MENSAGEM DO ARQUITETO MOACYR GOMES DA COSTA AOS
DIPLOMANDOS DO CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO DA UNP.
EXMA. SNRA. PROFESSORA SÂMELA SORAYA GOMES DE OLIVEIRA,
MAGNIFICA REITORA DA UNP, RESPEITÁVEIS MESTRES QUE DOARAM SEU SABER A ESTES
JOVENS DIPLOMANDOS, AOS PAIS, INCANSÁVEIS COMBATENTES NESTA VITÓRIA, AOS FUNCIONÁRIOS, INDISPENSAVEL SUPORTE NA VIDA
UNIVERSITÁRIA, CAROS NOVOS COLEGAS ARQUITETOS E URBANISTAS, MINHAS SENHORAS E
MEUS SENHORES:
“A
ARQUITETURA É UMA MÚSICA DE PEDRAS E A MÚSICA É UMA ARQUITETURA DE SONS” dizia Beethoven há dois séculos passados. O Governador
potiguar Cortez Pereira considerava um “POEMA DE CONCRETO” a Arquitetura
de um estádio, que inaugurava há
42 anos atrás. O famoso cronista esportivo João
Saldanha dizia que o mesmo seria uma “obra
prima” quando concluído. Esses pensamentos revelam a importância do
ARQUITETO na própria história das artes e da evolução humana. Sendo uma das
primeiras atividades do homem em sua
trajetória histórica, nos deixa o acervo
material que permite o estudo de todo o
processo evolutivo da humanidade através do tempo.
Assim, a Arquitetura
como ARTE, conduz o Arquiteto, aliando
a beleza à função, entregando-se com paixão, criatividade e emoção à difícil
tarefa de buscar a qualidade de vida do ser humano, cabendo ao Urbanista propor politicas e ações em
prol do bem estar de todos os cidadãos, tentando diminuir as desigualdades
sociais, procurando a FELICIDADE de
todos, na cidade de todos. Isto pode parecer utopia, mas é uma tarefa nobre e
prazerosa, que conduz a uma missão
das mais elevadas, por isso mesmo, árdua, difícil, quase sacerdotal.
Neste instante em que estes novos profissionais entram no
mundo da arquitetura e do urbanismo, quero exaltar sua escolha para o
tradicional nome de turma, adotando o título de ”POEMA DE CONCRETO”, em indiscutível referência àquele estádio que encantou
Cortez, uma obra arquitetônica
consagrada que tinha ultimamente o nome popular de “MACHADÃO”, que levou mais de meio século para ser realizada, superando os percalços de uma verdadeira
Odisseia, incorporou-se à vida da cidade por 40 anos, tornou-se um marco
arquitetônico do seu patrimônio público, por definição, intocável, e que, lamentavelmente teve fim infausto,
criminosamente destruído, por motivos escusos, cujo mérito não cabe comentar, neste
recinto de alegria e comemoração.
Esta turma, quando inspirou-se na emoção de Cortez para escolha de seu próprio
cognome, não só atestou a qualidade arquitetônica do patrimônio em comento,
como quis prestar uma justa homenagem ao grande espírito daquele notável homem,
que orgulha o Rio Grande do Norte.
E, porque não dizer, sem falsa modéstia, que, ao me honrarem
com o título de Patrono, nesta solenidade, me brindam e recompensam pela
mutilação que todos sofremos.
Discorrer sobre a perda de algo que custou 50 anos de
vida, é profundamente penoso, mas encontra consolo na atitude madura e justa
destes colegas ao resgatarem a memória de um patrimônio arquitetônico que nos orgulhava.
“POEMA DE
CONCRETO” foi a imagem primorosa
construída pelo arrebatamento de entusiasmo do grande Governador José Cortez Pereira de Araújo,
conhecido por sua cultura, sensibilidade e notável senso de otimismo, no
momento em que inaugurava o novo equipamento, logo consagrado por toda cidade, mas
infelizmente destruído, no momento em que o Brasil abdicou de sua soberania em troca de um ilusório “legado” de benesses, ditas salvadoras
da pátria, podendo resultar em canto das
sereias. Nada deste patrimônio restou,
senão lembranças e fotos.
Nada do que se disser agora, recuperará o patrimônio
perversamente perdido para sempre, mas será justo rememorar sua história, até como
reconhecimento a todos os abnegados que o realizaram acima de qualquer interesse,
e também para exaltar a maturidade e senso de cidadania do gesto desse grupo
que, nos festejos de sua primeira vitória, se preocupa em resgatar a memória do poema destruído, até como
repúdio aos que cometeram essa iniquidade.
Inegavelmente aquela obra de arquitetura era uma das
referências da cidade, um dos seus pontos de atração e lazer, incorporou-se aos
usos e costumes, trouxe a família e a elegância feminina para o estádio, virou
cartão postal, e passou a exibir os maiores jogadores do Brasil e do mundo tais
como Pelé, Eusébio, Zico, Sócrates,
Falcão, Marinho Chagas, e a nível local Scala, Ivan, Alberi, Danilo Menezes, e muitos outros; teve eventos com mais de 50 mil
espectadores; entrou no coração do povo
como um dos seus patrimônios mais queridos; teve seus dias de glória, e depois,
de abandono e ocaso, até sua extinção programada.
A história começou em 1949, nas vésperas da Copa de
1950, quando conheci o Professor Pedro Paulo Bernardes Bastos, um dos arquitetos
do Maracanã a quem informei meu desejo de especializar-me em arquitetura
esportiva.
Voltamos a nos
encontrar em 1954, quando eu concluía meu curso, e ele, como orientador dos
nossos trabalhos de encerramento, sabedor de meu desejo vocacional me indicou o
tema de um complexo olímpico, como
primeiro desafio às minhas pretensões. Apresentei então o estudo preliminar do
que chamei de Complexo Olímpico de Lagoa
Nova, constituído por Estádio Olímpico, Estádios de Natação, de Tênis, Ginásio
poliesportivo, Alojamentos, etc., projeto que veio posteriormente a ser mutilado, por interesses políticos, (velha
saga que persegue o Arquiteto) sendo
construído apenas o estádio e precariamente o ginásio, improvisado em local que mal lhe cabia, vez que o terreno para ele previsto, já havia sido invadido.
Assim, aquela simples rotina universitária, de
conclusão de curso, transformou-se para mim, num sonho ambicioso, pois o Professor Pedro Paulo aprovou com louvor meu trabalho, incentivando-me a
assumir o compromisso de torná-lo o primeiro objetivo de minha carreira
profissional que ali se iniciava.
De meados de 1955 até 1959 residi em Natal, a convite
do Governador Dinarte Mariz, prestando
serviços profissionais ao Estado, e nesse período firmamos sólida amizade
pessoal que perduraria para sempre, e muito ajudou na consecução de nosso
desiderato. Juntei-me aos velhos desportistas de minha adolescência, fazendo
parte de uma renitente comissão de luta pelo esporte, já naquele momento
sonhando com um novo estádio, pois o velho Juvenal
Lamartine já dava mostras de sua decadência.
Em 1959 o governador prometeu a doação de um
terreno vizinho ao atual Centro Administrativo do Estado, local conhecido na
época como “corrente”, condicionando
à um documento que lhe desse respaldo político. Fui ao Rio de Janeiro e trouxe
o documento assinado pela autoridade de Saturnino
de Brito. Nessa empreitada contei com o acompanhamento do Jornalista Aluizio Menezes, que dava cobertura ao empreendimento.
O donatário era a
Federação Norte-rio-grandense de Desportos, que, mediante convenio, repassou
para a Prefeitura de Natal sob a batuta do grande desportista Djalma Maranhão que imitiu-se na posse do
terreno, fez a cerca e a terraplanagem,
e, quando ia iniciar a construção, teve que se exilar no Uruguai, onde morreu
de saudade de sua querida Natal, como se sabe, em consequência das injunções
políticas do regime então vigente, tornando-se a primeira vitima das inúmeras dificuldades que iriam perseguir aquele
empreendimento, como uma bruxa do mal.
A obra parou, até que entre 1966/67, o Prefeito Agnelo Alves, fundou a FENAT- Fundação de Esportes de Natal,
que, sob o comando de Ernani Silveira
recomeçou a obra em ritmo acelerado. Já em 1967, o “Agnelão”, andava
bem, até que em 1969, o regime político fazia de Agnelo a segunda vitima da
batalha, tendo seu mandato interrompido, mas deixando a obra com o mínimo de 40% executada, tornando-a praticamente irreversível, porém, sem destino certo.
Em 1971 assumia o governo, Cortez Pereira, fazendo seu Prefeito o Engenheiro e Arquiteto Ubiratan Galvão, reconhecidamente bom
administrador, que logo percebeu a necessidade de dar continuação ao
empreendimento, já sob o cognome de Castelão, em homenagem ao Presidente
Castelo Branco. Eis que, mais uma
vez a bruxa se soltou, e uma crise política tirou o terceiro prefeito do projeto, até que Jorge Ivan Cascudo Rodrigues, substituto do Prefeito Ubiratan, com apoio de Cortez Pereira, decidiu continuar a
obra.
Foi aí que a bruxa nos deu uma trégua. Viajei ao Rio
de Janeiro em agosto de 1971 com uma carta de apresentação de João Machado para seu amigo João Havelange, Presidente da CBD, hoje CBF, o qual, apesar de nos desiludir de qualquer ajuda financeira, me
autorizou a dizer aos nossos governantes que se garantissem entregar o
equipamento pronto em 11 de junho de
1972, Natal seria chave do torneio do Sesquicentenário
da Independência, uma espécie de mini-copa
do mundo, garantindo ainda mais, que
mandaria a seleção portuguesa, bem classificada no ranking, com a presença do
grande craque moçambicano Eusébio,
“Bota de Ouro” da Copa de 1966,
considerado o Pelé português.
Tudo deu certo, e Natal teve alguns dias de festa e
visibilidade no mundo do esporte, desfilando aqui as seleções do Chile, Equador, Irlanda do Norte e
Portugal, tendo terminado o torneio no Maracanã com o Brasil Campeão, e Portugal Vice.
Pode-se dizer que o Machadão ofereceu 40 anos
de alegria honesta e barata ao povo de Natal, cujos abnegados realizadores são
agora reconhecidos e nominados, embora me pese o risco de cometer omissões involuntárias de memória.
São eles, Silvio
Pedrosa, Ernani Silveira, Luis G. M. Bezerra, João Machado, Humberto Nesi, Dinarte
Mariz (doador do terreno), Djalma
Maranhão, que começou a obra, Agnelo
Alves, que a deixou irreversível, Ubiratan
Galvão, e, Jorge Ivan Cascudo
Rodrigues, que concluiu a obra em parceria com Cortez Pereira, que a inaugurou. Destaque-se os Calculistas Helio Varela de Albuquerque, e José Pereira da Silva, que criaram um
partido estrutural “poético”, legítimo
exemplo de engenharia estrutural de alta
qualidade a nível de 1º Mundo, tudo executado na, ”munheca” pois não tínhamos qualquer
equipamento mecânico requerido para esse tipo de obra, o Topógrafo era João Alves Santana, os Engenheiros Mário Sergio de Viveiros e Luis Fernando Melo e a inesquecível
dedicação dos Engenheiros Antônio de
Menezes Lira e Luciano Barros, que
colocaram a obra acima dos seus interesses empresariais.
Registre-se os Auxiliares Administrativos José Alexandre de Amorim Garcia, Rossine
Azevedo e Moisés Dieb, os Desenhistas
Rubens Ferreira Campos e Wilder Barbosa, que fizeram o milagre
de desenhar um projeto de alta complexidade geométrica, a mão livre, com bico
de pena, em escala 1:200 (não existia ainda o autocad), desenhando sobre portas
de compensado improvisadas de pranchetas de desenho, com a areia das dunas e
nuvens de pulgas entrando pelos cobogós.
Os engenheiros
e arquitetos de Natal perderam a
oportunidade de eternizar este
momento histórico, ficando indiferentes à estúpida e desnecessária demolição do
patrimônio, cumprindo a lamentável vocação
de desprezo ao que é nosso.
Isto é memória,
e, povo sem memória não tem história,
e, Infelizmente o Rio Grande do Norte tem se revelado campeão da “desconstrução“ e do “desperdício” em detrimento de seus
valores, daí a relevância do gesto nobre desta turma chamada “POEMA DE CONCRETO”.
Por último, caros colegas, a título de exortação, diria
que sua missão mais difícil é a de Urbanista. O Brasil tem hoje cerca de 106.000
urbanistas, praticamente sem maior utilidade, por ignorância dos governantes
que não entendem a importância do planejamento urbano como a ferramenta maior
para a qualidade de vida de uma comunidade. A grande maioria das cidades
brasileiras está beirando o caos, com algumas notáveis exceções, como Curitiba,
que além de soluções eficientes na mobilidade urbana, apresenta um índice de 64,50 m2 de área verde por habitante e 94% de índice de coleta de esgoto.
Pelas estatísticas, em 10 anos Natal poderá ter o
dobro da frota de veículos particulares, e uma população metropolitana perto de
1,5 milhões. Quantas copas a FIFA faria
aqui, para suportar o “legado” necessário
para atender a tão fantástica demanda?
Por fim, espero que vocês venham a produzir outros poemas arquitetônicos, sejam de
concreto, alvenaria, madeira, fibras ou até de aço, belos projetos de
ambientação e paisagismo, mas o que realmente desejo é que procurem dedicar
parte de seu esforço ao planejamento urbano, considerando que é tão agradável contemplar-se um poema de concreto, ou deleitar-se com a música de Beethoven, quanto ouvir-se a sinfonia de sons de crianças felizes brincando no Recreio de uma
escola ou num parque público. Isso só é possível, numa cidade bem planejada.
Esta é, no meu entender a missão maior do urbanista.
Estarei torcendo por Natal e por vocês. Muito obrigado pela honra e pela alegria que me
propiciaram.
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MANIFESTAÇÕES:
Estimada escritora e poetisa Lúcia Helena, como é do domínio público, o arquiteto e professor Moacir Gomes da Costa, nosso velho e tradicional amigo, foi alvo de justíssima homenagem prestada, recentemente, pela Turma de Arquitetura e Urbanismo da UNP-2013.2, denominando-a de POEMA DE CONCRETO, expressão chantada pelo governador-poeta, Prof. Cortez Pereira, deslumbrado que ficou com as linhas arquitetônicas traçadas pelo velho "MOÁ" ao inaugurar o Estádio denominado “Castelão”, inicialmente, depois, intitulado de João Cláudio Machado, “Machadão.” Moacir travou duas grandes batalhas em sua vida: a primeira, para conceber o belíssimo projeto e o consequente embate para soergue-lo; a segunda, a luta titânica para que não fosse destruído pelos homens e por suas avassaladoras máquinas de ferro e aço. Debalde o combate. Os poderosos venceram! O Poema de Concreto tombou inerte no solo natalense, embora permaneça intacto no coração do povo e de seus amigos. Não poderia vingar nos políticos, porque, parece, os políticos não o tem. É verdade Lúcia Helena. Os políticos ao invés de conduzirem no corpo um coração, portam, sim, um órgão frio e calculista chamado de " interesse pessoal " ou mais modernamente, "interesse coligado". Mas, deixemos os políticos e as suas mesmices, pois, o importante é pensar como o fez a Turma de Arquitetura da UNP-2013.2: arquitetou uma linda placa com a expressão: Turma Poema de Concreto. Com esse sentimento de aprovação, prestou várias homenagens, todas muito dignas: ao arquiteto potiguar Moacir Gomes da Costa, o glorioso gladiador que não conseguiu estancar a fúria dos governantes demolidores, porém, se consagrou no coração dos natalenses, dos seus alunos e dos inúmeros amigos e admiradores que conquistou ao longo do tempo. Portanto, LH do meu coração, a festa promovia pelos graduados da UNP foi muito mais retumbante do que aquela pálida e desnecessária inauguração da Arena das Dunas, onde o pulsar dos corações deixou muito a desejar. Abraços, Odúlio Botelho.
Meu querido tio Moacyr, aqui do Rio de Janeiro, onde olho e vejo tantas obras também desprezadas, e se ainda não demolidas, profundamente esquecidas e depredadas como por exemplo o Pedregulho de Afonso Eduardo Ridi. Concluo que o belo da arquitetura não apenas a obra, mas sobretudo o belo que fica na memória, o que enleva o coração e a mente e fica para sempre... Eu como arquiteta e sobrinha, inspirada desde os 4 anos em seus desenhos magníficos a mão livre, sei desse seu sonho, sei de sua coragem quando dessa obra, sei do seu sofrimento com saga assassina do desconhecimento político, estético e ético que ronda nos ultimo anos nossa cidade... o monstro branco, hoje dito estádio, meio sem jeito, o qual vejo da janela do apartamento de minha mãe sua irmã, parece querer imitar de longe alguma coisa do castelão, grotescamente me espantou pela pobreza do desenho e pela cafonice da forma... Confesso, me deu saudades da leveza das curvas e da elegância do porte do castelão, aquele que você desenhou e fez dele um poema. Parabéns meu tio querido, Um beijo carinhos e lhe dizer do orgulho que tenho de você. Gracia Gondim