AUTORIDADE,
PODER E DIÁLOGO
Os evangelistas narram a admiração dos
ouvintes de Cristo, diante de seus ensinamentos. “Ele falava como quem tem autoridade, não como os escribas” (Mt 7,
20). Autoridade é um termo latino, derivado de auctoritas, de onde provém também a palavra autor. Pode-se inferir
que o vocábulo em latim não significa, em princípio, poder. Alguém se reveste
de autoridade, quando cria, inova, mostra originalidade. Um mestre, chefe,
religioso ou pai a possui, enquanto apresenta algo de novo e, por isso, é
respeitado. Os contemporâneos de Jesus eram meros repetidores. Quem tem
autoridade não impõe, propõe; não dita, dialoga; cativa, não amedronta; é
seguido, não obedecido por temor. A mensagem de Jesus, repleta de novidade, era
diferente daquela dos doutores da lei, escribas e fariseus. Daí, a palavra Evangelho. Ensinou, em vez de vingança,
perdão; de ira, mansidão; de incompreensão, benevolência; de arrogância,
ternura; de presunção, humildade; de ódio, amor e misericórdia. É sempre atual
a prece de Moisés Ben Maimônides, o Espanhol: “Senhor retira de mim a ideia do poder e no meu coração põe algo de
novo, cheio de afeto e amor”.
“Todo poder vem de Deus” (Rm 13, 1), afirma São Paulo. No entanto, é mister entender as palavras
do apóstolo, do ponto de vista bíblico e semântico. O étimo deriva de potere, cujo presente do indicativo é possum, de onde se origina posso. A
conotação da palavra é indispensável para a vida humana e social. Possum (de post+sum) significa ser
depois, estar após, o que vem em segundo plano. O poder, portanto, deve vir não
em primeiro lugar, mas complementar o homem e não o destruir. É-nos dado para
aperfeiçoamento do outro. Eis, pois, o sentido da expressão de Paulo. Deus
no-lo concede para ajudar o homem na sua perfeição. Assim, perceberemos que ele
é serviço, nunca dominação, proveito, mordomia, exploração, e sim capacidade de
vir após o outro para ajudá-lo e completá-lo. Desta forma, devem caminhar todos
os poderes, nas diferentes esferas da sociedade.
A consequência da autoridade e do poder
é o diálogo. O termo provém do grego diá+logos (que significa palavra que vem
através ou a favor de). Cristo dialogava porque os possuía verdadeiramente: “Todo o poder me foi dado no céu e na terra”
(Mt 28, 17). Quando alguém, em casa, na empresa ou na Igreja, exclama: “Aqui, quem manda sou eu”, é porque está
inseguro e desprovido daqueles atributos. Estes não se expressam pela força,
mas pela capacidade de ouvir e responder de forma justa e coerente. Quando
Cardeal de Buenos Aires, Bergoglio dizia: “Para
dialogar, é preciso ter o coração aberto para escutar. À medida que o homem tem
mais fé, ele fecha menos portas, pois sabe em quem está apoiado”.
Vivemos numa sociedade de inúmeras
reuniões, congressos, conferências e muitas falas, mas pouco diálogo. Vários se
isolam, temendo que o outro possa destruir sua identidade. No Brasil de hoje, envolto
em manifestações, passeatas e greves, os cidadãos ressentem-se de monólogo. Não
podemos esquecer que dialogar é divino. Temos no Gênesis as duas primeiras
tentativas. Partem de Javé. A primeira mostra-nos Adão, escondido e com
vergonha, cheio de desculpas e escusas.
Na segunda, Deus pergunta a Caim: “Onde
está o teu irmão”. Ele respondeu, com uma evasiva: “Não sei. Por acaso sou guarda do meu irmão”? (Gn 4, 9). O diálogo é sagrado, oriundo do âmago divino,
palavra celestial. Cristo se fez Verbo e quis habitar entre nós. O Eterno quis
falar sempre conosco, porém, fechamo-nos uns para os outros e para o próprio
Criador. Deus não cerra suas portas ao ser humano. O evangelista João
apresenta-nos uma alegoria, em que define Cristo como sendo a Porta. O Papa
Francisco entendeu tudo isso e afirmou: “Abramos
as portas da Igreja, deixemos entrar quem quiser, pois enquanto católica, deve
ser a casa de todos os filhos de Deus”.
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