Está só no começo
“Povo é a dimensão humana do Estado, o conjunto dos cidadãos de uma Nação”. (Hans Kelsen, jurista e filósofo austríaco)
(*) Rinaldo Barros
Convido o leitor para um breve passeio pela história dos movimentos populares do patropi.
Entre 1930 e 1945, o Brasil enfrentou movimentos, como a Revolução Constitucionalista, em 1932; a Intentona Comunista, em 1935; a Intentona Integralista, em 1938; que levaram grande número de pessoas às ruas. Mas protestos ou tentativas de levantes não aconteceram apenas durante o governo de Vargas. Antes de seu primeiro mandato, homens pegaram em armas em São Paulo tentando derrubar as oligarquias que há anos vinham governando o país.
Mais tarde, nos anos 1960, com a recessão econômica, inflação, desemprego e o arrocho salarial, o povo manifestou seu descontentamento por meio de greves e passeatas; culminando com o movimento militar de 1964, regime autoritário que perdurou até 1985; sufocando os movimentos populares.
Atualmente, é impossível ignorar a dimensão que os protestos - contra o (des)governo federal e a incapacidade de alguns governos estaduais para atender à demanda crescente dos bens da cidadania - têm adquirido em todo o país. As manifestações representam a indignação coletiva com a precariedade dos serviços públicos e remete à histórica Revolta do Vintém de 1879, quando manifestantes no Rio de Janeiro desafiaram a monarquia do Brasil por causa das tarifas dos bondes.
O fato é que, de um modo geral, o transporte público no Brasil é caro, inseguro e mal gerido, afetando especialmente os mais pobres que não têm escolha a não ser contar com esse sistema para sobreviver.
Em plena vivência da normalidade democrática, a insatisfação popular alimentada pela perda da Segurança, em diversas áreas urbanas, chegou a tal ponto que os manifestantes protestam e depredam ônibus, lojas, bancos e logradouros públicos durante dias seguidos; em confronto com forças policiais, atirando bombas de efeito moral e balas de borracha.
Aliás, as tropas estão cada vez menos preparadas para conviver com os movimentos sociais em luta; porquanto foram e são treinadas fundamentalmente para combater a criminalidade. Pergunto eu:
Se a violência é urbana, pode-se concluir que uma de suas causas é o próprio espaço urbano?
Os especialistas na questão afirmam que sim: nas periferias das cidades, sejam grandes, médias ou pequenas, nas quais a presença do Poder Público é fraca, o crime consegue instalar-se mais facilmente.
São os chamados espaços segregados, imensas áreas urbanas em que a infraestrutura urbana de equipamentos e serviços (saneamento básico, saúde, sistema viário, iluminação, transporte, lazer, educação, segurança e acesso à justiça) é precária ou insuficiente.
Sem dúvida, com a inovação tecnológica, estão surgindo novas camadas sociais (com nível de aspiração crescente) e novas formas de mobilização e luta. Por sua vez, a Segurança deve ser (mas ainda não é) considerada um direito de cidadania, que é fundamental para o desenvolvimento econômico e social.
Nem o Estado nem o cidadão possui ainda essa consciência.
E, pelo jeito, o PT governo – longe do Brasil real - não tem a menor ideia sobre essa complexidade social, até porque está focado apenas em “partir pra cima”; pra ganhar as eleições e se perpetuar no poder.
O caro leitor há de convir que a combinação desses movimentos de insatisfação popular, com a tendência atual da economia brasileira - eivada de incertezas - (fundada no consumismo, com inflação crescente, crescimento baixo, juros altos, desindustrialização, apagão educacional, e infraestrutura sucateada) provoca um aumento significativo das tensões, com resultado imprevisível.
É preciso atentar para o seguinte: o controle de multidões ainda não faz parte do currículo regular das nossas Academias de Polícia. Tal como ocorre atualmente, a Polícia, o Estado, ainda tende a enxergar os manifestantes insatisfeitos (o povo) como se fossem inimigos. Visão incompatível com a Democracia.
E, pior, a intervenção operacional das Forças Armadas pode ser um “tiro no pé” federal, pois são capacitadas para combater, destruir e matar. Não quero nem imaginar o cenário, se o Exército brasileiro atirar e ferir ou matar um jornalista ou turista estrangeiro durante o evento patrocinado pela FIFA.
Registre-se que, no momento em que escrevo, dezenas de manifestações estão sendo organizadas para o período da Copa do Mundo, notadamente no Distrito Federal, em São Paulo e no Rio. Clima explosivo!
O debate está aberto, e urge capacitar e aparelhar melhor o Estado brasileiro para conviver com o Estado Democrático de Direito; pois a insatisfação popular é crescente. E está só no começo.
(*) Rinaldo Barros é professor – rb@opiniaopolitica.com
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