sábado, 4 de outubro de 2014

Um texto que merece profunda meditação



      

PARTIDOS TOTALITÁRIOS EM DEMOCRACIAS CONSTITUCIONAIS
                             José Antônio Giusti Tavares 
   
Professor de Ciência Política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Pesquisador Associado no Centre d’Études et de Recherches Internationales, Fondation Nationale des Sciences Politiques, Paris,em 1985 e 1986. Guest Scholar em 1998,e Visiting Fellow, em 2002, do Helen Kellogg Institute for International Studies, Notre Dame University, Indiana, US.  

Nas democracias constitucionais que funcionam com o sistema presidencial de governo, a representação política e o governo são constituídos por dois procedimentos senão diferentes pelo menos independentes entre si, ambos em eleições universais competitivas periódicas e regulares e com mandato por tempo determinado. Naquelas   que funcionam com o sistema parlamentar de governo a representação política eleita pelo voto popular direto nomeia o governo que, diante dela responsável, exercita suas funções enquanto dela detém a confiança, contando, entretanto, com a faculdade contraposta de submetê-la a novas eleições. Nos dois casos são instituídos e funcionam efetivamente mecanismos de separação e de contenção recíproca entre os poderes constitucionais, bem como um Tribunal Constitucional, guardião supremo dos valores e dos preceitos constitucionais; e, em particular, no sistema parlamentar de governo institui-se a separação entre Chefia de Governo, responsável pela execução das políticas públicas, e a Chefia de Estado, responsável pelo equilíbrio da ordem constitucional. Enfim, na democracia constitucional toda autoridade pública é submetida, em princípio, a mecanismos de responsabilização pública; e os direitos individuais, incluído o direito à vida, à liberdade, à propriedade e à associação, são assegurados pela lei constitucional e pelo poder judiciário.
Os mecanismos institucionais da democracia constitucional são eficazes, sem serem invasivos ou ofensivos, para assegurar o equilíbrio da ordem política e, nela, a liberdade e os direitos fundamentais do ser humano, sem o que não há sequer justiça social. São eficazes, mas são desarmados: são fios de seda, como os denominou Guglielmo Ferrero, o notável jurista, cientista político e historiador liberal italiano da primeira metade do século precedente. Mas fios de seda não permitem atar o dragão da maldade.
Assim, em uma democracia constitucional e representativa, sobretudo quando erodida e fragilizada pela decadência de suas elites, bem como pela corrupção e pela desinformação políticas generalizadas, não só os partidos constitucionais, que se movem nos limites da ordem pública constitucional, mas aquela própria ordem, devem enfrentar o paradoxo de que se encontram com freqüência em inferioridade de condições frente aos partidos revolucionários totalitários que,  participando da política institucional, não só não observam aqueles limites mas manifestamente, por suas proposições e por suas atitudes, atentam permanentemente contra aquela ordem.  
O paradoxo descrito decorre de quatro fenômenos evidentes.
Em primeiro lugar, a democracia constitucional é a mais complexa e delicada dentre as formas políticas e muito dificilmente pode competir pela preferência do homem comum com o totalitarismo, que recorre a uma simplificação brutal da realidade política, substituindo a informação e a análise racional pelo apelo direto ao inconsciente e à emocionalidade de indivíduos mergulhados em situação de massas.
Em segundo lugar, ao participarem da ordem política constitucional os partidos totalitários beneficiam-se das prerrogativas e dos recursos que ela confere, sem obrigar-se aos valores, às regras e aos limites que ela impõe e, sobretudo, sem abrir mão do comportamento revolucionário, conspiratório, insurrecional e golpista.  
Fora do governo mas sobretudo, ao ocupá-lo, adotam simplesmente a estratégia leninista-trotskista da dualidade de poder, que consiste em conspirar pelo alto, do interior das instituições, e mobilizar de baixo, mobilizando camadas sociais disponíveis e receptivas e,  enfim, gerando pressões societárias, inclusive armadas. Este é o caso exemplar, no Brasil, do Partido dos Trabalhadores e de seu braço armado, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, como revela a Circular do Diretório Nacional na qual aquele partido justificava a sua recusa inicial de obrigar-se à Constituição de 1988, que consagrava as normas e as instituições da ordem constitucional estabelecida:
 “O PT, como partido que almeja o socialismo, é por natureza um partido contrário à ordem burguesa, sustentáculo do capitalismo. (...) rejeita a imensa maioria das leis que constituem a institucionalidade que emana da ordem burguesa capitalista, ordem que o partido justamente procura destruir.”.

Ainda em 1988, o atual governador petista do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, sustentou, com a sua conhecida competência doutrinária, na revista partidária Teoria e Debate (n°4, pp. 38-41), a estratégia leninista-troskista da dualidade de poder:  
“...o partido deve responder às exigências  de uma longa disputa pela hegemonia (...) com a construção de uma cultura política e de uma ideologia socialista em bolsões altamente organizados daqueles setores revolucionários, em direção a uma ruptura com o Estado burguês... com respostas dentro e fora da ordem (...), sob pena de limitar-se aos enfrentamentos na esfera política das instituições da ordem, sendo inexoravelmente sugado por ela.”

A noção gramsciana, ultra-leninista, de hegemonia, muito difundida na América Latina, significa poder monopólico e é, portanto, absolutamente incompatível com o pluralismo político essencial à democracia constitucional. 
Alguém muito complacente poderia objetar às citações acima que elas pertencem ao ano de 1988 e que, entrementes, o partido e o político que as enunciaram podem ter alterado suas atitudes políticas. A objeção seria pueril mas respondê-la introduz a oportunidade de pontuar um princípio elementar.
       Partidos e homens públicos têm a responsabilidade de publicar não só as suas concepções e estratégias políticas, mas as revisões ou mudanças que, quanto àquelas, tenham feito. Em 1959, no Congresso de Bad Godesberg, o Partido Social-Democrata Alemão declarou, em um documento formal amplamente divulgado, que a partir daquele momento renunciava a qualquer tipo de confessionalismo político e, em particular, à noção de partido portador de uma teoria, exorcizando, assim, o fantasma do marxismo.
O fato de que o PT ou mesmo qualquer de seus próceres jamais tenha revisto formal e publicamente as concepções originárias do partido, tendo mesmo recusado a comprometer-se com o pacto constitucional de 1988, revela que lamentavelmente está ainda viva a estratégia revolucionária totalitária que fora enunciada naquele ano. Ademais, ao longo dos doze anos do governo petista, as tentativas sucessivamente frustradas de violar os princípios, as normas e as instituições da democracia constitucional e representativa – entre as quais o Programa Nacional de Direitos Humanos III, de 2009, e a Política Nacional de Participação Social, de 2014 – demonstram claramente que não há ambigüidade que consiga ocultar o empenho continuado e cada vez mais radical, por parte do neocomunismo petista, de destruir a democracia representativa e constitucional edificada com tanto esforço, substituindo-a por uma democracia plebiscitária e totalitária.
Em terceiro lugar, os cidadãos comuns, que participam dos partidos constitucionais ou com eles se identificam, partilham a sua dedicação, as suas energias e a sua lealdade entre múltiplas atividades e associações, entre as quais a política e os partidos possuem uma importância limitada, ocupando mesmo um espaço menor. Não há nessa atitude nada de errado. Ao contrário, como já Aristóteles observara, a participação política moderada constitui requisito fundamental da democracia constitucional, que o filósofo denominava simplesmente politéia.  Contudo, pertence à natureza e à lógica dos partidos totalitários apelar para a participação e para a mobilização políticas permanentes, para o profissionalismo e para o ativismo revolucionários de tempo integral e, enfim, para a politização da totalidade das esferas da existência, incluídas aquelas mais íntimas. 
Enfim, em quarto lugar, a compreensão adequada dos valores sobre os quais está fundada a democracia constitucional e das normas e das instituições com as quais opera, bem como dos processos econômicos por referência aos quais se definem as políticas públicas e o comportamento dos partidos nas sociedades democráticas contemporâneas, exige dos indivíduos, em virtude de sua complexidade e sutileza, um nível muito elevado de discernimento intelectual, que se encontra normalmente fora do alcance da informação e do entendimento do homem comum.
A rigor, a participação racional e responsável nas decisões democráticas exige do cidadão um nível relativamente elevado de informação factual, de saber contextual e de saber estrutural, que ele normalmente não possui. Sob tais condições, a democracia constitucional muito dificilmente pode competir pela preferência do homem comum com o totalitarismo, que recorre  a uma simplificação brutal da realidade política e econômica, substituindo a informação e a análise racional pela ideologia, um  “saber de custo próximo de zero, que contém, por outro lado, um apelo direto à emocionalidade e ao inconsciente de indivíduos mergulhados em  situação de massa.
Enfim, o exercício da liberdade e da responsabilidade públicas, inerente à democracia constitucional, implica em assumir custos e riscos, requerendo dos indivíduos um grau pouco comum de segurança psicológica que lhes permita conviver com a incerteza. O recurso normal para reduzir a incerteza e os riscos é provido pela informação factual e pelos saberes contextual e estrutural, o que envolve custos imediatos e a médio e longo prazo, que os indivíduos que pertencem aos segmentos mais baixos da sociedade não podem assumir.                     
Assim, para a maioria das pessoas, pouco capazes de conviver com a incerteza e suportar os riscos inerentes à liberdade pessoal e pública, a ideologia totalitária proporciona uma explicação omnicompreensiva da realidade e da história, que lhes restaura magicamente e a baixo custo a segurança; e o partido ou o movimento totalitário, que a interpreta nos diferentes casos, provê uma autoridade externa onipotente que retira daquelas pessoas o inquietante peso da liberdade de decidir.
Diante desse desigual e insólito desafio as democracias constitucionais mais avançadas e sólidas armam-se com recursos previstos na lei constitucional, o mais importante dos quais é a proscrição de partidos políticos que promovem, estimulam ou apóiam processos conspiratoriais ou qualquer outra forma de violência política: a cláusula de constitucionalidade dos partidos, contida no art. 21, (2) da Constituição da República Federal da Alemanha e eficazmente aplicada pelo seu Tribunal Constitucional, é o exemplo de maior proeminência:  
 “Os partidos que por suas finalidades ou pelas atitudes de seus partidários tentam desvirtuar ou eliminar o regime fundamental de democracia e de liberdade, ou pôr em perigo a existência da República Federal, são inconstitucionais”.        
 
          É verdade que a Constituição Brasileira contém uma cláusula semelhante: o artigo 17 estatui, em seu caput, como requisito para a existência dos partidos políticos, a fidelidade ao “regime democrático”, ao “pluripartidarismo” e aos “direitos fundamentais da pessoa humana”, estabelecendo, no inciso II, “a proibição de recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo estrangeiros ou de subordinação a estes”; e, enfim, no § 4º, veda “a utilização pelos partidos políticos de organização paramilitar”.  Resta aplicá-lo.
     Se, entretanto, um supremo esforço de esclarecimento não conseguir persuadir o eleitor comum que a democracia constitucional, conquistada a duras penas mas perversamente disputada, deve ser preservada, quaisquer que sejam as suas vicissitudes – então, a manipulação populista de justos descontentamentos e o ilusionismo messiânico pavimentarão o caminho auto-destrutivo que, exaurido em Cuba, está sendo trilhado no continente sul-americano pela Venezuela, pelo Equador, pela Bolívia, pela Argentina e pelo Brasil. 
Não tenhamos ilusão. Eleições universais geram legitimidade democrática, mas não legitimidade constitucional. Como profetizou com acerto Alexis de Tocqueville, na ausência de sólidas e vigorosas instituições de representação política e de separação dos poderes constitucionais, incluindo a separação entre Chefia de Estado e a Chefia do Governo, bem como um Tribunal Constitucional, eleições plebiscitárias provêm a ante-sala do bonapartismo e da democracia totalitária.
          Enfim, eleições e reeleições plebiscitárias consecutivas provêm um claro e importante contributo a governos populistas totalitários empenhados em programas de redistribuição direta e ostensiva da renda nacional em benefício das populações pobres ou na linha da miséria. Aparentemente empenhados na eliminação da pobreza, esses governos têm clara consciência de que sua perpetuação no poder é alimentada pela pobreza e dela necessitam, do que decorre que, na realidade, empenham-se não em eliminar a miséria, mas em mantê-la estável e dependente, aguardando-a nas urnas. Sob tais condições é altamente improvável que eleições fortaleçam a democracia constitucional; ao contrário, há alta probabilidade de que contribuam poderosamente para destruí-la.
            A experiência histórica registra importantes casos em que o totalitarismo ocupou o Estado pela via eleitoral, entre os quais o fascismo italiano e o nacional-socialismo alemão, nenhum dos dois foi debelado pela força da sociedade que aprisionara; ao contrário, ambos foram eliminados pela derrota militar infligida de fora, por nações invasoras.     

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

                                                                             Quo Vadis?
Por: Augusto Coelho Leal, sócio efetivo do IHGRN
           
Não lembro bem o ano, mas acho que era 2014, mês de outubro, domingo dia cinco.  A minha memória está meio confusa, pois já faz algum tempo e eu estava em um lugar em que o povo era mais confuso que minha memória.
            Tentava sair daquele lugar, pois não entendia bem o que o povo queria. Peguei as minhas malas, entrei no meu carro, rumo a uma longa estrada, sem destino certo. De repente, nada mais que de repente, surge uma nuvem escura na frente do para brisa. Freei forte, escuto um forte trovão, e uma voz perguntando – quo vadis? 
- Covarde? Covarde uma ova, quem és tu para me agredir assim?
- Calma filho. Estás assustado? Eu perguntei aonde vais?
- Sei lá para onde vou, vou sair deste lugar. Lugar de povo confuso, sem amor próprio, que gosta de viver sobre o cabresto de uma minoria. Apanhando e achando bom.
- Ouça com atenção filho. Hoje é dia das eleições, você não vai escolher os seus representantes legais junto ao Congresso Nacional? O presidente da República? O governador do seu Estado, juntamente com os deputados estaduais?
- Peraí.  Primeiro Dona Voz me diga quem és tu? Segundo, não sou o Altemar Dutra, mas que queres tu de mim?
- Sou sua consciência, quero que volte e vá votar. Escolha seus candidatos, pois votando você está exercendo o seu direito como cidadão de escolher o destino do seu Estado, do seu País.
- Ah! Ta, quer dizer que uma andorinha só vai fazer verão. Eu com meu voto vou concertar essa bandalheira que aí está. Vou colocar essa corja de ladrões que aí está na cadeia, ah, ta entendi.
- Não foi bem isso que eu quis lhe dizer, mas aproveitando, se todos votarem em pessoas dignas certamente as coisas vão mudar.
- Olha Dona Voz, “derna do tempo que King Kong era saguim” que escuto esta história. E sabe por que não quero votar? Porque não vi mudar “nadica de nada.” A senhora entendeu bem? E outra coisa, ta pensando que o povo sabe votar? Nunca. Estou vendo um partido há doze anos no poder, falando em mudanças e o povo aceitando, vivendo de esmolas e achando bom. Muitas pessoas ditas esclarecidas me perguntam - estamos vivendo um período longo de estiagem, você está vendo alguma invasão em alguma cidade? O povo agora tem pelo menos “dinheiro” para comer - dizem. Quando pergunto quanto o governo federal investiu para amenizar este problema, ninguém me responde nada. A tática é manter o povo sobre cabresto, e por isto a roubalheira está solta neste país, e o Zé Povo achando uma beleza, todos fazem festa com a Bolsa Família e outros engodos.
Ouço gente que estudou, nível superior, que sabe lê muito bem, escrever melhor ainda, dizendo que não vota em tal candidata, porque é feia, magricela e nunca exerceu cargo no executivo. Pode? Dona Voz me poupe. Eleição não é concurso de beleza, ou é? E quanto ao segundo argumento, quantos bons governadores foram antes somente deputados ou senadores? Ou mesmo nada disto? E tem mais. A senhora não está vendo famílias aqui e nesse Brasil afora, querendo se perpetuar no poder? Acha isto normal? Temos que nos sujeitarmos a isto? Olha Dona Voz o poeta canta
“O povo foge da ignorância apesar de viver tão perto dela
E sonham com melhores tempos idos, contemplam essa vida numa cela
Esperam nova possibilidade de verem esse mundo se acabar
A arca de Noé, o dirigível, não voam nem se pode flutuar
Ê, ô ô, vida de gado, povo marcado, ê, povo feliz.”
É isso Dona Voz, “povo marcado, é, povo feliz. Analise bem esse final.

E sabe de uma coisa? Estou de saco cheio, e já sei para onde eu vou. Eu vou para Maracangalha, se Alzira não quiser ir eu vou só. Tchau.

FERNANDO DE MIRANDA GOMES

Jurandyr Navarro
Do Conselho Estadual de Cultura
A cidade do sol clareou-lhe o entendimento, desde a infância, ensejando a vivaz inteligência projetar-se na vida social e profissional. Na adolescência, partilhou a fantasia da idade entre a bucólica localidade do Barro Vermelho e a paisagem talássica da praia da Areia Preta, onde o belo cenário descortinava-lhe um futuro promissor.
Filho de jurista, seguiu-lhe os passos, dividindo, com os irmãos, o tesouro da inteligência herdada, formando, com eles e descendência, uma grei familiar honrada, pela régia coroa da dignidade, conquistada pelo caráter bronzíneo, mercê de aprimorada educação.
Contemporâneo de brincadeiras e estudos, acompanhei a sua caminhada pelos colégios e universidade, sendo testemunha da sua fidelidade aos deveres e obrigações e responsável em todo projeto idealizado.
Diplomado, foi atraído pelas causas cíveis, com participação ativa em inúmeros debates florenses. A sua atuação profissional ficou gravada no registro histórico da nobre classe da Advocacia potiguar. Depois, a fisionomia jurídica revelou o interesse pelo direito agrário, alcançando desempenho excelente como Advogado de Terras junto à Secretaria de Estado da Agricultura, antes de pertencer ao Departamento Jurídico do Estado, chefiando a Procuradoria do Patrimônio.
A imagem jurídica reluzia ao lado do perfil de homem público, pelo trânsito bem sucedido, no primeiro escalão administrativo estatal. Toda essa trajetória, destituída de nódoa ética, ante a conduta ilibada, fez, do seu nome, referência axiológica e jurídica. E assim procedendo, foi distinguido com a confiança nele depositada por três governos seguidos, à frente da Procuradoria Geral do Estado e da Casa Civil.
Anteriormente ao desempenho na esfera do direito, Fernando de Miranda Gomes, nos seus verdes anos, prestou serviços na atividade privada, sendo, por algum tempo, Interventor Regional do SENAC, em nosso Estado e, em seguida, exerceu a Diretoria da mesma organização comerciária.
Além da visão administrativa para dirigir órgãos privados e públicos, ele se tornou um especialista em legislação, do aprendizado no cargo de Procurador do Estado. Portou-se exímio Parecerista no decifrar a esfinge da emaranhada e extensa legislação pátria.
Para penetrar no espírito das leis, o Advogado precisa especializar-se, e assim, poder, detidamente, equacionar a legislação constitucional e suas emendas, as leis ordinárias, as delegadas, decretos, suas derrogações e revogações, portarias, medidas provisórias, mensagem do poder executivo, projetos legislativos, referendos, iniciativa popular, plebiscitos (estes, oriundos da democracia semi-direta), julgados dos tribunais, e outros, conferindo-lhes a devida interpretação e consequente orientação, condizentes com os postulados jurídicos vigentes, pertinentes aos superiores interesses da sociedade politicamente organizada.
Na condição de Procurador Geral do Estado, Fernando de Miranda Gomes, competente sempre esteve para fazer a necessária análise da imensa compilação legal, inclusive os códigos, dela emanados.
O seu sucesso deveu-se, também, ao iluminativo carisma da sua liderança.
O valor de profissional do direito auferido, foi por todos os colegas reconhecido, a ponto da sua pessoa ser lembrada para Patrono de uma das Cadeiras da Academia de Letras Jurídicas do Rio Grande do Norte, pelo idealizador da instituição. E o reconhecimento desse valor chegou ao ponto, de seu nome representar a “Medalha Mérito Procurador de
Estado”, prêmio instituido na gestão do Procurador Geral do Estado, Miguel Josino Neto.
A exemplo de outros seres humanos, de singular grandeza, o destino subtraiu-lhe anos de existência, no pleno vigor de sua vida, quando prometia, ainda, alongar a órbita dos sucessos obtidos.
Todavia, ele soube utilizar os anos vividos no conceito do pensador Séneca, o qual entendia ser a dimensão da existência humana medida pelas boas ações e complementada pela sabedoria. "Não é a meta mais longínqua, a vida mais longa; porém, a mais elevada".
Esta, a vida plena!

quinta-feira, 2 de outubro de 2014


Agricultura irrigada
Tomislav R. Femenick – Mestre em economia e historiador.

Captar, controlar e distribuir a água com o uso de canais cavados na terra, calhas feitas de bambu ou de barro cozido, túneis, comportas de pedra, aquedutos e noras (rodas de giro vertical à qual eram presos vasos que levam a água do nível inferior ao superior), ou seja, irrigar as terras agrícolas é costume que remonta às primeiras civilizações que se tem notícia. Foi hábito na Mesopotâmia, no Egito, na China, no sudeste asiático, dos povos mediterrâneos, da meso-América, da África subsaariana e dos Andes sul americanos, entre outros. Esse sistema garantiu a sobrevivência de nações que deixaram marcas na história da humanidade. Pode-se dizer que a irrigação das lavouras foi uma dos primeiros atos econômicos da humanidade. No entanto sempre foi se não desconhecida, porém pouco praticada no nordeste brasileiro, até a primeira metade do século passado.
O historiador Raimundo Nonato tinha verdadeiro respeito pelo espírito empreendedor de José Rodrigues de Lima; industrial, comerciante, agricultor, pecuarista, salineiro, um dos fundadores do Banco de Mossoró e da Cooperativa dos Salineiros Norte Rio-grandense, dono de empresa de navegação, construtor e proprietário de imóveis. O que o professor Raimundo Nonato admirava era a capacidade que o meu avó tinha para descobrir o valor potencial de certas atividades produtivas.
No final dos anos 1930, José Rodrigues comprou cataventos novos para a sua salina e ficou com quatro sucatas sem valor de venda. Então procurou uso para os cataventos velhos. Levou os equipamentos uma das suas fazendas, localizada nas Barrocas, depois da Barragem de Baixo. Ali fez uma das suas experiências, uma das primeiras de cultura irrigada do vale do Rio Mossoró: instalando-os em série contínua e, levando a água para a região mais alta do terreno, conseguiu irrigar suas plantações de banana, mamão, laranja, cenoura, abacaxi, girassol etc., usando a queda natural que acompanhava a descida de nível. Usar catavento na agricultura não era novidade. Novo era o método. Essa sua experiência foi repassada para diversas outras pessoas, inclusive ao ex-governador Dix-sept Rosado, que a usou em seu sitio.
Outro grande inovador no processo de irrigação da agricultura no oeste foi o bispo Dom Eliseu Simões Mendes, o terceiro ocupante da diocese de Mossoró. No começo dos anos 1950, através do seu trabalho social junto às populações rurais dos vales dos rios Mossoró e Assú, Dom Eliseu – com ajuda do governo federal – implantou um programa de irrigação com o uso de motobombas movidas a motor diesel, visando produzir alimento para sustento dos pequenos agricultores, bem como excedentes para venda no mercado. Muito embora o sistema de captação de água tenha substituído os cataventos pelas motobomba, o principio de distribuição da água continuou o mesmo utilizado por José Rodrigues. Aliás, presenciei varias reuniões entre eles e o Padre Mota; este último vigário geral da Diocese, ex-prefeito e cunhado do meu avô.
Outro grande avanço da irrigação do semiárido potiguar deu-se no período de expansão da empresa Maisa, quando esta abandonou sua ideia inicial de cultivo de algaroba e passou a plantar frutas. Vários aspectos diferenciaram esse projeto dos anteriores. Entre eles a sua localização, na chapada do Apodi, longe de curso de água normal e, por isso, dependente de poços artesianos, bem como o sistema de distribuição de água com uso de pivôs rotativos.
Os pioneiros estavam no caminho certo. Segundo dados do IBGE, até agosto deste ano 59,75% da produção agrícola do Rio Grande do Norte veio da região oeste. O resto do Estado (incluindo o agreste e o leste potiguar) ficou somente com 40,25%.

Tribuna do Norte. Natal, 28 set. 2014.

quarta-feira, 1 de outubro de 2014


Diálogo ocorrido entre 1643 e 1715

Este diálogo, da peça teatral "Le Diable Rouge", de Antoine Rault, entre os personagens Colbert e Mazarino, durante o reinado de Luís XIV, século XVIII, apesar do tempo decorrido.... não é bem atual? Leiam:

Colbert:
- Para arranjar dinheiro, há um momento em que enganar o contribuinte já não é possível. Eu gostaria, Senhor Superintendente, que me explicasse como é possível continuar a gastar quando já se está endividado até o pescoço…

 Mazarino:- Um simples mortal, claro, quando está coberto de dívidas e não consegue honra-las, vai parar na prisão. Mas o Estado é diferente! Não se pode mandar o Estado para a prisão. Então, ele continua a endividar-se… Todos os Estados o fazem!
 Colbert:- Ah, sim? Mas como faremos isso, se já criamos todos os impostos imagináveis?

 Mazarino:- Criando outros.

Colbert:
- Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres.

Mazarino:
- Sim, é impossível.

Colbert:
- E sobre os ricos?

Mazarino: -E os ricos também não. Eles parariam de gastar. E um rico que gasta, faz viver centenas de pobres.

Colbert: - Então, como faremos?

Mazarino:
 - Colbert! Tu pensas como um queijo, um penico de doente! Há uma quantidade enorme de pessoas entre os ricos e os pobres: as que trabalham sonhando enriquecer e temendo empobrecer. É sobre essas que devemos lançar mais impostos, cada vez mais, sempre mais! Quanto mais lhes tirarmos, mais elas trabalharão para compensar o que lhes tiramos. Formam um reservatório inesgotável.
 É a classe média!
______________
Colaboração do leitor Sérgio Guedes da Fonseca Neto