quinta-feira, 5 de agosto de 2021

 

MACAÍBA DE SEU MESQUITA

Valério Mesquita

mesquita.valerio@gmail.com

01) Este fato pitoresco aconteceu na luta política municipal de 1968, em Macaíba. A protagonista principal foi a minha tia Amélia Násia de Mesquita Meira, avó materna do médico e pesquisador Olímpio Maciel. Dona Nazinha, como era familiarmente conhecida, tinha ido a sua terra votar no irmão Alfredo Mesquita, candidato a prefeito pela quarta vez. A campanha transcorrera em clima de agitação permanente, o que era comum em Macaíba. Lá pelas 10 horas da matina, sob o sol escaldante de um domingo de eleição, os governistas denunciaram inveridicamente que Seu Mesquita estava promovendo aglomeração dentro de sua residência a fim de comprar votos. O juiz eleitoral, incontinenti, despachou o delegado de polícia local tenente Geraldo

Cavalcante a fim de bloquear a frente da casa e não mais permitir a entrada de ninguém. Minutos depois, aparece em cena a irmã do candidato que retornava da seção eleitoral. Ao deparar com o aparato foi logo impedida por um soldado. Conhecendo, de há muito tempo, o

tenente, foi ter com ele. “Geraldo, que palhaçada é essa em frente à casa de Mesquita? Esqueceu os favores que ele lhe fez?”. De forma ponderada o delegado explicou que estava cumprindo ordens. “Que ordens? Eu nasci nesta casa e agora sou proibida de entrar?”. Ai revelou-se a têmpera de Dona Nazinha (70 anos), mulher corajosa e espartana que não se submetia aos poderosos. Sacou da inseparável sombrinha e desfechou duas lapadas no peito do delegado, dizendo: “Saia da frente, pois eu vou passar”.  E entrou sob aplausos da galera revoltada com a truculência da justiça e da polícia. Uma figura inesquecível.

02) É sabido que o chefe político do interior casava e batizava.  A sua palavra era um dogma. Do povoado de Sucatão surgiu, no sábado de feira, um matuto alto, preto e forte que veio convidá-lo para padrinho do seu casamento. Acanhado e desajeitado, o noivo fez o convite entre sorrisos e quase aos berros, interrompendo a famosa pregação política do dia de feira. O casamento foi no domingo, regado a fobó e cachaça. No outro sábado, o matuto reapareceu pedindo “um particular” a Seu Mesquita. Confessou, desolado, que a noiva não tinha querido nada com ele. “Ela me refugou, Seu Mesquita”, queixava-se com os olhos umedecidos. O velho procurou as razões e teve que descer à intimidade do casal. No final, compreendendo a razão da recusa da mulher, Seu Mesquita ensinou que o noivo primeiramente deveria fazer carinhos etc, e não proceder à moda animal, como fizera. Ao cabo de oito dias, reunido em sua sala com vários amigos, Seu Mesquita teve novamente interceptadas as suas palavras por um vozeirão tonitruante saído da bocarra do negro, eufórico, que da janela escancarou seu sorriso entre os circunstantes, elevando o polegar da mão direita para dizer: “Seu Mesquita, óia, chega ela descangotou!”.

(*) Escritor

 

 

 

 

 

VALORIZANDO A CULTURA NORDESTINA – Berilo de Castro



VALORIZANDO A CULTURA NORDESTINA –

Escrevi, em crônica recente, sobre o impressionante valor que o brasileiro tem dado às coisas de fora do país (o estrangeirismo, o viralatismo). A rigor, significa a falta da valorização, do apego, do amor a nossa rica e pouco reconhecida cultura, especificamente à nordestina.

Quero, neste relato, me dirigir a essa cultura, que é a nossa raiz, a  nossa identidade, o nosso orgulho de ser povo.

Saímos já daquela fatídica época; daquele tempo cruel e sofredor, que caminhões e mais caminhões saiam cheios de nordestinos (famosos e tristes paus de arara) para aventurarem uma vida melhor na cidade grande; um sonho na esperança de melhores dias à procura de emprego para poder sustentar a família.

O nordestino foi e sempre  será lembrado como o grande propulsor da construção civil nas regiões do Sudeste e Sul do país. Sempre um forte!

Hoje, o momento é outro. Mudou, sim, mudou para melhor. Nos orgulhamos de poder exportar para o país todo não mais os “paus de arara”, mas, sim, pessoas do mais alto nível intelectual, nomes expressivos em todos os segmentos profissionais da sociedade: na área do direito, da medicina, da engenharia, da arquitetura, a nossa riqueza folclórica, lembrando o nosso maior representante, o folclorista, escritor e historiador Luís da Câmara Cascudo; no esporte, o orgulho de ter o nativo praiano de Baía Formosa/RN, Ítalo Ferreira, campeã mundial e a primeira medalha de ouro para o Brasil no surf na Olimpíada em Tóquio/2021.

Passamos a oferecer o melhor turismo litorâneo brasileiro: lindos remansos praianos, praias paradisíacas, de águas mornas, de cores belíssimas, enaltecendo o verde da turmalina com azul turquesa. Sol o ano inteiro.

A gastronomia, que beleza! O puro sabor nordestino, igual não há no mundo: a paçoca de pilão, o  feijão verde, o feijão de risada, o baião de dois;  o arroz de leite, o bolinho de macaxeira, o  bolinho de carne de sol, o bolinho de bacalhau, a carne de sol na nata, na manteiga do sertão; o  cuscuz, o  cuscuz no leite; o camarão, usado em dezenas e dezenas variedades de pratos; a  lagosta, o lagostin, a ostra crua com limão e sal; os mais variados peixes, fritos ou cozidos, no leite de coco; as muquecas de peixe, de camarão ou mista, de deixar mole e sonolento o freguês. As sobremesas, um encanto de doçura: a cocada, branca e escura, o  arroz doce, a banana caramelada, a rapadura, o coco zoião (cocada com sorvete de baunilha) – uma delícia fascinante –, Romeu e Julieta (queijo com doce goiabada), queijo com mel do engenho; cartola (banana frita, queijo e canela), doce de leite, doce de coco, doce de coco com rapadura, doce de jaca, de caju, doce de jerimum com coco, pudim de leite, sorvetes das mais variadas frutas; tapiocas com recheios diversificados; grude branco, preto; canjica, pamonha, bolo da moça, bolo de batata, de milho, de laranja, bolo preto, de macaxeira; sucos de frutas da região: caju, manga, graviola, cajá, acerola, limão, laranja, abacaxi, e por aí segue uma imensa lista de gostosas guloseimas puramente nordestinas.

Por fim, para uma boa digestão e uma leve soneca, vamos na musicalidade de Jackson do Pandeiro, lembrando Caymmi, Luiz Gonzaga, Sivuca e no remanso dos versos do grande poeta passarinho Patativa do Assaré.

Iluminado por todos esses astros, me associo às  palavras de dois grandes nordestinos: o poeta matuto cearense, Bráulio Bessa, e o escritor, ensaísta, romancista, dramaturgo, poeta e professor, Ariano Suassuna, paraibano de Taperuá, que assim se expressaram: de Bráulio: “Quanto mais sou nordestino, mais tenho vontade de ser”; de Ariano: “Eu não troco meu “oxente” pelo OK de ninguém”.