domingo, 22 de setembro de 2013

UM DOMINGO COM OS AMIGOS POETAS




                                               VESTÍGIOS
                                               Ciro José Tavares

É esse semblante cansado que aflige.
São teus bruxuleantes olhos que não veem,
 teus lábios pálidos decorados de estrias
sem o  fulgor  do fogo e a doçura
do néctar dos deuses
São as mãos ás peras e trêmulas que me ferem
e o  trôpego andar buscando  inalcançável, que dá pena.
São as marcas senis maculando a pele alva que se esgarça,
o castanho claro dos cabelos agitados nos brancos esvoaçantes.
Olha-te no largo e retangular espelho do teu quarto.
Acredita, és tu ou o que te resta, entardecida e só.

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BLUES DE DEUS

Não rias de Deus

Não ponhas Deus no trapézio
ou na ribalta

Nem mesmo digas:
“é mais que isto
não se importará”

Nosso Deus perdoa
e sabe que o homem
é um nicho de revoltas

Mas mesmo assim perdoa

Um pai leva o filho à escola
a todo custo

o pai quer ver o filho crescer
-  o filho voa

                        (Horácio Paiva)

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Para iniciar o dia, os Poetas Pedro Pereira e Ivam Pinheiro ofertam aos bons amigos de todas as cores, a doce magia na poesia do afeto que brilha no visual sabor fraternal do "Café com Flores". Bom Dia e Luz Divina de Deus para Todos!

CAFÉ COM FLORES.
Ivam Pinheiro

É café com flores
toda oferta certa
na fé de amores.
Para bons amigos
brilhos das cores
é o afeto na seta
que aponta e sigo.

É café com flores
com bons amigos
de todas as cores.

E se é amigo digo
vale qualquer cor.
Na paz de querer
bem na vida viver
plantei a fé na flor
que trago comigo.

Natal, RN, Brasil, 04.09.2013.

* Poesia idealizada a partir de diálogo intertextual e visual com frase e imagem postada por Pedro Pereira:

"Bom dia!!!
Café com flores para os amigos de todas cores.
Pedro Pereira".

**Poema dedicado aos bons amigos de todas as cores, tantos os da minha amizade, quantos os que povoam o viver do meu amigo Pedro Pereira.

Café com Flores - Imagem, sem identificação de
autoria, disponível na página de Pedro Pereira

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ENCONTRO COM A POESIA  -   INTERLÚDIO (II)
                                                           (Por Horácio Paiva)
                                   TRÊS JÓIAS DO ROMANTISMO
            Neste intervalo contemplativo, ainda sob o domínio da emoção romântica, estampo três caros poemas, lidos e relidos no tempo que me coube: O INFINITO, do italiano Leopardi; TRISTEZA, do francês Musset; e ODE SOBRE UMA URNA GREGA, do inglês Keats. Os seus tradutores são, pela ordem: Vinicius de Moraes, Guilherme de Almeida e Augusto de Campos. No final, introduzo uma nota sobre o genial poeta romeno Eminesco, acompanhada de uma de suas poesias, um soneto traduzido por Nelson Vainer.  Há uma segunda nota em que apresento a tradução d’O INFINITO feita por Ivo Barroso. Muito boa também. Mas dei preferência a de Vinicius por amá-la há muito tempo e sabê-la de cor. Vejamos então:

GIACOMO LEOPARDI (1798-1837)
            O INFINITO
Sempre cara me foi esta colina
Erma, e esta sebe, que de tanta parte
Do último horizonte o olhar exclui.
Mas sentado a mirar, intermináveis
Espaços além dela, e sobre-humanos
Silêncios, e uma calma profundíssima
Eu crio em pensamentos, onde por pouco
Não treme o coração. E como o vento
Ouço fremir entre essas folhas, eu
O infinito silêncio àquela voz
Vou comparando; e vem-me a eternidade
E as mortas estações, e esta, presente
E viva, e o seu ruído. Em meio a essa
Imensidão meu pensamento imerge
E é doce o naufragar-me nesse mar.
ALFRED DE MUSSET (1810-1857)
            TRISTEZA
Eu perdi minha vida, e o alento
E os amigos, e a intrepidez,
E até mesmo aquela altivez
Que me fez crer no meu talento.

Vi na Verdade, certa vez,
A amiga do meu pensamento;
Mas, ao senti-la, num momento
O seu encanto se desfez.

Entretanto, ela é eterna, e aqueles
Que a desprezaram  -  pobres deles!  -
Ignoraram tudo talvez.

Por ela Deus se manifesta.
O único bem que ainda me resta
É ter chorado uma ou outra vez.
JOHN KEATS (1795-1821)
            ODE SOBRE UMA URNA GREGA
Inviolada noiva de quietude e paz,
Filha do tempo lento e da muda harmonia,
Silvestre historiadora que em silêncio dás
Uma lição floral mais doce que a poesia:
Que lenda flor-franjada envolve tua imagem
De homens ou divindades, para sempre errantes,
Na Arcádia a percorrer o vale extenso e ermo?
Que deuses ou mortais? Que virgens vacilantes?
Que louca fuga? Que perseguição sem termo?
Que flautas ou tambores? Que êxtase selvagem?
                        II
A música seduz. Mas ainda é mais cara
Se não se ouve. Dai-nos, flautas, vosso tom;
Não para o ouvido. Dai-nos a canção mais rara,
O supremo saber da música sem som:
Jovem cantor, não há como parar a dança,
A flor não murcha, a árvore não se desnuda;
Amante afoito, e o teu beijo não alcança
A amada meta, não sou eu quem te lamente:
Se não chegas ao fim, ela também não muda,
É sempre jovem e a amarás eternamente.
                        III
Ah! folhagem feliz que nunca perde a cor
Das folhas e não teme a fuga da estação;
Ah! feliz melodista, pródigo cantor
Capaz de renovar para sempre a canção;
Ah! amor feliz! Mais que feliz! Feliz amante!
Para sempre a querer fruir, em pleno hausto,
Para sempre a estuar de vida palpitante,
Acima da paixão humana e sua lida
Que deixa o coração desconsolado e exausto,
A fronte incendiada e a língua ressequida.
                        IV
Quem são esses chegando para o sacrifício?
Para que verde altar o sacerdote impele
A rês a caminhar para o solene ofício,
De grinaldas vestida a cetinosa pele?
Que aldeia à beira-mar ou junto da nascente
Ou no alto da colina foi despovoar
Nesta manhã de sol a piedosa gente?
Ah, pobre aldeia, só silêncio agora existe
Em tuas ruas, e ninguém virá contar
Por que razão estás abandonada e triste.
                        V
Ática forma! Altivo porte! em tua trama
Homens de mármore e mulheres emolduras
Com galhos de floresta e palmilhada grama:
Tu, forma silenciosa, a mente nos torturas
Tal como a eternidade: Fria Pastoral!
Quando a idade apagar toda a atual grandeza,
Tu ficarás, em meio às dores dos demais,
Amiga, a redizer o dístico imortal:
“A beleza é a verdade, a verdade a beleza”
-  É tudo o que há para saber, e nada mais.
                                   -x-x-x-x-x-
NOTAS:
(1)       Dentre tais expoentes europeus  -  e outros de igual magnitude  -  uma estrela brilha na Romênia e seu brilho aquece o ocidente, embora pouco notado entre nós: MIHAIL EMINESCO, aquele que disse o seu epitáfio nesses versos:
“Tenho ainda um desejo:
Na tarde silente
Me permitais morrer
Na beira do mar.”
            Conheço-o graças à ANTOLOGIA DA POESIA ROMENA, traduzida e organizada por Nelson Vainer, editada em 1966 (pela Editora Civilização Brasileira), e que tenho a subida honra de possuir desde então, como presente do hermano Hermano.

            Dele faz rasgados elogios Giuseppe Ungaretti: “Raramente se encontra na literatura dos últimos dois séculos uma figura de escritor e poeta mais complexa e mais completa que a de Mihail Eminesco.” “(...) poeta de sentimento torturado e ardente até à conquista do mais alto esplendor, que faz dele um dos maiores poetas do seu tempo e de todos os tempos, através da humanidade, Eminesco permanece para sempre um dos mestres da palavra poética profundamente inspirado.”

            Bernard Shaw, em carta dirigida à escritora Sylvia Pankhurst que, em 1930, publicara, em Londres  -  e pela primeira vez em inglês  -, uma coletânea de poemas de Eminesco, situa o poeta entre os maiores poetas românticos do século XIX.     

            O meu amigo e poeta, o norte-rio-grandense Jarbas Martins, que acolhe e coleciona sonetos, certamente gostará deste, romântico. Não é a obra-prima de Eminesco, geralmente assim considerado o seu poema LÚCIFER (Estrela da Manhã), um longo de 46 quadras, ou seja, 184 versos. Mas o soneto escolhido é belo e traz, bem talhada, a medida do romantismo:
SONETO
Quando a própria voz dos pensamentos se cala,
e em mim ressoa um canto doce e piedoso
então, te invoco; ouvirás o meu apelo?
Das brumas frias em que nadas, irás libertar-te?

Irão iluminar a noite profunda
os teus olhos grandes, portadores de paz?
Ressurges da sombra dos tempos idos,
Para ver-te voltar  -  como em sonho, assim, viva!

Desces devagar... perto, mais perto,
aconchegas-te novamente sorrindo à minha face,
oh, teu amor com um suspiro mostra-o,

com tuas pestanas tocas as minhas pálpebras,
que eu sinta a vibração do teu abraço
perdida para sempre, eterna adorada.
(2)       E, novamente, O INFINITO de Leopardi, agora na tradução de Ivo Barroso:
                        O INFINITO
Sempre cara me foi esta colina
Erma e esta sebe, que de extensa parte
Dos confins do horizonte o olhar me oculta.
Mas, se me sento a olhar, intermináveis
Espaços para além, e sobre-humanos
Silêncios e quietudes profundíssimas,
Na mente vou sonhando, de tal forma
Que quase o coração me aflige. E, ouvindo
O vento sussurrar por entre as plantas,
O silêncio infinito à sua voz
Comparo: é quando me visita o eterno
E as estações já mortas e a presente
E viva com seus cantos. Assim, nessa
Imensidão se afoga o pensamento:
E doce é naufragar-me nesses mares.
                                                -x-x-x-x-x-

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