quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025
O Brasil maniqueísta
Padre João Medeiros Filho
É bem conhecida a frase bíblica, tirada do Livro Eclesiastes: “Nada de novo debaixo do sol” (Ecl 1, 10). Poderia ser aplicada ao momento atual da sociedade brasileira. Imperam as polarizações, reinam os confrontos. Os brasileiros estão divididos entre bons (os do meu lado) e maus (os do outro lado). Essa divisão remonta a uma filosofia antiga. Percebe-se que as radicalizações não são novidade. Como as ondas do mar que vão e vêm, ideias e comportamentos humanos se repetem, ao longo dos séculos. O quadro sócio-político do Brasil de hoje reveste-se de um novo estilo de dualismo social. O país cindiu-se em duas vertentes intransigentes. Para os adeptos de fulano, tudo que vem de beltrano é ruim, inaceitável. Para eles aquilo que provém de sicrano é nocivo, desprezível, devendo ser extirpado.
A sociedade vive um dilema, próprio do maniqueísmo. Este se fundamenta numa concepção filosófico-religiosa, oriunda na antiga Pérsia, amplamente difundida no Império Romano, nos séculos III a V. Consiste basicamente em afirmar a existência de um conflito intransponível entre os reinos da luz e das trevas. Aos seres humanos caberia o dever de ajudar a vitória do Bem, por meio de práticas ascéticas. O propagador de tal doutrina foi Mani ou Manes, nascido em 216 d. C. Defendia um dualismo antagônico. Segundo ele, há uma oposição permanente entre claridade e sombras. Suas ideias tiveram profunda influência em sua época, a tal ponto de Santo Agostinho, antes de sua conversão, tê-las adotado. Posteriormente, o Bispo de Hipona opôs-se a tal pensamento. No século XII, essa teoria persa voltou à tona. Desta vez, na França. Os novos maniqueus pertenciam à seita dos cátaros (ou albigenses).
Periodicamente, tal teoria emerge aqui e ali, como concepção e estilo de vida ou prática social. Atualmente, ressurge em partidos políticos, alimentados por uma ideologia intolerante. O Brasil divide-se em dois grupos semelhantes ao óleo e à água. Encontram-se, mas não se misturam. O oponente político é visto não como adversário, mas como um inimigo perigoso, que deve ser eliminado a qualquer custo. Quem está do lado contrário só tem defeitos, representa perigo e por isso necessita ser exterminado sem hesitação. O outro é um demônio. “O inferno são os outros”, afirmava Sartre. Para os maniqueus do Brasil atual, apenas a sua maneira de pensar é correta, mesmo que muitas vezes apresente uma pletora de sofismas, contradições, narrativas e inverdades. Apenas, os seus partidários são infalíveis e intocáveis. A sociedade fica, então, dividida. E o pior: quanto mais o outro (o inimigo a ser aniquilado) fracassar, melhor, pois será a prova e o triunfo de “sua verdade”. O amor à pátria e o bem-estar social tornam-se algo diluído e distante, relegado a um plano inferior.
Muitos são contraditórios e ilógicos, pondo nos lábios um pseudodiscurso democrático. A intransigência e intolerância são negações da democracia. Há dificuldade e ingente aversão em aceitar e conviver com quem pensa de modo diverso. Isto ocorre nos parlamentos, em colegiados do judiciário, nos círculos acadêmicos, religiosos e demais instituições. Inconscientemente, almeja-se uma sociedade em que todos deveriam pertencer ao mesmo partido político, professar idêntica religião, ser do único time de futebol e ter igual modo de pensar. Os sistemas totalitários, tanto de direita, quanto de esquerda, alimentam-se dessa utopia. Desconhecem o ensinamento cristão, contido na Epístola aos Romanos: “Como num só corpo temos muitos membros, cada qual com uma função diferente” (Rm 12, 4).
Viver exige saber conviver. “Homem algum é uma ilha”, escreveu Thomas Merton. O diferente amplia a visão, levando as pessoas a um melhor autoconhecimento. Conviver é respeitar, ter a capacidade de ouvir para se enriquecer com outras maneiras de pensar e ver o mundo. Quão monótona e deprimente seria uma sociedade formada de robôs! Os dias atuais estão mostrando que o maniqueísmo continua vivo e atuante. E, como todo “ismo”, tende a ser ideológico e empobrecedor. O Brasil, que se diz cristão, parece ignorar as palavras do apóstolo Paulo: “De fato, o corpo é um, embora tenha muitos membros” (1Cor, 12, 12).
segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025
Cartas de Cotovelo – Verão de 2025 – 06
Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes
A nossa aprazível praia de Cotovelo vem recebendo um volume expressivo de empreendimentos, tornando-se, verdadeiramente, quase um bairro de Natal.
Tal ocorrência desagrada uma parte dos veranistas, que se veem forçados a suportar a quebra da tranquilidade da praia, com o excesso de ambulantes poluindo o ambiente e colocação inadequada de sombrinhas com a finalidade negocial no campo da gastronomia, sem as cautelas de manter a limpeza e, de quando em vez, provocando a presença disfarçada de pessoas perturbadoras do sossego.
Dentro de um entendimento antropológico e sociológico nada é possível fazer para impedir esses fenômenos, face a ser uma contingência normal da sociedade. Contudo, um procedimento é possível adotar para o controle dessas ocorrências – a fiscalização eficiente nos campos da limpeza, segurança e ordenamento espacial, combinados com uma constante conscientização para condutas salutares ao encontro da convivência pacífica.
Lamentavelmente, muitos dos fatos geradores dessas infrações que incomodam os veranistas e moradores são provocados por pessoas aqui albergadas, como o caso do abuso de som alto, sem resguardo do horário de silêncio, ainda que decorrente de festas particulares, quanto mais daquelas contratadas por interesses diferentes, gerando um incômodo insuportável e obrigando a proteção policial.
Muitos desses eventos ultrapassam apenas um dia e são oferecidos por dias seguidos, com resultados negativos em várias vertentes como prejuízo ao tráfego de veículos, estacionamentos desordenados, embriaguez e outros exemplos negativos e prejudiciais para quem procuram a praia buscando desfrutar da natureza e do silêncio.
Para minimizar esses procedimentos negativos, tem sido constante o trabalho de alguns veranistas e moradores isoladamente e por iniciativa da PROMOVEC – Associação dos Proprietários, moradores e veranistas de Cotovelo junto à Polícia e Prefeitura Municipal de Parnamirim, as quais não são ativos no atendimento dos apelos.
Por outro lado, é indispensável que os proprietários de imóveis de locação ponham em seus contratos cláusulas restritivas de realização de qualquer evento danoso à convivência harmoniosa com a Comunidade, resguardando os princípios infringidos e reclamados cotidianamente.
Olhe, vem aí o Carnaval, Gente!!!!! E as festas serão multiplicadas no período de Momo, daí a necessidade da compreensão geral de todos para resguardarem os horários e formas de comemorações de folia, resguardo e respeitando o direito daqueles que não se envolvem nos folguedos e só precisam de sossego.
Por derradeiro, se nossa praia é conhecida pela excelência da natureza, quase de bandeira azul, deve, igualmente ser portadora da bandeira branca da paz.
Assinar:
Postagens (Atom)