Jair Eloi de Souza
ASSIM ESCREVÍ:
SOBRE O SOCIALISMO CABOCLO DE MINHA AVÓ ANINHA.
Parece que a vejo de olhar terno, face macerada pelo tempo e pelas intempéries das eras de magrém. Uma crença imensurável no Padrinho Cícero do Juazeiro. Colecionava rosários benzidos por este, e os usava todos no pescoço, como se aqueles dessem consistência a sua fé cabocla.
Na parede os "Registros", onde deslumbrava Santa Luzia, com seus olhos esverdeados, e a foto do Padrinho, com sua túnica preta, chapéu de abas arredondas e o cajado na mão. Lá na canarinha, o oratório, com muitas figuras de Santos que fazem a cristandade, a começar pela família do carpinteiro José. Todos ornados de fitas vermelhas e azuis. Ali era o lugar de suas orações para amenizar os aperreios da família, a reza sempre era uma oferenda a todos, até aos amigos.
Seus ancestrais, "os Baos" eram arrecursados, animais de cascos rachados, criação ovina, muares de monta e glebas na ribanceira do Piranhas. Mas, o empobrecimento viera a partir do último quartel do Século XIX, secas tiranas (1877-1879), 1898, e as mais destruidoras do Século pretérito (1915 e 1919). Dizia-me ela que nessas últimas, foram-se todos os bichos, ficaram somente as amarras e os chocalhos e o arraso da fome, que matara muitos cristãos.
Tinha minha avó uma praxe, antes dos dias grandes da Semana Santa, fazia uma coleta de grãos junto aos amigos e parentes e toda a arrecadação na quinta e sexta-feira, distribuíam com os mais pobres que acorriam a sua casa. Nessa tarefa, eu ainda infante, lhe ajudava, pondo uma porção de gêneros em cada saquinho dos que pediam para jejuar. Esse era o lado socialista da alma de minha avó Aninha.
* ANA VICÊNCIA DA CONCEIÇÃO: Minha avó materna.
J.E.S.
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