sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Moacy Cirne: um nome essencialíssimo ao Brasil

(Lívio Oliveira)


O meu querido amigo Moacy Cirne, escritor e poeta de 
elevado renome, que não se situava somente nos limites 
do nosso Rio Grande do Norte, concluiu sua obra terrena
 na tarde quente do verão natalense desse último sábado 
que passou. Acompanhava notícias sobre o seu complexo 
quadro de saúde já havia um bom tempo. Mas, mesmo 
assim, fui tomado por um certo impacto, um choque, ao 
ler a notícia numa das redes ditas sociais. Havia ali uma 
foto de Moacy e alguns vagos dizeres sobre a sua passagem 
para um outro plano. Logo após, surgiu em mim uma tristeza
 calma e reflexiva que compartilhei com a minha esposa.
Intelectual múltiplo, Moacy detinha um olhar circular e 
atento que poucos possuíam neste país. Não é à toa que 
o mestre Tarcísio Gurgel costuma dizer que Moacy Cirne 
era o intelectual mais completo de sua geração. Além de 
toda a obra que deixou em livros e que também firmou 
na criação e liderança do histórico e emblemático 
movimento do Poema-Processo, lecionou com afinco
e amor em universidade carioca, foi um dos maiores
amantes e estudiosos do cinema e dos quadrinhos e
 exerceu outras muitas tarefas de cultivo do intelecto
no seu envolvimento visceral e apaixonado pelo mundo 
das realizações artísticas e culturais. Firmou, ainda
dignas posições político-ideológicas avançadas e
preocupações sociais que manteve até o final dos seus dias.
Moacy também era um grande fazedor de amizades,
sabendo alimentá-las com atenção e generosidade, 
doando a cada um dos seus próximos um pequeno 
quinhão de sua sabedoria calma, serena. Seu sorris
 suave e doce cativava fortemente quem dispunha
das saborosas oportunidades de uma conversa mansa
tranquila, ou mesmo com a paixão e os argumentos
 sólidos e cortantes e até irreverentes por ele levantados.
Um aspecto lhe era intrínseco e se fazia indissociável
da figura do grande amigo que partiu: Moacy era um
 sábio, era um sábio, era um sábio! (lembro que ele
gostava de brincar com os famosos versos de
Gertrude Stein: “uma rosa é uma rosa é uma rosa”)
 Bastava ouvi-lo e olhar para ele e perceber isso
estampado nos seus olhos perspicazes e nas suas
barbas brancas que lembravam as de um profeta 
bíblico. Por sinal, a Bíblia foi um forte objeto de 
estudos de Moacy nos últimos anos – salientando-se
 que era ateu (ou agnóstico), reconhecidamente. 
O livro póstumo terá, certamente, o nome que 
Moacy já havia escolhido, segundo me afirmou 
um dia: “A Bíblia: travessia, travessias”, numa alusão
direta a Guimarães Rosa.
Os momentos de desfrute intelectual e da amizad
com Moacy foram muitos para mim: Encontros
 fortuitos por Natal, participação mútua em
lançamentos de livros, algumas visitas que lh
fiz em casa (nunca encontrei Moacy no Rio,
infelizmente. Seria ótimo ver um Fla-Flu no 
Maracanã e sentir a vibração de Moacy pelo
seu Fluminense, mesmo que eu seja sempre
Flamengo), um texto introdutório que ele fez
 para um dos meus livros, uma entrevista que 
me concedeu em 2008, debates culturais diversos
 (inclusive através do seu blog “Balaio Porreta,
que manteve por muitos anos), dentre outras 
boas situações que tive de encontrar Moacy e
 sua inteligência viva e dinâmica.
Ao grande Moa dedico a minha pequena homenagem
 e agradecimento. Moacy Cirne se fez e se faz essencial
à cultura potiguar e brasileira e a todos os seus amigo
 saudosos. Todos, certamente, dedicarão parte de suas 
memórias a Moacy, estando em processo de 
amadurecimento, inclusive, a ideia de um livro 
coletivo de depoimentos acerca de suas vida e
obra, o que é algo que lhe é devido, mas simples 
diante de tudo que fez por estas bandas de cá. 
Moacy Cirne é, sim, um nome que se inscreve 
como essencialíssimo ao Seridó, ao Rio Grande 
do Norte e ao Brasil. Sempre será lembrado e
deverá ser homenageado fortemente (autoridades
potiguares que nos ouçam e, se possível, leiam),
 por seus grandes méritos e valores. Não custa
repetir: Moacy vive e nos orgulha a todos!

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