãs que procuravam ler e decifrar o que se
achava escrito nas mais remotas estrelas. Os astrólogos, os poetas, os feiticeiros,
todos, usaram as sombras, os símbolos e os fantasmas do espaço infinito como
veículos cambiantes de suas crenças. E como eram líricas as circunvoluções dos
discos a ponto de me induzir a voar com os marcianos (planeta Marte), de onde

achávamos provenientes. A chegada do homem à lua, vaga, vazia e vadia, muito
me decepcionou. Tornou-se um celeste santuário mórbido, seduzido e
abandonado.

Onde estão os objetos voadores não identificados? Por que não se
comenta mais sobre eles? Não posso crer que tudo foi uma farsa. Ilusão, obra
inventiva do homem. Que doce e sedutor enigma não vestiu os dias e as noites
do mundo no século vinte! Resta-me indagar sobre o silêncio, a invisibilidade, o
desaparecimento e o mistério que ficou de tudo isso. Persiste algo oculto por
acontecer? Continuamos sozinhos no universo? O ser humano não pode viver
sem mistério, sem verdade de fé inacessível à razão.

“Marcas do que se foi, sonhos que vamos ter. Como todo dia nasce,
novo em cada amanhecer!**”, diz uma bela canção popular. Os ovnis nos,
legaram o prazer emocional da lenda alcançando o fato. Porisso acho que essas
aparições vão viver em nós para sempre. Esse baú de histórias que a imprensa
mundial divulgou, após a segunda guerra mundial, principalmente, cravou em
nós uma soma enorme de medos. Ainda vou esperar o desfecho. Não deixarei de
preservar a perene novidade celestial dos discos voadores, porque tudo o que
começa, tem que terminar. Viva a ufologia! Pode ser um começo do Apocalipse.
Rússia, Ucrânia, Europa, China, Coréia do Norte, Estados Unidos, etc., cada um
tem a sua ufologia, Ou não?

Lembre-se que o drone não tem extraterrestre dentro. Ele é
teleguiado. O outro brilha no espaço, velocidade espantosa, aparecendo e
sumindo, deixando mistério no ar: “de onde vem, o que quer e para onde vai?”

(*) Escritor.

(**) Composição: José Jorge, Márcio Moura,
Paulo Sérgio Valle, Rui Mauriti e Tavito.

quarta-feira, 29 de novembro de 2023

 

LONGE DO MAR, PERTO DO RIO

- Horácio Paiva *


Em minha viagem a Petrolina e Juazeiro, no alto sertão nordestino, fiz duas navegações: uma, no Rio São Francisco, o Velho Chico, generoso e amado, estendendo-a também ao lago de Sobradinho, um dos maiores lagos artificiais do Mundo; outra, num clássico da poesia norte-americana moderna, o poema “The road not taken” (“O caminho não percorrido”), do aclamado (também por mim) Robert Frost.

Na estrada da vida não raro topamos com a difícil escolha da direção a seguir, quando dois ou mais caminhos surgem à nossa frente e disputam a nossa decisão. Esse é o tema de Frost. O grande poeta ilustra esse impasse existencial pela escolha do caminho mais adequado, com a sua conclusão nesses versos finais, aqui numa tradução livre:

(...)

Dois caminhos divergiam num bosque, e eu,

Eu tomei aquele menos trilhado,

E isso tem feito toda a diferença.”


Poesia e profecia andam juntas... e ante a riqueza do florescente polo agrícola - que tem como maiores expressões demográficas os municípios de Petrolina e Juazeiro -, voltado sobretudo para a fruticultura, vê-se que a opção desse caminho, historicamente recente no semiárido, aqui adotada pelos investidores, foi acertada e fez toda a diferença na alta produtividade alcançada.

O cultivo da uva, por exemplo, que já gerou duas importantes vinícolas na Região, apresenta produção no impressionante patamar de duas safras anuais (potencialmente acrescido de mais meia safra), acima do dobro do alcançado no Sul do País, que registra apenas uma safra.

Mas esse caminho maravilhoso, recentemente trilhado, esteve, durante muito tempo, destinado às criações extensivas de gado, desde os tempos coloniais, quando a área litorânea era, por lei, destinada à agricultura, mais precisamente ao cultivo da cana de açúcar, haja vista que a coroa portuguesa, através de Carta Régia, de 1701, visando proteger e priorizar a atividade canavieira e seu notável sucesso econômico à época, proibira a criação de animais numa faixa de dez léguas da costa.

A história, a poesia, a fraternidade e o bem estar acompanharam-me nessa viagem de conhecimento e identificação. Sim, pois o Nordeste que está em nós é muito maior do que imaginamos, e a tradição nordestina é um baião de dois: amor e solidariedade.

E se o Nordeste é fraternidade, assim também se formou o nosso grupo de navegantes pela Inaraí Tour, sob o alegre almirantado de Carlinhos, nosso anfitrião de Natal, e que inclui, na conexão com Petrolina, Josué Pereira, simpático e arguto guia, também nordestino, natural de Conceição do Canindé, no bravo Piauí.

Petrolina, filha de Pernambuco, e Juazeiro, da Bahia, criadas juntas (Juazeiro apenas 30 anos mais velha que Petrolina), são irmãs que, ricas, ajudam a criar a família e as demais irmãs que as cercam (Casa Nova, Sobradinho, Curaçá, Lagoa Grande e outras), no mesmo passo e no mesmo polo que ilumina o vale do santo de nossos rios, São Francisco, pois se a chuva é escassa nestes sertões, não faltam em suas veias subterrâneas as milagrosas águas.

“O sertanejo é antes de tudo um forte!”, dissera Euclides da Cunha, ao descrever a sua resistência e bravura. E há tempos as carrancas, símbolos de sua audácia, espantaram os demônios da miséria!...

E agora, voltando a Frost e à profecia, teria o caminho influenciado o viajante? Teria, como na clássica oração ensinada pelo Mestre, o Reino vindo ao pecador? Pois foi o que me parece haver ocorrido, após ouvir o emocionado relato existencial do Sr. Didi (Valdemiro Rodrigues Gonçalves), técnico agrícola e dono da Fazenda Santa Isabel, pequeno mas próspero sítio de cultivo de uva, que brindou nossa chegada com um farto banquete de frutas, servido à sombra de um juazeiro, mas, sobretudo, com a luz de sua grande alma acolhedora!... Ali pulsava o coração do Nordeste!...

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(*) Horácio de Paiva Oliveira - Poeta, escritor, advogado, membro do Instituto Histórico e Geográfico do RN, da União Brasileira de Escritores do RN e presidente da Academia Macauense de Letras e Artes – AMLA.


terça-feira, 28 de novembro de 2023

 


 Escrever, terapia e mística 

Padre João Medeiros Filho 

Em determinados momentos, terapeutas e orientadores espirituais de diferentes matizes psicológicos ou religiosos aconselham pacientes e orientandos a registrar seus sentimentos. Nascem daí poemas, diários, romances, crônicas, autobiografias etc. Um dos propósitos é ajudar a lidar com emoções que assaltam a mente humana. Por vezes, escrever torna-se um instrumento de resistência diante de sofrimentos, que ultrapassam o suportável, ameaçam o equilíbrio psíquico e a continuidade da própria vida. Há milênios, Deus dissera ao profeta Jeremias: “Escreve num livro todas as palavras” (Jr 30, 2). Assim agiram pessoas, em meio ao horror do holocausto. Na escrita, encontraram um modo de continuar vivendo diante da dor e ameaça de morte iminente. Foi o caso de Edith Stein, convertida ao cristianismo e canonizada pela Igreja Católica. Há o exemplo da filósofa Simone Weil. Faleceu aos 34 anos, legando-nos uma obra de dezenove volumes, destacando-se “Attente de Dieu” (Espera de Deus). Inclui-se, dentre elas, Etty Hillesum, morta com apenas 29 anos, em Auschwitz. Deixou-nos três tomos de um diário e inúmeras cartas, as quais impressionam pela profundidade de suas manifestações místicas. Sua produção literária motivou a brilhante pesquisa de Michael Davide, intitulada “Etty, humanidade enraizada em Deus.” O Diário de Anne Frank foi leitura indicada em colégios religiosos, nas décadas de 1950 e 1960. Anne passou meses escondida no porão de um prédio, em Amsterdam. Durante esse tempo, escreveu suas memórias. Após sua morte em Bergen-Belsen, a obra foi reconhecida mundialmente como um hino de fé na humanidade diante das ingentes atrocidades perpetradas pelo nazismo. Escrever tem sido o caminho encontrado por muitos para lidar com o sofrimento e o luto. Assim aconteceu com Joan Didion, cuja saúde se fragilizava pela tristeza com a enfermidade de sua filha Quintana. Em seu livro O ano do pensamento mágico, pode-se encontrar reflexões sobre a limitação humana, a doença e a própria morte. Escrevendo, Joan encontrou forças para enfrentar a angústia, a tristeza, o luto e continuar vivendo. Assim conclui: “Sem a escrita, não teria sido possível a superação do infortúnio.” A escuta de si mesmo, colocada em textos, é algo que o homem pratica, há séculos e em várias circunstâncias. Autores de ficção projetam seus tormentos e inquietudes nos personagens por eles criados. Deste modo, exorcizam medos e ajudam os leitores a identificá-los, aprendendo a viver com eles. Em situações difíceis, escrever é a maneira que muitos encontram para resistir aos opressores e eventualmente vencêlos. O texto literário carrega a experiência da aflição e do desespero. Registra igualmente a esperança que conserva a vida, mesmo sob a espada inexorável da morte ou destruição. Belíssimos escritos são produzidos por autores em regimes de exceção, ditaduras, exílios, privação de liberdade. Graciliano Ramos em Memórias do Cárcere emocionou seu defensor Sobral Pinto. Em circunstâncias análogas de prisão, pode-se citar Miguel de Cervantes com Dom Quixote, Oscar Wilde em “De profundis” etc. Isabel Allende, vendo sua filha em coma, afirmou: “O meticuloso exercício de escrever torna-se nossa salvação.” Quem decide redigir, mesmo sob a arrogância de outrem, reafirma a força da vida, que teima em acontecer sob a navalha da violência. O escrito produz algo que servirá de legado às gerações futuras. Importa gravar as próprias experiências e oferecê-las, como espaço no qual outros poderão refletir suas perplexidades e alegrias. Diante da efemeridade da existência, a escrita é terapêutica por ser algo que se fixa para não desaparecer. Nos casos mencionados, a morte ou o tempo interrompeu a vida, mas o texto faz reviver seus atores e autores. O livro não deixa perder na noite do tempo preciosas vivências e resistências. Com ele, outros aprenderão. A leitura será uma visita dolorosa ou aprazível, produzida por aqueles que viveram e narram os fatos. Poder-se-á evitar a repetição de tragédias e dramas. E até criar universos novos, em que a vida triunfe sobre a morte. Jeremias fez dos pergaminhos sua grande terapia, clamando ao Altíssimo: “Cura-me, Senhor, e ficarei curado. Salva-me, e serei salvo, porque Tu és a minha glória e meu refúgio” (Jr 17,14; 16).

domingo, 26 de novembro de 2023

 

Nossa Senhora da Apresentação

Padre João Medeiros Filho

No dia 21 de novembro, celebra-se a solenidade da Apresentação de Maria Santíssima no Templo por seus pais Joaquim e Ana. A Bíblia não relata tal acontecimento, chegado até nós por meio dos escritos apócrifos, como no Evangelho de Tiago. Este episódio da vida de Nossa Senhora despertou o interesse dos cristãos e de artistas plásticos, surgindo daí várias obras sobre o tema. A Igreja dos primeiros séculos ressaltava a figura e a missão da Corredentora. A tradição cristã e descobertas arqueológicas atestam que a Mãe Celestial era reverenciada na liturgia, desde os tempos apostólicos. O fato é registrado por desenhos e pinturas da Virgem de Nazaré, encontradas nas catacumbas romanas. Desde os primórdios do cristianismo, os fiéis veneravam a Mãe do Senhor. Em 62 A.D, junto com uma efígie de Cristo Bom Pastor, deparou-se com inscrições da Ave Maria, indicando que as primeiras comunidades cristãs rezavam essa prece. Daquela época, data um afresco da Virgem, descoberto na Catacumba de Santa Priscila, no qual Ela aparece amamentando o Menino Jesus. Em 451, foi localizada a imagem mais antiga da Mãe de Cristo, atribuída a São Lucas. Mostra Nossa Senhora com a Criança no colo.

No Oriente, a partir do século IV, desenvolveu-se a piedade mariana. Junto com a edificação de templos, iniciou-se o culto às imagens e aos títulos marianos. Desde então, os ícones em sua memória tornaram-se inspiração de talentosos mestres e presentes em muitos locais. Os fiéis guardavam-nos em suas residências e os monges nas celas. Os anacoretas acendiam velas diante deles. Eram levados às prisões para dar força e paz aos apenados. No Ocidente, desde o século VII, celebra-se a festa da Apresentação no dia 21 de novembro, rememorando o aniversário da dedicação da Basílica de Santa Maria, no ano de 543, em Jerusalém. Entretanto, a festa foi oficialmente criada por Gregório XI, em 1372. Em Avignon, os sumos pontífices já celebravam a missa solene da festividade. No Brasil, segundo Frei Agostinho da Beata Virgo, citado por Luís da Câmara Cascudo, a primeira paróquia dedicada a esse orago mariano foi erigida em 1599, na cidade do Natal (RN).

Maria é a mais venerada pelos brasileiros, dentre todos os santos do catolicismo. Amada com afeto filial, faz-se o destino de muitas súplicas, desejos e esperanças dos fiéis, mormente dos que sofrem. A expressão de nossa religiosidade revela-se fortemente na devoção mariana. É inegável o vínculo de permanência na fé. O amor à Virgem apresenta-se em todas as regiões e classes do país, sob muitas manifestações. A base da fé de nossa gente tem a ver com a piedade à Rainha Celestial. São terços, ofícios, orações, benditos, ladainhas, procissões, coroações e inúmeras maneiras de externar a sua crença. O culto mariano não se ensina nos livros. Transmite-se pelo testemunho das comunidades. A participação nos tríduos, novenas e outras comemorações alimenta a religiosidade, penetrando na vida das pessoas. No Brasil, a veneração a Nossa Senhora não se reveste de esquemas e conceitos intelectualizados, mas de sentimentos profundos que brotam da alma do povo.

Maria é expressão da benevolência divina. Pela intercessão da Virgem Santíssima, plena de graça, o Pai não nos abandona à própria sorte. Ela é uma prova de que o Onipotente não se arrependeu de ter criado o ser humano. Foi a Mulher escolhida pelo Altíssimo para sacrário corporal e terreno de seu Filho. Sendo Genitora do Salvador, contempla Deus Pai sem cessar com o seu sacratíssimo olhar. Maria de Nazaré é também nossa Mãe, por livre vontade de Jesus (cf. Jo 19, 26-27). E como tal, é nossa permanente intercessora junto a Cristo. Não se pode viver sem o carinho materno, por isso o nosso Redentor quis legar-nos Maria, face temporal do Divino. Sua ternura continua a se oferecer a cada um dos filhos. Ela poderá atenuar nossas saudades do Céu, uma vez que também esperou por Aquele que nos trouxe a vida e a paz. Privilegiada, teve o Salvador em seus braços. Ela acalentar-nos-á sempre nos momentos de desânimo, com um afetuoso sorriso e um meigo olhar de Mãe. “Bendita és entre todas as mulheres” (Lc 1, 42).