domingo, 8 de dezembro de 2013

Verdades cruzadas - IV
CARLOS ROBERTO DE MIRANDA GOMES, Professor aposentado do Curso de Direito da UFRN e Presidente da Comissão da Verdade. Sócio do IHGRN.

            Mesmo derrotado no período do Estado Novo, continuou na política alcançando vitória no Parlamento do Brasil e o retorno à curul do Poder Executivo que o levou à morte de forma trágica – o suicídio.

            Foi-se o homem, mas ficou a fama.

O Brasil sem Vargas era uma incógnita eleitoral nas semanas que se seguiram ao suicídio. Alguns pensavam que Getúlio continuaria a eleger ‘post-mortem. O udenismo tinha esperanças de que o poder bem manipulado poderia alterar o rumo dos acontecimentos, extirpando as raízes do PTB órfão e retirando a motivação do PSD, que não se privaria das condições de se beneficiar do poder.
Claudio Bojunga. JK o artista do impossível. RJ: Objetiva, 2001. 

Nesse clima de incerteza foi realizado o pleito para escolher o novo Presidente da República, saindo vencedor Juscelino Kubitschek de Oliveira, pela legenda do PSD, contra Juarez Távora (UDN-PDC), Adhemar de Barros e Plínio Salgado. Com ele assume o Vice-Presidente João Goulart (PTB).

Sua gestão é iniciada em pleno estado de sítio, com a deposição do Presidente interino Carlos Luz e substituição por Nereu Ramos. Mas, apesar de muita turbulência, inclusive de duas rebeliões armadas – Jacareacanga, no Estado do Pará, provocada por militares da Aeronáutica e Aragarças, no Estado de Goiás, respectivamente, em 1956 e 1959, conseguiu chegar ao final do seu governo com grande aplauso do povo e reconhecimento da Nação, transferindo a Capital da República para Brasília em 21 de abril de 1960, de onde, em 31 de janeiro do ano seguinte, no Palácio do Planalto (DF) transferiu a faixa presidencial ao seu sucessor Janio Quadros, vencedor da eleição pela coligação UDN/PR/PL/PDC/PTN, tendo como Vice-Presidente o Senhor João Goulart (PSD/PTB/PST/PSB/PRT) que fazia parte da chapa do seu principal opositor Henrique Teixeira Lott (PSD/PTB/PST/PSB/PRT), Marechal do Exército brasileiro e que se apresentava como exceção à regra dos militares de alta patente.

Concorreu nesse pleito, ainda, o conhecido político paulista Adhemar de Barros (PSP).

Janio Quadros assume o governo num clima de democracia e com a presença de grande concentração popular, iniciando uma gestão marcada pela expedição de atos excêntricos e procedimentos contraditórios, que abreviaram o exercício do seu mandato, abruptamente terminada com a sua renúncia no dia 25 de agosto de 1961 – Dia do Soldado, cuja solenidade marcou o seu derradeiro ato presidencial, pois logo no início da tarde anunciava a renúncia: “Forças terríveis levantam-se contra mim e me intrigam ou difamam, até com a desculpa de colaboração.”

Seu gesto foi comunicado aos três ministros militares pelo General Pedro Geraldo e em seguida ao Senador Moura Andrade pelo Ministro Oscar Pedroso Horta, sendo encarregado ao jornalista Murilo Melo Filho fazer a entrega de cópia à Câmara Federal na pessoa de Abelardo Jurema.[1]

Nessa emergência assume o governo o Deputado Ranieri Mazzili, uma vez que o Vice-Presidente João Goulart encontrava-se em viagem ao exterior, gerando expectativas durante treze dias de incertezas, pois forças militares se opunham à sua investidura, sob o comando do Marechal Lott e incontrolável pressão das forças populares lideradas por Leonel Brizola e pelos estudantes. A solução política encontrada naquela ocasião foi a aprovação, em regime de urgência urgentíssima, no dia 2 de setembro, da Emenda nº 4 à Constituição, restringindo os poderes da Presidência da República e da instauração de um regime de gabinete (parlamentarismo), inteiramente fora das tradições brasileiras.

Com esse novo formato, João Belchior Marques Goulart assume a Presidência da República Federativa do Brasil no dia 7 de setembro de 1961, tendo como seu Primeiro Ministro o Senador Tancredo Neves.

O novo Presidente era pressionado para formar um governo à esquerda, com projetos de reformas de base no campo agrário – organizam-se ligas camponesas com atuação no nordeste através de Francisco Julião e da nacionalização de empresas e bancos; criação da SUDENE e da CHESF, apontando para o início da industrialização do Nordeste. Para isso Leonel Brizola percorria todo o Brasil em pregação dessa ideologia.

Em 6 de janeiro de 1963 um plebiscito derruba o regime parlamentar e restaura o presidencialismo dando ao Presidente o maior respaldo de que ansiava para complementar as suas ideias reformistas, que foram o estopim para o início de um clima de violência política, com realização de comícios inflamados – um dos quais em 26 de fevereiro de 1964, promovido por Brizola com resultado de pessoas feridas – era a radicalização inevitável.[2]




[1] Registram os historiadores que a renúncia de Jânio seria um golpe,  para, em seguida desistir dela, e retornar mais forte ao governo, oportunidade que não lhe foi dada.
[2] Os analistas políticos apontam o pouco preparo político e ideológico de JG – “latifundiário com saudável preocupação social”, porém vacilante, fraco, apavorado, demagogo, corrupto, populista de pouco talento, ambíguo – herdeiro do legado de Getúlio.

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