Vai o segundo artigo sobre o novo CPC
Novo CPC (II): as sentenças
Como dito no artigo da semana passada (“Novo CPC - Os pronunciamentos do Juiz”), a disciplina da matéria relativa aos “pronunciamentos do juiz” no novo Código de Processo Civil (Lei 13.105, de 16 de março de 2015), que consta dos seus artigos 203 a 205, nos parece bem melhor que a antiga regulamentação dada à mesma matéria pelo CPC de 1973. E um dos pontos em que isso se mostra mais visível diz respeito ao conceito/definição de sentença que, nos últimos anos, foi um dos temas mais debatidos do direito processual civil.
Como muitos devem lembrar, em seu texto original, o CPC de 1973, no § 1º do seu art. 162, definia a sentença como “o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa”. Privilegiava, como característica principal para definir esse pronunciamento judicial, o fato de por fim ao processo (em verdade, o procedimento em primeiro grau). Dizia-se que a definição contida na redação original do CPC de 1973 era equivocada porque, a bem da verdade, o processo não encerrava com a sentença. Prosseguia, caso houvesse recurso e, ademais, seguia tramitando caso houvesse a execução da sentença nos próprios autos.
Nova redação foi dada a esse dispositivo (CPC, art. 162, § 1º) pela Lei 11.232/2005, privilegiando o conteúdo da decisão como forma de caracterizar esse tipo de pronunciamento: “Sentença é o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei”. A inovação trazida pela Lei 11.232/2005, em princípio, foi bem-vinda.
Entretanto, essa nova redação também não era imune a críticas. Ela era cotejada com a definição de decisão interlocutória, contida no § 2º do artigo 162 do CPC de 1973, como “o ato pelo qual o juiz, no curso do processo, resolve questão incidente”. E, mesmo levando em consideração o conteúdo do pronunciamento judicial, passou-se a debater se toda e qualquer decisão que se enquadrasse nos artigos 267 e 269 do antigo Código seria sentença (desafiando, assim, o recurso de apelação) ou se, em alguns casos, quando não ocorresse o encerramento do procedimento em primeiro grau, se teria uma decisão interlocutória (recorrível mediante agravo de instrumento). Por questões de ordem prática (pela forma diferente como se processam os recurso de apelação e de agravo de instrumento), surgiram as teses das sentenças parciais (recorríveis mediante apelação via instrumento) e das decisões interlocutórias de mérito, para casos de decisões que não punham fim à fase de conhecimento, apesar de enquadradas nos artigos 267 e 269 do CPC de 1973.
Como visto no artigo da semana passada, o § 1º do art. 203 do CPC reza que, “ressalvadas as disposições expressas dos procedimentos especiais, sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos artigos 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução”.
Sentença, portanto, é o pronunciamento do juiz que, tendo por conteúdo uma das hipóteses previstas nos artigos 485 ou 487 do NCPC, leva a fase cognitiva do procedimento comum ou a execução à extinção (quanto à execução, ver também os artigos 920, III, 924 e 925, todos do NCPC). Trata-se de pronunciamento com evidente caráter decisório, hábil a causar prejuízo jurídico às partes. É atacável via apelação (NCPC, art. 1009). É atacável também, nas hipóteses legais (NCPC, art. 1022), via recurso de embargos de declaração.
Diferentemente das decisões interlocutórias, como se verá a seguir, as sentenças possuem conteúdo legalmente pré-determinado (artigos 485 ou 487 do NCPC).
Segundo o art. 485 do NCPC, que arrola o conteúdo que pode ter uma sentença terminativa ou processual, “o juiz não resolverá o mérito quando: I – indeferir a petição inicial; II – o processo ficar parado durante mais de 1 (um) ano por negligência das partes; III – por não promover os atos e as diligências que lhe incumbir, o autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias; IV – verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo; V – reconhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada; VI – verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual; VII – acolher a alegação de existência de convenção de arbitragem ou quando o juízo arbitral reconhecer sua competência; VIII – homologar a desistência da ação; IX – em caso de morte da parte, a ação for considerada intransmissível por disposição legal; e X – nos demais casos prescritos neste Código”.
O art. 485 do NCPC elenca as questões que devem ser previamente analisadas pelo juiz, preferencialmente ainda no início do procedimento em primeiro grau, para que seja, ao final, apreciado o mérito da ação. O reconhecimento da existência de qualquer dessas questões leva à prolação de uma sentença terminativa ou processual (impedindo, assim, por interrupção do procedimento, que o juiz proferira sentença com fundamento no art. 487 do NCPC).
Já o art. 487, caput e incisos, dispõe que “haverá resolução de mérito quando o juiz: I – acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção; II – decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição; III – homologar: a) o reconhecimento da procedência do pedido formulado na ação ou na reconvenção; b) a transação; c) a renúncia à pretensão formulada na ação ou na reconvenção”.
Há mais pontos positivos do que negativos nessa postura do NCPC, sobretudo porque parece por fim a divergências existentes sobre a rotulação de determinados pronunciamentos judiciais como sentença ou decisão interlocutória, com clara repercussão na questão recursal, como se verá em uma das nossas próximas conversas.
Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP
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