"DOSSIÊ MEGAEVENTOS" - (XXVIII)
- Dra. Lúcia Capanema ______________
6.3. Mobilidade
A mobilidade urbana constitui condição de mesma de vida na cidade
moderna. Sabe-se que tanto mais democrática será a cidade quanto mais democrática
for a mobilidade, sinônimo de acesso aos diferentes segmentos do espaço urbano. Ora, é
justamente o direito democrático à mobilidade que vem sendo colocado em risco. De um
lado, assiste-se à expulsão sistemática de populações menos favorecidas das áreas
centrais e de áreas valorizadas, o que tem signifi cado sua segregação em espaços periféricos,
distantes e inacessíveis, desprovidos de serviços e infraestrutura. De outro lado, o próprio
planejamento
do transporte urbano e metropolitano privilegia de maneira
recorrente trajetos e corredores que atendem ou atenderão a determinados parcelas já privilegiadas
da população, negando a outras amplas parcelas o direito à mobilidade,
principalmente em seu trajeto casa-trabalho-casa. Assim, em Fortaleza investimentos são feitos
parra ligar o aeroporto à área hoteleira, com absoluto desprezo pelas necessidades de
transporte público da imensa maioria da população. No Rio e Recife, as conexões visam abrir à
especulação imobiliária áreas de fronteira urbana, ao invés de servir áreas mais densas e
já ocupadas.
No Rio de Janeiro, enquanto o Poder Público planeja, investe e
constrói as vias Transcarioca, Transolímpica e Transoeste, e o metrô Lagoa-Barra –
todos ligados à realização da Copa e dos Jogos, a população clama por serviços de transporte
de massa em outras direções e para outras comunidades. Em seminário organizado
pelo Instituto Histórico e Geográfi co Brasileiro (IHGB) e pelo Programa de Pós-graduação
em Urbanismo da UFRJ (Prourb) em maio de 2011 sobre as ações de revitalização
da Região Portuária
do Rio de Janeiro, intitulado “Porto Maravilha – desafi os e
problemas”, o especialista em Economia Rodoviária, palestrante convidado Marcos Poggi, declarou
que nenhuma das obras previstas para o projeto poderá aliviar a questão da
mobilidade no Rio de Janeiro e que a alternativa de transporte de massa que o Rio precisa é rumo
à Baixada Fluminense e a São João do Meriti. Os investimentos em transporte no Rio de
Janeiro, ao invés de atenderem à demanda existente, tornam possível a ocupação de áreas vazias ou
pouco densas, promovendo a valorização imobiliária e a expansão irracional da
malha urbana.
Em Fortaleza, as comunidades temem ainda mais pelas remoções,
pois, com lembra Márcio Moreira, advogado e integrante do Comitê Popular da Copa e
do Movimento dos Conselhos Populares, sabem o que aconteceu com cerca de cinco
mil pessoas que 69 Ver em anexo Pronunciamento
Público do Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente.
moravam nas comunidades Vila Cazumba e Lagoa do Zeza, deslocadas
para o longínquo conjunto habitacional Maria Tomásia:“Elas foram deslocadas para áreas sem
infraestrutura”.
Nessa capital, os projetos da Via Expressa e do VLT se superpõem
geograficamente, enquanto as inúmeras adaptações de vias ao sistema BRT serão
alimentadoras destes. Em conjunto, o sistema de transportes previsto ligará as mais
valorizadas áreas urbanas litorâneas, onde se localizam o parque hoteleiro local, o futuro “Acquário
Cearah” e o Terminal de Passageiros do Porto de Mucuripe, onde se espera a recepção de
transatlânticos de turismo para a Copa, ao aeroporto e à região do Castelão. Nesta última
região haverá uma operação de remoção – limpeza social –, de modo a favorecer a
implantação de novos empreendimentos imobiliários. A ligação ao litoral leste também tem em vista a
constituição de uma nova frente de empreendimentos turísticos da região
metropolitana. Enquanto isto, a população vem sendo transferida ou ameaçada de remoção
para outras regiões, onde não estão previstos projetos de mobilidade urbana.
O movimento “Metrô que o Rio Precisa” tem como motivação maior e
imediata a construção da Linha 4 do Metrô Rio. Segundo o sítio do grupo, “ignorando o projeto inicial licitado em 1998
que previa a ligação da Barra, através do Jardim
Botânico e Humaitá à estação São João em Botafogo, o Governo Estadual está fazendo o planejamento e
construção do Metrô Linha 4 sem qualquer transparência, baseado em estudos que não são divulgados e
tomando decisões arbitrárias com a justifi cativa de atender a demanda para os Jogos
Olímpicos.[...] A cidade do Rio de Janeiro quer um Metrô para os próximos 20 anos, e não apenas para 20 dias de
jogos olímpicos. [...] O Movimento propõe como solução mais efi caz em termos do INTERESSE PÚBLICO a
implantação do conceito de rede, mantendo o traçado original da Linha 4 (conforme marcado
em azul no mapa anexo que faz parte integrante desse manifesto). [...] A premência de tempo para
executar a ligação Zona Sul – Barra [...] não deve servir como justifi cativa para a implantação de
atalhos que venham a prejudicar o plano metroviário previsto para a cidade e a perfeita integração da Linha
4 original com as Linhas 1 e 2”.
Fonte: http://www.metroqueorioprecisa.com.br/2011/10/o-que-o-movimento-propoe/Em Belo Horizonte, a Mata do Isidoro, que deverá receber 75.000
unidades e onde será implantada a Vila da Copa, não é dotada de vias sufi cientes
para garantir a locomoção dos seus futuros moradores para outras regiões da cidade onde se
encontram as oportunidades de emprego, comércio, serviços, lazer, etc., confi gurando também
uma iniciativa pública que fere o direito de acessibilidade às futuras unidades
habitacionais.
Se é verdade que uma parcela importante dos recursos públicos a
serem investidos para a Copa e as olimpíadas estão voltados para mobilidade urbana,
é lamentável constatar que, quase sempre, os projetos privilegiam a circulação
e acesso às áreas nobres, em processo de valorização, ao invés de atenderem à
demanda acumulada ao longo das últimas décadas de crescimento urbano, e que
penaliza as condições de transporte e circulação dos bairros populares e
comunidades periféricas mais pobres.
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