MITO E PAIXÃO
Ciro José Tavares
Quando completei meu primeiro livro de poesia – Além da Rosa-Dos-Ventos --, Prêmio Ladjane Bandeira de Poesia, concurso que foi promovido pelo jornal Diário de Pernambuco. Através do colunista Marcus Prado, para homenagear a grande artista da pintura pernambucana, foi que compreendi o enorme cipoal em que havia mergulhado.
Durante alguns anos dediquei-me a estudar textos poéticos num alucinado método comparativo entre diferentes autores, especialmente os românticos ingleses, a partir de William Blake, os três gênios da tragédia grega, Sófocles, Eurípedes e Ésquilo e William Shakespeare. Verdade que sedimentei esse caminho com a Ilíada e a Odisseia, de Homero. Todas essas leituras eu as renovo sempre na esperança de encontrar ângulos que não percebi em decorrência da precipitada ansiedade. .
Confesso ser vítima do processo que me lançou nos braços dessa paixão incorrigível. Sem desejar era arrastado por misteriosa força para dentro do universo mítico. Nos dramas musicais de Wagner, por exemplo, descobri a lenda nórdica, Tristão e Isolda, Tanhäuser, Lohengrin e Parsifal e, através deles cheguei a Camelot, Guenevere, Lancelot Du Lac e os relatos legendários arturianos, descritos em Thomas Malory.
Tenho vindo à página inicial com muitos personagens. Agora não seria verdadeiro se afirmasse a inexistência deles com episódios da minha vida, que emergem nas entrelinhas não totalmente descobertos.O poeta lírico é um grande receptáculo de paixões.Busca no passado seu renascimento quando seu renascimento pode ser a própria busca, O poeta lírico está enquadrado na reflexão de Eugene O’Neill, na peça Uma lua para os Mal Nascidos:”Não há presente nem futuro.Só o passado acontece e torna a acontecer, agora”.
O raciocínio de O’Neill caminha na mesma direção dos versos de Thomas Stern Eliot em Burnt Norton, o primeiro dos Quatro Quartetos:
“O tempo passado e o tempo presente
Estão ambos talvez presentes no tempo futuro
E o tempo futuro contido no tempo passado.
Se todo tempo é eternamente presente
Todo tempo é irresgatável.”
O poeta lírico não pode deixar que no processo de criação sua própria história seja escamoteada. As referências de sua vida submersas no espírito, se vindas à tona, devem ser aproveitadas. Esta lição guardo de Oscar Wilde, desde que li seu inigualável DE PROFUNDIS, de Goethe, na Elegia de Marienbad, dos versos de Hölderlin para Diótima, e de Percy bysshe Shelley, escritos em Lerici, dedicados à Jane Williams. Eu não nego minha identidade com esses escritores. A parte final do meu livro Baladas e Moinhos os poemas são quase todos direcionados à Ariadne que num instante mágico de minha vida, ofereceu-me o cordão de ouro do coração para que eu, depois de derrotar os minotauros existenciais que me assombravam, viesse ao seu encontro fora do labirinto.
“Arrasta-me, Ariadne,
nos teus dedos prolongados
quero estar criança conduzida
à saída dos nossos labirintos.
Fala-me, quero estar
preso à tua voz
ou liberto nos fios dourados
do teu corpo tempo”.
Real em todos os sentidos dei-lhe a roupagem mítica sem qualquer revelação para ser acreditada e reconhecida. Outros poemas estão direcionados nesse livro e no Anêmonas.Aqui, ao oferecer a obra, tive que pedir perdão pelo longo silêncio na busca das palavras. A tradução do poema Come live With Me And Be my Love, de Christopher Marlowe, que intitulei de Ode Pastoral em si mesmo é uma declaração de amor. Esperei mais de 50 anos para publicar. Essa volta no tempo terminou sendo complementada pelo poema lágrimas de Orfeu, também no mesmo livro. No universo do poeta lírico o passado é inarredável. Queira ou não ele acaba fazendo parte do corpo do criador. Por essa razão está sempre presente nos mistérios das nossas composições poéticas.
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