sábado, 20 de setembro de 2014


Uma pescaria no Potengi

Elísio Augusto de Medeiros e Silva


Empresário, escritor e membro da AEILIJ


Chegamos a Ribeira pouco mais de quatro horas da manhã. As margens do Potengi – no cais Tavares de Lira – vimos diversas luzes que brilhavam sobre a água do rio e moviam-se em silêncio. Eram os candeeiros e lamparinas dos botes e canoas de pescadores que cruzavam o rio, com ajuda da luz da lua cheia, que se derramava sobre o Potengi.

As cores da água se alteravam constantemente, talvez, em função das correntes do rio, que se movia lentamente em sua longa calha até o mar, onde se dissolvia na água salgada.

De onde estávamos, vimos alguns hidroaviões da Condor, que flutuavam no rio largo. Mais a direita, alguns vapores da Lloyd Brasileiro, ancorados, à espera de mercadorias a serem embarcadas.

Dentro de uma daquelas toscas embarcações de pesca um homem rema, enquanto outro permanece de pé, segurando uma rede de pesca com as mãos. A canoa segue a favor da correnteza do rio – ao contrário, exigiria muito esforço. São homens fortes, ágeis, de pele bronzeada pelas suas atividades diárias.

Os peixes, atraídos pela luz das lamparinas, aproximam-se dos barcos e botes. Vez ou outra, a água era irrompida por algum peixe que saltava. Em movimentos rápidos e precisos, os pescadores jogam suas redes nas águas, tentando capturar os peixes que se aproximam sem cautela. De onde estávamos o som das redes rompendo as águas é quase imperceptível. A alvorada aproxima-se e os homens têm pressa.

De repente, algo espadana próximo à canoa de um deles, Simão, um velho pescador de Maracajaú. Atento, ele olha fixamente na direção. Em silêncio, faz um sinal para seu companheiro, que, imediatamente, rema para o local indicado. Simão está atento, tenso.

O barulho do remo cortando a água é o único som audível que chega até nós. Vez ou outra, um peixe salta sobre a superfície da água, em frente à canoa. Aos poucos se aproximam do local.

O velho pescador lança o olhar experiente ao redor da pequena embarcação, procurando algo que denuncie a presença de algum cardume. Em silêncio, inclina-se sobre a água, à procura de algum sinal revelador.

Percebe uma pequena ondulação na superfície, e uma mancha brilhante logo abaixo. Está no meio do rio, mais ou menos na confrontação do Cemitério dos Ingleses. Não tira os olhos do local.

A luz do sol começa a aparecer no horizonte – o dia está clareando. A rede é lançada com maestria, e logo dezenas de peixes se debatem em seu interior.

Agachados na beira da canoa, ele e o parceiro somam suas forças para arrastarem a rede, recolherem o fruto de seu trabalho. Os seus rostos estão crispados e vermelhos, por conta do esforço da árdua tarefa.

Pouco depois, os peixes agitam-se sobre o fundo da embarcação – uma quantidade razoável de pescado. Após acomodarem a rede de pesca num cantinho da canoa, tomam o rumo do Canto do Mangue. É hora de voltar – o sol já emite seus raios fortes sobre as águas do rio, em constante movimento.

 

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

S.O.S.




S.O.S.  CASA DO ESTUDANTE
Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes


A resenha do noticiário recente da mídia impressa e televisada trouxe-me profundas preocupações a propósito da situação pela qual está passando a Casa do Estudante.
Por variadas razões precisamos agir, em cruzada solidária entre a sociedade e os poderes públicos visando à solução de tão grave assunto.
A hora não é para avaliar os culpados, mas agir no caminho da recuperação física do prédio e manutenção dos nossos estudantes.
Como afirmei, existem muitas razões para nossas atenções – a uma, porque trata-se de um prédio histórico, que precisa ser preservado; a duas, porque ali passaram figuras que marcaram a história da luta pela liberdade e pela democracia; a três, em razão da importância dos que ali habitam, estudantes carentes, vindos do interior e que aqui estão buscando uma luz para seus caminhos e para os caminhos do nosso Estado.
Creio que temos várias formas de solucionar o problema. Inicialmente sensibilizando, por exemplo, o IPHAN e o IHGRN que são responsáveis pela preservação do patrimônio histórico; em seguida, a UFRN através dos seus cursos de Arquitetura e Engenharia, fazendo um levantamento para uma recuperação física do prédio, sem o que nada poderá ser feito, haja vista a necessidade imperiosa da preservação de um patrimônio tombado.
Não podem ficar fora dessa milícia de reconstrução órgãos de classe, como o CREA, o Conselho de Arquitetura, a Ordem dos Advogados do Brasil/RN e as instituições políticas em todos os graus, todos responsáveis, de alguma maneira, pela manutenção de uma qualidade de vida para os nossos estudantes.
Também, em outro plano, pode a sociedade civil organizada manter campanha para angariar mantimentos para os residentes e para isso gostaria de levar a idéia aos clubes de serviço como o Rotary e Lions.
Da minha parte, lanço a campanha e gostaria de receber sugestões da comunidade da rede social na internet e levarei este propósito à OAB, UFRN, Rotary e Lions e tentarei que comissões sejam criadas nesse direcionamento.
Este é um pequeno passo; outros serão dados com as sugestões dos internautas e cidadãos solidários.

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

 
A economia no caminho do vinagre
Tomislav R. Femenick – Contador, mestre em economia.
 
            Recentemente fui convidado para almoçar na casa de um casal amigo.  Como manda a praxe, escolhi entre as minhas poucas garrafas de vinho aquela que seria a melhor opção para levar. Era o tipo certo de vinho, da marca certa, da safra certa. Era minha obrigação “fazer bonito” junto a pessoas que cultivam o prazer de uma boa mesa, com um bom vinho. Estava todo correto, até a hora de abrir a garrafa. A rolha tinha um defeito e o lacre não foi capaz de impedir a penetração do ar. Resultado: o vinho vinagrou; um vinho maravilhoso tinha se transformado em apenas um vinagre razoável.
            Esse fato corriqueiro e extremamente particular veio a minha mente quando comecei a analisar alguns dados da economia nacional, referentes a datas que correspondem aos meses recém-passados. A avaliação crítica desses elementos conduziu-me a conclusões que se chocam entre si. Há fatos bons e adequados, porém o viés, o comportamento dos índices no decorrer do tempo, apontam para um futuro se não aterrorizador, mas certamente preocupante.
            O país ainda tem um confortável estoque dólar e euro, as chamadas moedas fortes, que faz com que não exista problema de rolagem de dívida externa, e a inflação não atinge um patamar gritante; fonte das crises tradicionais que sofremos no passado. Todavia, nada garante que esse cenário se sustente por muito tempo. O que realmente preocupa é o “estado de espírito” que contamina o futuro da economia do país, isso em decorrência de fatos concretos.
A expectativa do PIB brasileiro para este ano decresce, em linha de queda sem interrupção, sempre abaixo de 1%. O emprego na indústria registrou um retrocesso de 0,7% em julho e no ano já acumula perda de 2,6%. As montadoras de veículos vêm reduzindo sua produção de maneira contínua. A Nissan suspendeu temporariamente o contrato de trabalho de 279 funcionários. Outras foram mais longe: a Peugeot-Citröen, suspendeu o contrato de 650 empregados e a General Motors de 930 da sua fábrica em São José dos Campos-SP. O setor de caminhões foi o que mais sofreu com as medidas idênticas em agosto, que atingiu as fábricas da MAN, Mercedes-Benz, Ford, Iveco e Volkswagen.
Na quarta-feira passada, o Ibovespa encerrou com queda de 0,81%, acumulando perdas de 5,97% nos últimos seis pregões e o dólar fechou em alta; em três dias a moeda norte-americana acumulou ganhos de 2,10% ante o real. Em agosto passado, a inadimplência do consumidor registrou uma variação de 17,2%, se comparada com o mesmo mês de 2013, e 2,5% acumulada no ano. Esse último fato indica um desaquecimento do modelo de incentivo ao consumo, adotado nos governos Lula e Dilma.
A Moody's, uma agencia de classificação de rating, revisou a perspectiva do Brasil de estável para negativa e para baixo a nota de crédito do BNDES, Caixa Econômica, Banco do Brasil, Bradesco, Itaú, Santander e HSBC. A causa dessa atitude da Moody's, entre outras, talvez tenha sido os abalos sentidos pelo chamado tripé macroeconômicos: a flutuação cambial, as taxas de juros e a meta anual de superávit “primário” (uma espécie de poupança para pagar os juros da dívida pública) que sofrem interferência conforme seja o interesse momentâneo; a nova matriz de flexibilização econômica do governo Dilma.
Todos esses acontecimentos incutiram nas pessoas, principalmente nos empresários, a incerteza do crescimento e, mais preocupante ainda, a certeza da estagnação econômica. E o estado de espírito é um componente determinante, essencial mesmo, para o desenvolvimento. Consequência: menos investimento, menos emprego, menos consumo.
E para terminar quase como começamos: em agosto, a produção nacional de cerveja registrou a segunda queda consecutiva, com recuo de 7,7%.
Tribuna do Norte. Natal, 14 set. 2014.

quarta-feira, 17 de setembro de 2014



ODÚLIO BOTELHO

Jurandyr Navarro*
Do Conselho Estadual de Cultura

O espírito humano tem a capacidade de receber o ensinamento dos bons hábitos sociais e o dever de transmití-los às gerações subsequentes. A cada pessoa é-lhe atribuída uma parcela desse caráter civilizatório. Ela não se exibe tal uma bolha, que se desfaz, e sim, uma proposta de vida. Urge, portanto, conduzir esse facho iluminativo que não se apaga diante o vendaval da existência, havendo, naturalmente, coerência de atitudes marcantes.
Na ótica agostiniana, segundo Bertrand Russell, há de se considerar a passagem do tempo em três fases distintas, ou, simplesmente, três tempos: um presente das coisas passadas, que é a memória; um outro, presente das coisas presentes, que é a vista, e um presente das coisas futuras, ou seja, a espera.
O aprendizado da cultura humanística, ciêntífica ou profissional obedece a esse padrão evolutivo temporal.
O jurista Odúlio Botelho, a exemplo de muitos, perfilou a sua vida transpondo etapas sucessivas de estudos continuados, da idade juvenil ate alcançar a Universidade, o estágio complementar da meta almejada.
A Advocacia, a sua escolha profissional: tempo presente da aplicação dos ensinamentos adquiridos. Nesse labor, ele firmou o nome no fórum criminal. O saber jurídico, aliado à capacidade oratória, resultou em quociente apreciavél de vitórias merecidas na tribuna de Tribunal do Júri. Inúmeras as causas ajuizadas e responsavelmente defendidas. O verbo eloquente proferiu inumeráveis réplicas e tréplicas!
O causídico de causas criminais difere do postulante da espera cível. Há, naturalmente, os atuantes em ambas, indistintamente. A diferença, é a inspiração oratória, entre eles, fator de importâcnia capital, no convencimento da causa, no embate das idéias, sob o impacto da emoção psicológica, influenciadora da alma humana.
Durante a sua lida forense, Odúlio Botelho assumiu a responsabilidade como patrono e advogado, designações sinônimas. Tais encargos são mais usuais em ações criminais, pricipalmente nos duelos do Tribunal do Júri. Hoje, os termos se equivalem, entendido que é o advogado o patrono da causa.
O mesmo não ocorria no passado, mormente na Roma dos tempos de Cícero e de Múcio Cévola, famosos tribunos de lides forenses. Nessa época, ja distante, o defensor de algum réu, caso fosse orador, seria o patrono da causa. Se, apenas deslindasse controvérsias jurídicas, questões de direito, seria advogado.
Dai, constatar-se a importância dos juristas dotados de aptidão e dons de retórica, os mais adaptáveis aos debates da tribuna do Júri Popular.
E Odúlio Botelho foi um deles, na sequência da memória histórica.
Não há negar, o púlpito judiciário, através a magia da palavra, tem, ao longo do tempo, encantado e seduzido platéias e auditórios, os mais exigentes e qualificados.
Na opinião do grande orador, advogado e político, Cícero, a eloquencia judiciária é a prova mais alta nos julgamentos, destacando a “Oração da Coroa”, proferida por Demóstene, em defesa de Citesifonte, no debate oratório com o tribuno Ésquines.
No “tempo presente das coisas passadas”, João Medeiros Filho, Vicente de Souza, Wilson Dantas, Túlio Fernandes, Varela Barca, Cortêz Pereira, Arnaldo França, Caio Graco, Hercílio Sobral Chrispim, Claudionor de Andrade, Geraldo Pereira de Paula, Enock Garcia, Ítalo Pinheiro, Herbet Spencer, entre outros, receberam a devida inspiração tribunícia, o mesmo sucedendo com Odúlio Botelho, mais jovem, a imitá-los no mister de ser defensor de causa legítima dos submetidos ao julgamento dos crimes de sangue, em tribunal composto por um Magistrado, um Promotor de Justiça, Advogados e sete Jurados.
Na Grécia, ja havia a “Casa da Câmara”, com seus Juízes. No Areópago, o primeiro Tribunal de Atenas, já existia a figura do acusador.
Por ese período histórico, a lei era subordinada à religião. No rochedo das Termópilas estava gravado: “Viandante, vai dizer a Esparta que morrermos aqui em obediência às suas Leis”. Sócrates se imolou, seguindo os seus preceitos. Eram elas imutáveis, não como hoje, derrogadas ou revogadas. Imutáveis, por serem consideradas divinas.
Eram, portanto, sagradas.
Quando da sua criação, pelo governante, e sufragada em comício popular, a lei só era válida após ser sancionada pela religião. Proclamam autores antigos que ela foi sempre considerada santa.
Nos dias da realeza romana, era, a lei, a rainha dos reis; nos dias da república fôra a rainha do povo.
Odúlio Botelho teve postura de retidão ética e profissional. Nas ações penais a sua presença foi exitosa em todos os sentidos, no fiel cumprimento dos mandatos a si confiados. Também o fez nas ações cíveis, tanto na argumentação escrita em audiência formais, nas razões e contra-razões proferidas, no juízo singular, ou, na sustentação oral diante do tribunal pleno.
Portou-se, igualmente, a colegas que envergaram e envergam a sagrada beca, pela causa da Justiça, como representantes da nobre classe dos Advogados. Classe das mais remotas, nascida na Roma Antiga, na fase política do seu Império, depois das fases do Reinado e da República, quando, nestas últimas, ainda não havia a figura do Advogado.
Na sua triunfante carreira jurídica, Odúlio Botelho foi prestigiado pelo destino, com duas distinções de relevo. Presidente da OAB/RN, tendo realizado aplaudido mandato, quando teve oportunidade de levantar a bandeira dos chamados Direitos Humanos individuais.
E Odúlio Botelho, dirigente da nobre classe, os prestigiou como espécie de consciência nacional.
À frente da Instituição ele deu continuidade aos postulados éticos e à consciência intelectual, entendo constituir uma abnegação das mais cultas. A Advocacia requer, portanto, um caráter superior dos seus representantes.
A outra distinção a ele conferida foi a de ter sido escolhido, mediante valor profissional e perfil humanístico, um dos sócios-fundadores da Academia de Letras Jurídicas do Rio Grande do Norte, dendo sido um dos seus Presidentes, em cujo mandato realizou importantes eventos e editou o primeiro número da Revista da Instituição, inugurando, assim, a publicação dos discursos de posse dos Acadêmicos e demais matérias de âmbito cultural.
Frize-se, também, a sua erudita oração, ao fazer o clássico Elogio do Patrono, da sua Cadeira nº 22, que, por coincidência, o seu companheiro de longas tertúlias advocatícias, no Tribunal do Júri em Natal, Patrono, João Medeiros Filho!
A outra face laboriosa do advogado Odúlio Botelho foi a sua participação administrativa em cenários governamentais: Municipal, Estadual e Federal.
Na Prefeitura Municipal do Natal, exerceu o relevante cargo, em comissão, de Chefe da Casa Civil. No Estado, no exercício do seu cargo efetivo de Procurador, chefiou várias de suas Procuradorias internas, e na Secretaria de Administração ocupou cargos de direção. No plano Federal, foi um dos Diretores do Tribunal do Trabalho, desta Capital, durante um decênio.
Dotado de alma sensível à poesia, em horas de lazer, gosta de declamar  sonetos, poemas e outras divagações literárias, fazendo jús ao seu ingresso, por merecimento, em diversas das nossas instituições culturais. Presentemente presta o seu contributo valioso, na Diretoria do Insituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.
________________________

* Artigo publicado em O Jornal de Hoje, dos dias 13 e 14 de setembro/2014

terça-feira, 16 de setembro de 2014

UM ESTRANHO CORTEJO
 
 
                                                             Públio José – jornalista
 
 
 
                       Há uma passagem na Bíblia, no livro de Marcos, (2. 3.) que nos mostra uma cena bastante estranha. Jesus chegara a Cafarnaum, vindo da Galiléia, e logo a notícia correu de que Ele chegara à cidade. Sua fama já era bastante conhecida. Por onde andava grandes multidões se apertavam para vê-lo e ouvi-lo. O versículo 3 narra, então, que “alguns foram ter com Ele, conduzindo um paralítico, levado por quatro homens”. Pelo que se vê, uma pequena multidão se aglomerara em torno de um paralítico, sendo que destes todos quatro foram escolhidos para levar o paralítico a Jesus. O paralítico foi carregado em sua própria cama, certamente em razão de dificuldades de movê-lo até Jesus de outra maneira, ou pelas dificuldades financeiras de contratar outro tipo de transporte. O que se depreende do episódio é que o paralítico não era um qualquer – uma vez que muitos se juntaram para socorrê-lo.
                        Assim, fica configurado o inusitado da cena. Um bando de homens, (às mulheres não era permitida tal empreitada, em função da cultura e hábitos judaicos) carregando uma cama, desfila com um paralítico pelas ruas da cidade em busca de solução para suas dores. Da cena se extrai, no mínimo, uma alta demonstração de solidariedade, pois é muito difícil conciliar tempo e interesses de um bom número de pessoas dispostas a desfilar, pelas ruas de uma cidade, carregando um paralítico numa cama. A cena, olhando-se de fora, teria também algo de ridículo, de insólito, de cômico. Mesmo assim, temos que admitir o forte fascínio que o doente exercia sobre as pessoas a ponto de convencê-las a se irmanarem com ele na incomum tarefa. Embora pobre, houve argumentos da parte dele que sensibilizaram outros homens a ajudá-lo na busca da solução para os seus problemas.
                          Do episódio podemos tirar várias lições. A principal delas é que aquele homem jamais se entregou à sua desdita. Podemos concluir isso pelo simples fato de que, ao primeiro sinal da presença de Jesus na cidade, ele se movimentou para procurar ajuda. Pelo pronto atendimento dos amigos ao seu chamado, podemos concluir também que em redor de si havia sempre trânsito de pessoas. Isso demonstra que, apesar de suas dores, de sua vergonha, da sua incapacidade física, ele tinha um comportamento que gerava nas pessoas afeição, carinho, afinidade – irmandade até. Afinal, como narra o texto bíblico, aquele grupo de companheiros topou uma empreitada nada fácil. Ao chegarem na casa onde Jesus atendia o povo se depararam com uma difícil realidade: não havia como entrar na casa; não havia como chegar a Jesus, pois o ambiente, de tão freqüentado, estava completamente tomado. 
                           Mesmo assim eles não desistiram. Acredito que tenham feito uma pequena conferência em torno da dificuldade. “E agora, como vamos fazer?” Um deles, certamente o mais afoito, sugeriu a cena que se perpetua até os dias de hoje: “vamos pelo eirado”. E subiram o paralítico, com cama e tudo, até o telhado, cavaram um buraco no teto e desceram o conjunto até Jesus. Muita coragem, ousadia e disposição para ajudar uma pessoa necessitada! Você chegaria a tanto? Do episódio o que me fascina é o carisma do paralítico. De como ele – em meio a uma realidade dolorosa – permaneceu firme, deixando de lado uma realidade de derrota, para seguir em frente. E como conseguiu unir ao seu projeto um grupo compacto de homens dispostos a tudo para ajudá-lo. Ah, o melhor é o resultado. Curado por Jesus, voltou para casa ereto, feliz, levando de volta o leito às costas. Vitória. Pura vitória...   

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Morre o ex-Governador Iberê
Ferreira de Souza.
O Estado lamenta sua perda.

 

A+A-
Com a idade de 70 anos, o santa-cruzense IBERÊ FERREIRA DE SOUZA partiu do mundo dos mortais. O corpo do ex-governador foi velado em sua terra-mãe Santa Cruz e veio para Natal onde também foi velado e sepultado no Cemitério Morada da Paz, em Emaús, saindo da Escola de Governo, localizada no Centro Administrativo. A Governadora Rosalva Ciarlini decretou luto oficial por três dias e a missa em Natal foi celebrada por Dom Jaime Vieira, e o cortejo saiu às 16h em um carro do Corpo de Bombeiros Militar do Rio Grande do Norte. O Estado e os cidadãos potiguares lamentam a perda, haja vista que o falecido era um político ameno e de fino trato. Nossos sentimentos.

De La Coruña ao Parque
das Dunas

A+A-
Luciano Ramos
Presidente do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais do Ministério Público de Contas (CNPGC); Procurador-Geral do MPC/RN

O brasileiro enfrenta os problemas sociais de maneira peculiar, conforme cultura e história próprias, mais afeitas à imprevisibilidade do drible do que ao planejamento e à organização. No dizer da Ministra Carmen Lúcia, ao analisar as constantes emendas constitucionais, diante das dificuldades de se fazer gols com os pés, seríamos capazes de alterar a regra do jogo em curso para legalizar o gol com a mão. Nós enxergamos com relativa naturalidade estas mudanças bruscas de direção, desnorteando a barreira legal, como em um drible de Garrincha.

Mas estes arroubos criativos, no que diz respeito à segurança normativa, tornam-se menos naturais quando somos confrontados com outras culturas, defensoras do planejamento social, com prevenção de riscos e análise de consequências a médio e longo prazo, em detrimento do improviso.

Este choque de concepção ficou nítido durante o I Curso Euro-Brasileiro de Contratación Pública- La Coruña/Espanha, de 1 a 5/09/2014. Ao proferir ali palestra sobre contratação pública estratégica, percebi como são diversos os parâmetros brasileiros e espanhóis diante de um impasse ambiental gerado pela própria Administração Pública.

  Convidado a expor o ponto de vista do Ministério Público de Contas, levei a debate o problema da duplicação da Av. Roberto Freire em Natal/RN, e seus efeitos sobre a área de preservação permanente do Parque das Dunas, no bojo da análise de critérios sociais e ambientais.

Exposto o fato, os espanhóis - sobretudo professores de direito administrativo da Universidade da Coruña - não concebiam como o Poder Público pôde planejar uma obra desconsiderando uma área legalmente protegida. Já para parcela considerável de nós brasileiros, embora percebêssemos algo fora de ordem, de tanto ver proliferar este estado de coisas, isto não seria tão inconcebível, inclusive com a relativização do tamanho da área do parque que seria afetada e considerações a respeito do local já ter sido anteriormente degradado.

Mas até que havia certo consenso quanto ao erro originário do Poder Público, pois lhe bastava demandar do então futuro contratado um projeto técnico que não afetasse o parque e preservasse o meio-ambiente para a nossa e as futuras gerações. Porém, a Administração Pública não o fez, embora a modalidade de contratação escolhida lhe permitisse fazê-lo – contratação integrada (RDC) em que o projeto básico é feito pelo contratado, a partir das especificações do anteprojeto feito pela Administração.

Com este pecado original, contratou-se legitimamente uma empresa para conceber e executar o projeto. No entanto, surgem a lei e o Parque das Dunas no meio do caminho. E aí a diferença de cultura se torna mais nítida.

Nesta encruzilhada, os brasileiros tendem a trilhar o caminho da mudança legislativa, ou ao menos concebê-lo como um percurso viável, enquanto se extrai dos diálogos com os professores espanhóis que o caminho natural seria o refazimento do projeto, prevenindo um potencial dano ao meio ambiente.

Ou seja, se o Parque das Dunas fosse na hospitaleira La Coruña, ele provavelmente seria preservado em sua extensão original e quem sabe até não estaria entre as obrigações do contratado – devidamente remunerado – revitalizar a área que estaria indevidamente degrada. Esta solução seria a mais próxima da visão da União Europeia sobre contratação pública estratégica.

No entanto, é aqui que devemos resolver nossos problemas, e tramita na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte projeto de lei para desafetar aproximadamente 4,5ha da área do Parque das Dunas, de maneira a tocar o projeto tal qual foi concebido, ainda que tenha partido de erro de planejamento da Administração Pública.

Assim, o problema seria driblado e não encarado de frente. E as consequências futuras desta solução pontual? Bem, esta é uma preocupação para aqueles que gostam de planejar, para nós outros basta a plasticidade do improviso. Deus queira que a fatura ambiental e de desenvolvimento humano não seja impagável! 

domingo, 14 de setembro de 2014

UM CESTO DE PÃES/POEMAS



O TRÍPTICO DO PÃO

O pão metafísico

 
PÃO E LUZ

 
com lápis invisível

descrevo na escuridão

o que não vejo

 

e posto sobre a mesa

creio haver um pão

à espera da luz

 

O pão da fraternidade

PÃO E MEL

 
                        (Ao adentrar-me nos azulejos do Mosteiro dos Jerônimos)

 
a poesia está no simples

e no mistério transfigurado

 

lembro da emoção que me causou

o relato antigo do encontro

de dois povos:

 

o navegante que extenuado chegava à terra

após a longa viagem oceânica

e o nativo que lhe oferecia

pão e mel

 


O pão da esperança


A ÚLTIMA CEIA

 
à mesa tomam assento os convidados

e pães verdes são servidos  -

 

pães e vinho verdes

na última homenagem à esperança


                                   (HORÁCIO PAIVA)