segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013


OS ÚLTIMOS SERÃO OS PRIMEIROS: QUANDO?
Por Franklin Jorge l Novo Jornal [Natal, 24 de fevereiro de 2013]
Na última sexta-feira recebemos em Natal o representante da Funarte para o Nordeste, que aqui esteve para “descobrir” o motivo pelo qual a cultura norte-rio-grandense está em último lugar em projeção no país. Simpático e com a fama de ser uma das últimas pessoas comprometidas com a cultura no Brasil, no âmbito do oficialismo, Naldinho Freire fez uma revelação estarrecedora: a cultura está no fundo do poço, e a prova disso é que ele está viajando sem diárias, hospedando-se na casa de artistas, o que delata como a cultura é encarada pelos governantes.
[Escrito depois: Naldinho Freire reuniu-se com artistas e representantes de instituições no Teatro de Cultura Popular, quando falou das dificuldades que se interpõem na produção cultural. Ele, ao descobrir que tinha à sua disposição um automóvel que podia leva-lo por todos os domínios de sua jurisdição, e não tendo recursos para diária, viajou e hospedou-se em casa de uma artista sua amiga, fato que dá medida exata do abandono em que se encontra a Cultura no país.
Representante da Fundação Nacional de Arte para o Nordeste, Naldinho substituiu o nosso Fabinho, afilhado queridíssimo da deputada Fátima Bezerra, que não caiu nas graças da ministra Marta Suplicy. É simpático, comunica-se bem com os artistas e as instituições, porém tem muito pouco a oferecer-nos, a não ser duas oficinas de audiovisuais para Natal e a oportunidade, importante para a auto estima da cultura local, de vir a Pinacoteca do Estado a realizar no Recife uma grande mostra representativa, em número e qualidade, do contingente de artistas Naïfs atuantes no Rio Grande do Norte.]
Não é só a Funarte que vive de pires na mão. Se o seu representar aqui veio para nos fazer inveja, perdeu o tempo e o latim. Já conhecemos profundamente esse estado de miséria. Há anos, no Rio Grande do Norte, a cultura vive à míngua ou de promessas que não passam de conversa fiada.
Prova disso, Natal é a única capital que não tem biblioteca pública e isto já dura, pelo menos, duas décadas, sem que ninguém se toque para a gravidade dessa abstenção dos governantes em uma questão de interesse público. Tudo aqui é muito sazonal. As coisas acontecem de maneira pontual, por capricho dos gestores que nunca se afinam com a realidade; as cosas acontecem aqui sem exigência de qualidade e sem compromisso de continuidade, e, sobretudo, sem nenhum respeito pelos artistas ou à opinião pública.
Falta-nos uma crítica militante que incite o contraditório. Falta-nos a valorização do mérito, que aqui corre o risco de finar-se sem um magro e imparcial registro, tímido que seja, em sua defesa. Aqui, desde que me entendo por gente, a Cultura não tem sido levada a sério e costuma ser pisoteada ou folclorizada, como uma arca sem fundo de promessas não cumpridas, de carências recorrentes e de absoluta desconsideração para com o recurso humano.
Parece contraditório que em Natal a energia revolucionária que emana da arte autêntica seja desperdiçada com coisa de somenos e nunca se realize plenamente, pois é comum entre nós que a cultura e o talento sejam discriminados e considerados por dirigentes como ofensas pessoais. Além disso os artistas têm sofrido sistematicamente humilhações e têm sido submetidos à angústia da espoliação diante do prestígio de que gozam os “atravessadores” que nada produzem e tiram proveito da verba pública, enquanto os verdadeiros criadores amargam um terrível anonimato em sua própria terra, e não apenas no Brasil, como podia pensar o pessoal da Funarte. Todos os artistas têm aqui um histórico de desgastes e prejuízos em eventuais relações com o incorrigível poder público.
Como resultado do desmanche da cultura que vem de sucessivos fracassos administrativos decorrentes das más escolhas, chegamos, finalmente, a esse nível de exaustão que tem alimentado a insatisfação dos artistas diante da cronicidade desse estado de pauperismo cultural que delata a má vontade ou o desprezo dos governantes pela Cultura da nossa terra. Em campanha, a governadora do Rio Grande do Norte assumiu o compromisso de criar o Fundo Estadual de Cultura, dotado de 30 milhões de reais oriundos de renúncia fiscal, o que constitui hoje a única esperança de produtores e instituições culturais que já há muitos governos vivem de pires na mão, suplicando migalhas. Porém já decorreu mais da metade do mandato da atual governadora e chegamos a um estado de exaustão: sem os recursos desse Fundo que ainda não nos deu o sinal de sua graça, a Cultura norte-rio-grandense estará completamente falida e mal paga, apesar dos eflúvios da Copa de 2014.
Ora, a atividade cultural espelha o caráter da gestão. Estamos há anos como que mergulhados em trevas, reclamam os artistas, reclamam os produtores culturais, reclamam as instituições, pois aparentemente vivemos num estado onde nada acontece. Portanto, tem tudo a ver o que afirmou o jornalista Paulo Francis em um de seus livros publicado ainda nos anos 70: o Rio Grande do Norte continua sendo o estado mais silencioso do Brasil. Pelo menos no que se refere a Cultura, que, como ninguém ignora, não aparece nem sai de baixo. Está sempre na rabeira dos acontecimentos e não brilha no cenário nacional.
Nossos artistas, em decorrência da falta de estrutura e planejamento crônicos, não mostram seu talento; não tem incentivo e sempre se estressam quando tem alguma merreca a receber; sequer conseguem ultrapassar o brejo de Macaíba.
A verdade que incomoda é que, apesar da existência de artistas de valor, atuando em todos os segmentos culturais, vivemos ainda lamentavelmente em um exílio permanente e num arrenegado enquistamento deletério que prova tão somente nossa insignificância como gestores da Cultura, pois não tivemos ainda a capacidade de honrar os frutos produzidos por aqueles que nos precederam no passado e tiveram a coragem de realizar, como o ex-governador Aluízio Alves e o diretor de teatro Jesiel Figueiredo. Cito esses dois nomes emblemáticos da nossa Cultura, da Cultura Potiguar: um governador que lia, escrevia e valorizava a Cultura e para isto criou a Fundação José Augusto que se transformaria, com o passar do tempo, em um depósito de fantasmas vivos. O outro nome e Jesiel Figueiredo, que fez do seu teatro infantil uma ação em favor do teatro, durante duas décadas de realizações, produziu um público que continua vinte anos depois a frequentar nossas casas de espetáculos.
Diante de todos esses anos – e de governantes descompromissados com a nossa cultura –, não admira que estejamos na rabeira da vida cultural do país. Que continuamos vivendo em anonimato, apesar da honra de contarmos, entre os norte-rio-grandenses, com artistas dignos desse nome. O Rio Grande do Norte é, em resumo, um lugar de exílio da Cultura e de aviltamento dos artistas que ficam sempre à mercê da caridade pública.
A verdade nua e crua é que estamos excluídos do cenário nacional e a responsabilidade dessa situação resulta da abstenção dos governantes nesse quesito – o incentivo às Artes – e a incapacidade, por parte dos gestores, de acolhimento do novo, da novidade, da inovação, e, principalmente, da capacidade de transformar palavras em ação.

Um comentário:

  1. Oportuna e contundente matéria !!!
    Pena que outras vozes, como a de Franklin Jorge, que expõe as mazelas da nossa desprezada cultura, não se façam ouvir, sobretudo, conjuntamente, organizadamente, com poder de reverberação, para que os norte-riograndenses saibam quem são, realmente, os verdadeiros algozes da cultura potiguar.
    É lamentável a forma como a classe artística potiguar se mantém distante de assuntos tão relevantes e que carecem de engajamento. Seremos fortes na discussão e condução dos interesses da nossa cultura se nos fizermos ouvir institucionalmente. Do contrário, ecoará no deserto o grito solitário de mais um combatente indignado...
    DIDI AVELINO

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