Sobre o caos e seus efeitos (II)!
Procurador-Geral do Ministério Público de Contas do RN.
“Sonhar, mais um sonho impossível. Lutar, quando é fácil ceder. Vencer o inimigo invencível. Negar, quando a regra é vender.
Voar num limite improvável. Tocar o inacessível chão. É minha lei, é minha questão. Virar esse mundo, cravar esse chão.
E o mundo vai ver uma flor
brotar do impossível chão...” (Sonho impossível, Chico Buarque.)
Há algumas flores que encontram resistência especial para brotar e desenvolver-se. Ora é a aridez do terreno, ora são os ventos desfavoráveis. Mas, quais são os limites do improvável? Quão fortes são as barreiras que nos impedem de acessar terrenos mais férteis?
Lá se vão alguns anos, desde o momento em que o Movimento Articulado de Combate à Corrupção (MARCCO) iniciou debates sobre a ordem cronológica de pagamentos no Estado e nos municípios do Rio Grande do Norte, com seus reflexos sobre a devida aplicação dos recursos públicos.
Ou seja, para evitar perseguições e favorecimentos em qualquer esfera, a solução simples sempre foi tratar os fornecedores de maneira impessoal, criando um cronograma de pagamento de acordo com a data que o contratado cumpriu suas obrigações acordadas com o Poder Público – por óbvio, o MARCCO não inventou a roda, esta exigência foi feita pela lei de licitações e contratos administrativos há mais de duas décadas (art. 5º, Lei 8.666/93)
Este debate foi inspirado e inspirou atuações das Instituições que compõem o MARCCO, notadamente o Ministério Público de Contas (MPC/RN) e o MPRN. Porém, avançamos pouco em termos de resultados práticos. Lamentavelmente, para que esta semente germine em determinadas Administrações Públicas, tem-se que enfrentar ventos resistentes e refratários, que irracionalmente optam pelo caos como meio de extrair algum benefício.
Isto sem contar a complexidade que é dar um freio de arrumação em uma realidade gestada ao longo de anos, para haver ordem a partir de então. Regras de transição e critérios de conveniência e oportunidade sempre foram fonte de muitos problemas no Direito.
Mas eis que o caos e suas interações imprevisíveis começam a virar a direção do vento, adubando um pouco melhor o terreno antes tão inóspito. Com a crescente secagem da fonte pagadora dos fornecedores públicos, fruto do descontrole das finanças públicas, a solução legal da ordem cronológica de pagamento começa a ter um pouco menos resistência, pois muitos já percebem que é a única garantia de que efetivamente receberão.
De fato, diante do endividamento crescente do Rio Grande do Norte, com os fornecedores vendo seus créditos serem rolados sem perspectiva de melhora, é facilmente verificável que insistir no caos significa aproximar-se da ruptura do sistema, onde todos sairão perdendo – uns mais que outros, como sempre.
Lembremos Rui Barbosa: “entre o fraco e o forte, é a lei que liberta e a liberdade que escraviza”. Se o Estado tiver a liberdade de pagar a quem ele queira, da forma como bem entenda, os fornecedores estarão sujeitos às variações de humor do dono cofre, prejudicial para a segurança dos negócios e para a proteção do Erário.
Esperemos que esta superação do caos nos pagamentos possa ser capitaneada pelo controle externo, tal qual o foi em São Paulo e mais recentemente no Ceará, exemplos de que o impossível não é tão absoluto assim. Afinal de contas, o outrora inacessível só continuará a ser se nada fizermos para mudá-lo, como se estas barreiras pudessem ser quebradas só com a força da natureza.
E que assim seja antes que o caos já tenha virado tudo de ponta-cabeça!
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