quinta-feira, 19 de setembro de 2013


DE PABLO NERUDA
                                                                 Ciro José Tavares

Confesso ter vícios literários e a poesia de Pablo Neruda é um deles. Não menos importante é minha paixão por Federico Garcia Lorca, seja na poesia ou na dramaturgia. Apego-me aos seus trabalhos com interesses sempre renovados, para aprender mais, descobrir detalhes, refletir na beleza simples da construção do verso.
Qualquer nota técnica sobre Neruda exige que se façam referências a Lorca, principalmente por todos os sentimentos comuns que os atraiam. Ambos tinham posições políticas avançadas e foram perseguidos pelos regimes ditatoriais dos seus países. Lorca foi assassinado pelas forças franquistas em 1936, dois meses depois de ter concluído sua obra-prima A Casa de Bernarda Alba. Neruda foi um rio caudaloso de inspiração que não resistiu ao câncer, embora não faltem suspeitas de que o golpe de 11 de setembro de 1973 apressou o desenlace, ocorrido num hospital de Santiago vinte e dois dias depois da queda de Salvador Allende. Dois anos antes recebera o Prêmio Nobel de literatura e deixou nada menos de oito livros inéditos.
Tanto em Lorca como em Neruda encontramos vertentes poéticas que os identificam com os românticos ingleses do século XIX, entre eles Shelley e Keats, o verso branco refulgindo de impressionantes imagens líricas, além da rebeldia presente em suas vidas o que nos lembra de Byron.
O poema de Neruda parece estar amalgamado na sua própria vida, revelada em dois livros que não devem deixar de ser lidos e relidos; Para Nascer Nasci e Confesso que Vivi.  “Para nascer nasci, para conter o passo de quanto se aproxima, de quanto me golpeia o peito como um novo coração tremente”, escreve ele na abertura do para Nascer Nasci. Essa complexa epígrafe é logo revelada no  Mulher Remota:
Esta mulher cabe em minhas mãos. É branca e ruiva, e
minhas mãos a levaria como uma cesta de magnólias.
Esta mulher cabe em meus olhos. Envolvem-na os meus
olhares, meus olhares que nada veem quando a envolvem.
Esta mulher cabe em meus desejos. Desnuda está sob a
anelante labareda de minha vida e o meu desejo queima-a como
uma brasa.
Porém, mulher remota, minhas mãos, meus olhos e meus
desejos guardam inteira para ti a sua carícia porque só tu,
mulher remota, só tu cabes em meu coração.”
Um minuto de silêncio é muito pouco para homenagens e lembranças a quem tanto ofertou. Guardemos Neruda, cuja imortalidade emerge no lirismo dos seus próprios versos:
“En su Llama mortal, la luz te envuelve.
Absorta, pálida, dolente asi situada
contra las viejas hélices del crepúsculo
que en torno de ti da vueltas.”


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