quinta-feira, 9 de maio de 2024
JOSÉ MARTÍ, POETA E LIBERTÁRIO
Horácio Paiva *
Nos meus tempos de militância, em que mais estive envolvido com as questões sociais de nosso País, sentia-me inspirado pelas ideias e pela ação de três grandes personalidades históricas que admirava e ainda hoje admiro: Santo Agostinho, Gandhi e José Martí. Serviam-me de exemplo e os conduzia como flâmula libertária em meu coração.
José Martí foi um dos grandes heróis da independência cubana em relação à Espanha. Além de excelente poeta, era um sábio, um autêntico humanista. E quanto à sua espiritualidade, como destaca o pesquisador, professor e escritor Werner Altmann (in “Martí Revolucionário”), “livrou-se de todo o dogma e liturgia para transformar sua fé em força moral incorporada à sua religiosidade, à qual vinculou, por toda a vida, o espírito de liberdade, justiça e dignidade. Em virtude disso, sua religiosidade não pode ser dissociada de sua ética nem de seu pensamento político-social.”
E cita o eminente ensaísta e poeta argentino Ezequiel Martínez Estrada (in “O Pensamento Político e Religioso de José Martí”), que aponta para duas influências decisivas experimentadas por Martí, ao ler a Bíblia: “a de Moisés, na identificação da Vontade de Deus e a Lei, e a dos Profetas e Juízes, no sentimento insubornável da Justiça.”
Martí, um revolucionário não sectário, não promovia o ódio. Não respondia ao ódio com o ódio. Ao contrário, cultivava o amor e o dirigia até mesmo aos seus adversários, como expressa nesse seu belo e famoso poema, “Cultivo uma rosa branca”, aqui transcrito na tradução de Fábio Malavoglia:
CULTIVO UMA ROSA BRANCA
Cultivo uma rosa branca
em junho como em janeiro
para o amigo verdadeiro
que me dá a sua mão franca.
E para o cruel que me arranca
o coração com que vivo,
nem cardo ou urtiga cultivo;
cultivo a rosa branca.
Há uma frase desse humanista e grande poeta que sempre trago comigo e que diz: “No hay más que un medio de vivir después de muerto: haber sido un hombre de todos los tiempos - o un hombre de su tiempo” (“Não há mais que um meio de viver depois de morto: haver sido um homem de todos os tempos - ou um homem de seu tempo”).
Tenho-a não apenas no coração, mas também num quadro, um cartaz feito a bico de pena pelo célebre pintor cubano René Portocarrero, já falecido. E foi-me presenteado por alguns artistas cubanos em 1989, quando estiveram em Natal e aqui participaram da I Semana de Arte Cubana, com exposição na Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN - e recital de poemas na AABB (Associação Atlética Banco do Brasil), com minha participação como tradutor. O grande poeta e ensaísta Félix Contreras capitaneava essa boa turma.
Neste mês de maio, aniversário da morte de Martí, será lançado em Havana um livro físico em homenagem ao grande poeta cubano, pela ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE TROVADORES - OMT. O livro, também será lançado pela editora da Amazon, em formato de e-book, posteriormente.
O que há de novo nesse lançamento é a presença, no livro, de 5 escritores potiguares. São eles: Horácio de Paiva Oliveira (AMLA, UBERN, IHGRN), Marcos Antonio Campos (UBERN, ATRN, SPVARN), Francisco Gabriel (ATRN, Casa do Cordel), Aída Maria de Faria (ATRN), Edson de Paiva (SPVARN).
A obra conta com escritores da: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Espanha, Israel, México, Peru, Uruguai e Venezuela. A publicação é bilíngue em espanhol e português.
Concluo com poesia, com minhas trovas nesse livro histórico:
JOSÉ MARTÍ, LIBERTADOR
Homem de todos os tempos
há de ser um humanista
um líder sem contratempos
além dos passos do artista
Girassóis e rosas brancas
são recados de amizade
e os poemas cartas francas
flâmulas da liberdade
........................................................................................................................
*Horácio de Paiva Oliveira é poeta, advogado, escritor, presidente da Academia Macauense de Letras e Artes – AMLA, membro da União Brasileira de Escritores – UBE/RN, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte – IHGRN.
quarta-feira, 8 de maio de 2024
A permanência do conhecimento e do humanismo na vida do professor Alberto Campos
Na “capital” do Seridó, Alberto faz duas amizades improváveis que mudariam sua vida.
gazeta de macaugazeta de macauAbr 26, 2024 - 17:0358
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A permanência do conhecimento e do humanismo na vida do professor Alberto Campos
Por Carlos Lucas*
Passar em revista a vida do odontólogo e professor Alberto Campos, mesmo em
poucas linhas, equivale a caminhar no terreno pavimentado do conhecimento e
do humanismo. Antes do profissional conceituado e do professor laureado, temos
o homem educado, cordial e elegante no trato. Um cavalheiro na humana arte da
convivência. Alberto Campos viu luz pela primeira vez em 20 de outubro de
1909, no bairro de Afogados, no Recife.
Os estudos secundários foram feitos no
Colégio Marista, onde teve uma consistente educação religiosa, a ponto de se
tornar seminarista na capital de Pernambuco, o que lhe rendeu grande trato com o
latim. O esporte também fez morada na vida do jovem Alberto Campos. Na
Veneza brasileira, vestiu as cores do Sport Club do Recife, pelo qual foi ponta
esquerda.
Filhos de pai português de pouco estudo, mas empreendedor, Alberto e seus
cinco irmãos ganharam uma polpuda herança quando da morte do genitor.
Todavia dilapidaram a fortuna como se não houvesse amanhã. Os herdeiros
gastaram a dinheirada com coisas mundanas e avistaram nuvens plúmbeas no
horizonte. Nas idas e vindas da vida, o ex-seminarista recebe outro chamado: o
da Odontologia. Ingressa na Faculdade de Medicina do Recife e cola grau a 7 de
dezembro de 1933. Tão logo empunha o diploma monta consultório na capital,
onde clinica por pouco tempo. Casa-se em primeiras núpcias com Maria José
Granja, com quem teve uma filha por nome Dejardiére. O casamento não vai à
frente. Em seguida, parte para Igarassu, na Região Metropolitana. E da cidade
litorânea pernambucana segue para Caicó, destino de quem saia do Recife, via
Igarassu.
Na “capital” do Seridó, Alberto faz duas amizades improváveis que mudariam
sua vida. Conhece os próceres da política potiguar, notadamente Dinarte Mariz e
Walfredo Gurgel. Visando voos mais altos, Campos se muda para Natal, onde
monta consultório em um prédio de dois pavimentos na avenida Rio Branco com
a rua Ulisses Caldas. Ingressa na política e se candidata a deputado estadual pelo
Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Não obtendo êxito, vai trabalhar na Legião
Brasileira de Assistência (LBA), à época situada à avenida Bernardo Vieira, hoje
Nevaldo Rocha. Egresso da LBA, ingressa na Faculdade de Odontologia da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Carreira
Na UFRN, Alberto Campos deixou seu nome no panteão daquela instituição de
ensino, onde exerceu diversos cargos. Em 1948 é nomeado para reger a Cadeira
de Clínica Estomatológica da Faculdade de Odontologia, por ato do Governador
José Augusto Varela. Dez anos depois, em 1958, recebe outra nomeação. Desta
feita para o cargo de Dentista, do Quadro Geral de Pessoal do Serviço Social da
Indústria (SESI). No ano de 1960, nova nomeação para a função de Dentista pelo
então Governador Dinarte Mariz. Em 1966, Campos é designado pelo Magnífico
Reitor da UFRN, Onofre Lopes da Silva, para ser coordenador de Odontologia
junto ao Centro Rural Universitário de Treinamento e Ação Comunitária
(Crutac).
Notável em seu campo de trabalho, toma posse no ano de 1967 como Diretor da
Faculdade de Odontologia, ficando no cargo até 1971. Um ano depois assume o
posto de Professor Titular da citada faculdade. No mesmo 1972 é nomeado professor Catedrático da UFRN. No período de 1974 a 1976, assume a chefia do
Departamento de Odontologia Clínica. Dois anos se passam, e em 1978 o
professor Campos recebe a Medalha do Mérito Universitário, no Grau de Oficial.
Para coroar a carreira na academia, em 1980 granjeia o título de Professor
Emérito da UFRN.
Ainda na academia, Alberto Campos foi chefe de gabinete de vários reitores,
especialmente Onofre Lopes, Genário Fonseca e Domingos Gomes de Lima. A
sua contribuição para o crescimento do Curso de Odontologia é inegável. Por
meio de suas iniciativas, capacitou e qualificou incontáveis profissionais para o
mercado de trabalho. Com a construção da nova sede da Faculdade de
Odontologia, na avenida Salgado Filho, em amplas e modernas acomodações,
cresceu a necessidade de aumentar o quadro docente com Curso de Pós-
Graduação, assim como qualificar o existente. Pensando sempre na excelência
dos profissionais, Alberto usou a Pós-Graduação em Odontologia, na cidade de
Bauru, no interior do Estado de São Paulo, como porta de acesso para que os
recém-formados em Odontologia ingressassem na docência da Faculdade.
Pelos notáveis e relevantes serviços prestados à Faculdade de Odontologia,
empresta o nome à Biblioteca Setorial. Também é homenageado com o nome de
rua Professor Alberto Moreira Campos, CEP: 5908-520, no bairro de Nova
Parnamirim, na zona Sul. Campos também foi presidente da Comissão
Permanente de Tempo Integral e Dedicação Exclusiva (Copertide), que, à época,
cuidava da avaliação e concessão do regime de trabalho dos professores da
UFRN, tempos depois rebatizada de Comissão Permanente do Regime de
Trabalho. Nos dias de hoje recebe o nome de Comissão Permanente de Pessoal
Docente (CPPD). Alberto Campos trabalha na UFRN até atingir a idade da
aposentadoria compulsória, aos 70 anos. Incapaz de viver longe da academia,
regressa à Universidade, sem ônus, para prestar serviços na Coordenação dos
Campi, que funcionava em uma pequena edificação com pouco mais de 60
metros quadrados, próxima ao Setor de Aulas Teóricas I, no Campus Central da
UFRN.
Honrarias
O professor Campos já fazia parte e movimentava-se com desenvoltura no seio
da sociedade natalense, quando em 25 de janeiro de 1967 o seu nome foi
proposto para integrar o Quadro de Maçons da Loja Maçônica Bartolomeu
Fagundes, que pertence ao Grande Oriente Independente do Estado do Rio
Grande do Norte (Goiern). A apresentação do nome de Alberto coube ao amigo e
colega de profissão, Ascendino Henriques de Almeida Junior, sendo aceito, por
fim, em sessão realizada a 5 de abril de 1967.
A iniciação ocorreu no dia 5 de agosto do mesmo ano, no grau de Aprendiz. No
ano seguinte, passou ao grau de Companheiro para, em seguida, passar a Mestre
Maçon. Na Maçonaria, Alberto percorreu uma trajetória de sucesso, ocupando
vários cargos, tanto no âmbito da sua loja Maçônica, como no âmbito do Goiern.
Foi Primeiro Experto, Orador, Secretário, Conselheiro Estadual e Deputado na
Soberana Assembleia Legislativa Maçônica por várias legislaturas, chegando
ainda a Grande Inspetor da Ordem (Grau 33).
Por tudo que representava para Natal, o reconhecimento de Alberto Campos veio
com o Título de Cidadão Natalense, proposto pelo vereador e amigo José Elesbão
de Macedo, que por muitos anos exerceu atividades na antiga Faculdade de
Odontologia. A proposta foi aprovada por unanimidade dos vereadores presentes
à sessão, e o Título entregue em Sessão Solene, na Câmara Municipal do Natal,
numa época em que a sede do legislativo municipal funcionava na Praça André
de Albuquerque.
Registre-se, ainda, que na Academia Norte-Riograndense de Odontologia,
Alberto Moreira Campos é o Patrono da Cadeira 34.
Vida pessoal
Logo que chegou a Natal, Alberto Campos conheceu a jovem ceará-mirinense
Geny Brandão, escrevente da Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA). O
primeiro alumbramento foi nas areias escaldantes da praia, hoje conhecida como
dos Artistas. E o amor à primeira vista logo tomou morada no coração do
pernambucano. Ainda na praia, quando deu sua hora, Geny recolheu seus
pertences para voltar para sua residência na avenida Presidente Bandeira. Morava
com a família. Alberto a seguiu e nas proximidades da casa da pretendida, pediu
a um adolescente para levar um bilhete até as mãos de Geny. A investida não
surtiu efeito de imediato. Após novas tentativas e de paciência bíblica, Alberto,
com muito tato, conquistou o coração de sua amada para sempre.
Consolidado o matrimônio, o casal vai morar na rua Trairi, no bairro de
Petrópolis. Em seguida, na rua Senador Guerra, na Cidade Alta, avenida
Presidente Bandeira, no Alecrim, voltando para a rua Trairi. Ainda em
Petrópolis, Alberto, Geny e filhos moram em três casas distintas na rua Ana Neri,
e, finalmente, em 1967, o odontólogo adquire uma casa própria na rua Tenente
Brandão, no Alecrim.
Do laço matrimonial entre Alberto e Geny, nasceram sete rebentos,
nomeadamente Roberto Campos (morto prematuramente), Sônia Paiva Campos,
Lígia Campos, Geniberto Campos, José Ferreira Campos, Paulo Roberto Paiva
Campos e João Maria Paiva Campos (Joca).
Amigos e familiares descrevem Alberto Campos como um homem elegante e de
bom coração. Era um cidadão solar. Apreciava dias ensolarados na sua casa da
cidade, na granja ou na casa de praia. Mas ao cair da tarde era tomado de uma
melancolia que só encontrava consolo em Geny. Cidadão de hábitos simples, no
meio da semana gostava de fazer compras de mantimentos para a casa. Escolhia
mercadinhos de bairro, em vez de supermercados. Optava por comprar um item
por dia para ter o que fazer todos os dias da semana. Aos domingos costumava
fazer compras em uma feira instalada na rua São José, entre as avenidas
Bernardo Vieira e Antonio Basílio.
A 17 de janeiro de 1987 faleceu Alberto Campos, há menos de um ano do
encantamento de Geny, em 1986, por complicações decorrentes de um Acidente
Vascular Cerebral (AVC). Com a partida da amada, o professor tornara-se um homem melancólico, ensimesmado. Era difícil viver sem a presença física da
companheira de longa data. Se a rotina perfeita é Deus, Alberto foi se encontrar
com Geny nos braços do Senhor para lá continuarem a se amar.
Carlos Frederico Lucas é articulista, poeta e contista.
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