UM ESTRANHO CORTEJO
Públio José – jornalista
Há uma passagem na Bíblia, no livro de Marcos, (2. 3.) que nos mostra
uma cena bastante estranha. Jesus chegara a Cafarnaum, vindo da
Galiléia, e logo a notícia correu de que Ele chegara à cidade. Sua fama
já era bastante conhecida. Por onde andava grandes multidões se
apertavam para vê-lo e ouvi-lo. O versículo 3 narra, então, que “alguns
foram ter com Ele, conduzindo um paralítico, levado por quatro homens”.
Pelo que se vê, uma pequena multidão se aglomerara em torno de um
paralítico, sendo que destes todos quatro foram escolhidos para levar o
paralítico a Jesus. O paralítico foi carregado em sua própria cama,
certamente em razão de dificuldades de movê-lo até Jesus de outra
maneira, ou pelas dificuldades financeiras de contratar outro tipo de
transporte. O que se depreende do episódio é que o paralítico não era um
qualquer – uma vez que muitos se juntaram para socorrê-lo.
Assim, fica configurado o inusitado da cena. Um bando de
homens, (às mulheres não era permitida tal empreitada, em função da
cultura e hábitos judaicos) carregando uma cama, desfila com um
paralítico pelas ruas da cidade em busca de solução para suas dores. Da
cena se extrai, no mínimo, uma alta demonstração de solidariedade, pois é
muito difícil conciliar tempo e interesses de um bom número de pessoas
dispostas a desfilar, pelas ruas de uma cidade, carregando um paralítico
numa cama. A cena, olhando-se de fora, teria também algo de ridículo,
de insólito, de cômico. Mesmo assim, temos que admitir o forte fascínio
que o doente exercia sobre as pessoas a ponto de convencê-las a se
irmanarem com ele na incomum tarefa. Embora pobre, houve argumentos da
parte dele que sensibilizaram outros homens a ajudá-lo na busca da
solução para os seus problemas.
Do episódio podemos tirar várias lições. A principal delas é
que aquele homem jamais se entregou à sua desdita. Podemos concluir isso
pelo simples fato de que, ao primeiro sinal da presença de Jesus na
cidade, ele se movimentou para procurar ajuda. Pelo pronto atendimento
dos amigos ao seu chamado, podemos concluir também que em redor de si
havia sempre trânsito de pessoas. Isso demonstra que, apesar de suas
dores, de sua vergonha, da sua incapacidade física, ele tinha um
comportamento que gerava nas pessoas afeição, carinho, afinidade –
irmandade até. Afinal, como narra o texto bíblico, aquele grupo de
companheiros topou uma empreitada nada fácil. Ao chegarem na casa onde
Jesus atendia o povo se depararam com uma difícil realidade: não havia
como entrar na casa; não havia como chegar a Jesus, pois o ambiente, de
tão freqüentado, estava completamente tomado.
Mesmo assim eles não desistiram. Acredito que tenham feito
uma pequena conferência em torno da dificuldade. “E agora, como vamos
fazer?” Um deles, certamente o mais afoito, sugeriu a cena que se
perpetua até os dias de hoje: “vamos pelo eirado”. E subiram o
paralítico, com cama e tudo, até o telhado, cavaram um buraco no teto e
desceram o conjunto até Jesus. Muita coragem, ousadia e disposição para
ajudar uma pessoa necessitada! Você chegaria a tanto? Do episódio o que
me fascina é o carisma do paralítico. De como ele – em meio a uma
realidade dolorosa – permaneceu firme, deixando de lado uma realidade de
derrota, para seguir em frente. E como conseguiu unir ao seu projeto um
grupo compacto de homens dispostos a tudo para ajudá-lo. Ah, o melhor é
o resultado. Curado por Jesus, voltou para casa ereto, feliz, levando
de volta o leito às costas. Vitória. Pura vitória...
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