Violência e desigualdade brutal
“Algo está muito mal quando as pessoas de boa vontade consideram que, para viver em paz, é preciso estar armado.”
(Sen. Cristovam Buarque)
(*) Rinaldo Barros
O cenário
de terror que circunda esta reflexão é a invasão de comunidades pobres pelas
forças de segurança, produzindo, dia após dia, civis e policiais feridos e
mortos; ônibus, carros e motos incendiados, milhares de disparos de fuzis e
pistolas, explosões, e centenas de corpos estendidos no chão, a cada dia.
A
conversa de hoje é, em verdade, um olhar sobre a brutalidade da desigualdade,
da pobreza, da miséria espiritual, e da violência intrínseca, cotidiana. Não
falo da violência dos criminosos, que
são o principal foco das ações policiais, mas da pobreza persistente da maioria
da população, como causa e produto da desigualdade brutal.
A
pobreza, violenta em si, mata silenciosamente pela fome, pela desnutrição, pela
ausência de cuidados básicos, pelos transtornos mentais, pela água contaminada,
pelas endemias e pela epidemia de drogas, ilícitas ou não.
Mas é
necessário reforçar que a desigualdade é a fonte de alimentação do caldo de
violência que agride o país, com destaque para a epidemia do crack alterando a
química do cérebro de milhões de crianças e jovens brasileiros.
Será que,
além da construção dos estádios maravilhosos, ainda é possível reconhecer as
feridas abertas, e exigir que as Políticas sociais se traduzam em investimentos
prioritários em Segurança pública, lato sensu?
Entendo
que os pobres são as primeiras vítimas da violência. A desigualdade lhes impõe
uma situação de desamparo tamanho que, para além da violência latente na
condição de carência, confrontada com o esbanjamento de recursos dos mais ricos
e poderosos, ficam sem defesa alguma, e são impotentes contra a violência do
seu dia-a-dia.
Na
periferia, dominada por redes criminosas em razão da omissão do Estado,
famílias inteiras convivem com o risco de desconstituição familiar, ameaças de
morte de crianças e adolescentes, restrições no direito de ir e vir, parentes
desaparecidos, entre outras violências inimagináveis e invisíveis aos olhos
menos atentos.
A Segurança,
como bem público, deveria ser garantida a todos os cidadãos. No entanto,
historicamente, os pobres sempre foram (e continuam sendo) alijados desse
direito, dentre outros tantos tão elementares para a constituição da cidadania.
Hoje, com a luz amarela acesa, o medo é geral, porque ninguém se sente seguro.
As bolsas
e cotas do PT governo não foram capazes de mudar o Brasil real para melhor, mas
perpetuaram a desigualdade brutal, com a manutenção da dominação ideológica e
do consumismo, via manipulação e propaganda mentirosa, em que pese a crescente
banalização da vida. Só não ver quem não quer.
Ao PT
governo, fiel preposto do agronegócio e dos bancos, e sem ter feito nenhuma
reforma necessária à sociedade brasileira, só interessa as alianças que
garantam vencer as próximas eleições; o Brasil que se exploda.
A cultura
da violência, a certeza da impunidade e a indiferença da maioria da sociedade
atestam que, no patropi, “a vida humana vale muito pouco”. Senão, vejamos.
Toda
noite, centenas de milhares de brasileiros não conseguem dormir por falta de
espaço. Eles sobrevivem em celas superlotadas, projetadas para três ou quatro
pessoas, mas ocupadas por mais de 20. A maioria está doente e sofre de
distúrbios mentais. São mal alimentados, violentados, e subjugados por
organizações criminosas.
São
jovens favelados, miseráveis, a maioria negros, (de 15 a 24 anos), muitos deles
traficantes ou viciados.
E,
pasmem, estão sob a tutela do Estado.
Todo dia,
centenas de brasileiros, presos ou sequestrados, são torturados asfixiados em
sacos plásticos, submetidos a choques elétricos e espancados até a morte (vide Mapa
da Violência - http://www.mapadaviolencia.org.br/; filmes “Tropa de elite 1 e 2”
e Manual Prático do Ódio - Ferréz. ed. Objetiva).
Em 2012,
de acordo com as estatísticas oficiais, em todo o Brasil, houve 50.108
casos de homicídios. A maioria
deles com sinais inequívocos de execução. E esse
número é crescente e preocupante.
Este é
realmente o caminho para a solução?
O
narcotráfico terá seu poder reduzido matando-se jovens pobres nas favelas?
O fato é
que a pobreza foi
enquadrada nas favelas e confinada nos chamados bairros periféricos das
metrópoles (cerca de 50% da população do Rio de Janeiro e São Paulo moram em
favelas ou em loteamentos ilegais; e mais de 10% da
população de Natal - umas 100 mil pessoas - sobrevivem em favelas ou
submoradias.
O detalhe curioso
é que os chefes do narcotráfico, milionários, não moram em favelas.
Pra
concluir, desconfio que existe um forte componente cultural associado ao
controle da violência e que este controle funciona melhor onde existe uma ética
social; o que – lamentavelmente – não é o caso do Brasil.
Se esse
raciocínio está correto, o problema da violência urbana, no patropi, tem um
forte componente cultural e está associado ao fato de não termos uma tradição
de respeito aos direitos e às liberdades individuais, e a nossa grande tolerância
com a corrupção, com a transgressão, o tal “jeitinho brasileiro” visando “levar
vantagem em tudo”.
Não há
dúvida de que urge uma profunda reforma no nosso sistema prisional, e de controle
mais rigoroso na execução penal (com a introdução do trabalho forçado como
parte da pena); notadamente em relação aos chefes das organizações criminosas. O
trabalho forçado para condenados, talvez, seja um caminho, uma solução.
Resumo da ópera: as feridas
abertas pela desigualdade brutal nos alerta que Segurança pública não pode ser
um projeto de governo nem de partido, mas do conjunto da sociedade, um projeto
de Nação.