domingo, 13 de fevereiro de 2011

RELÍQUIAS DA HISTÓRIA DA MÚSICA II

Dou continuidade às informações preciosas obtidas na internet, localizada sob o título "A fábrica de melodias", atribuídas aos pesquisadores: Moacir Barbosa de Souza (2) e Luiz Maranhão Filho.(3)

No Brasil, o primeiro disco em vinil foi prensado e vendido em janeiro de 1951
pela gravadora Sinter. Era um disco para o carnaval com músicas interpretadas por
Oscarito, Geraldo Pereira, Heleninha Costa e os Cariocas. Os discos tinham ainda o
tamanho de 10 polegadas, e eram gravados no sistema monofônico (um só canal) – a
estereofonia (dois canais) só iria chegar no final de 1958. O sucesso, entretanto, não foi
o esperado, porque o preço era muito alto e os toca-discos ainda não estavam adaptados
à nova rotação de 33 1/3 dos Long-playing (os equipamentos trabalhavam em 78 rpm).
A primeira gravação comercial no mundo ocorreu em 1896. Setenta anos depois,
a cadeia France-Culture transmitiu uma série de programas divulgando discos raros,
entre eles Sarah Bernhardt declamando Racine, que nunca esteve à venda nas lojas. A
gravação de programas em fita magnética teve início nos Estados Unidos em 1949
permitindo correções antes de serem passados para o acetato. Em 1953 chegaram ao
Brasil os primeiros gravadores de áudio. Os alemães criaram o magnetofone, que
gravava e reproduzia em fita, em 1930; na mesma época, os norte-americanos usavam
máquinas de gravação em arame magnético, com resultados inferiores às gravações
feitas pelo magnetofone. Os discos de alta-fidelidade (high-fidelity, ou Hi-Fi) surgiram
nos Estados Unidos em 1948, e tinham até uma hora de duração.

Rozenblit: o começo de tudo

(A.Rosenblit e jornalistas)

Ao final da Primeira Guerra Mundial – o conflito que abalou a Europa nos anos
1917/18 – verificou-se no Brasil um grande fluxo de imigrantes. Diferentes regiões
foram visadas, instalando-se em cada uma colônias que envolviam povos típicos, com
seus costumes e suas práticas. O Nordeste que, em tempos idos, acolheu sírios e
libaneses, foi mais uma vez o destino escolhido por povos do Oriente, dedicados
principalmente ao comércio. O Recife atraiu os judeus. Famílias inteiras lá se
estabeleceram e promoveram uma concentração tão grande em determinados bairros
que passaram a ser identificados por essas populações migratórias.
Luis Rozenblit(4) e sua esposa adotaram o bairro da Boa Vista e desde logo
optaram pela rua da Alegria, uma via pacata que era favorecida pela proximidade do
comércio lojista principal – a Rua da Imperatriz – distante apenas de uma breve
caminhada. No bairro, criaram os três filhos: Isaac, José(5) e Adolfo. A comunidade
judaica logo passou a dominar o ramo de móveis, ocupando a Praça Maciel Pinheiro, a
Rua do Hospício, a Rua do Aragão e adjacências; todos praticamente se conheciam, os
Cherpack, os Schwartz, os Fischman, os Mesel, entre outros.
Quando se busca um marco referencial para assinalar o começo de tudo,encontra-se um estabelecimento montado à Rua da Aurora, às margens do Rio Capibaribe, com amplas vitrines, capazes de atrair o intenso fluxo de pedestres que se movimentavam entre duas pontes: a Boa Vista e o outro extremo que homenageava a Princesa Izabel. A loja se chamou Irmãos Rozenblit Ltda, onde pontificava o patriarca e o filho mais velho, Isaac. O ramo escolhido foi o nascente comércio dos receptores de rádio, de vez que Pernambuco tinha um bom mercado, em razão do pioneirismo do Estado, assinalado pela presença da primeira emissora radiofônica do país, o Rádio Clube de Pernambuco, fundado em 06 de abril de 1919 e consolidado nos anos 30.
Vendiam-se pianos para o aprendizado das senhorinhas da alta sociedade, pois vários professores de música mantinham cursos na cidade. Em conseqüência, as primeiras gravações em disco de cera começaram a formar um comércio intenso. Duas lojas tradicionais funcionavam na Rua Nova, o coração do Recife. Eram as distribuidoras das marcas nascentes, os selos Odeon e Parlophon, do Rio de Janeiro.
Rozenblit optou por uma terceira marca, a americana RCA Victor que penetrou na praça
com uma intensa propaganda em torno do slogan promocional, A Voz do Dono, cujo selo exibia um cachorrinho de ouvido atento diante de um gramofone, a radiola da época. Com uma ampla visão de mercado, os Rozenblit descobriram, além dos rádios receptores Philips, fabricados na Holanda, um amplo filão de vendas: o eletrodoméstico,que tinha por função fazer tocar os discos. Importavam do estrangeiro a estrutura eletrônica: “pick-up” Garrard (marca inglesa), alto-falantes, amplificadores e receptores. Tendo em mãos os catálogos das peças européias, copiavam os modelos de móveis oferecidos com a ajuda de oficinas de carpintaria e logo os produtos “clonados” ocupavam suas vitrines e fascinavam as famílias mais abastadas.
Os que primaram da amizade do grupo familiar sugerem que o ingresso do segundo filho, José, na atividade mercantil, foi o motivo causador do sonho de uma
fábrica de discos, sabido que as músicas de autores pernambucanos só faziam sucesso
quando produzidas no Rio de Janeiro. Capiba e Nelson Ferreira, por exemplo, os reis do frevo, não despertaram a devida atenção das gravadoras do sul do país. Só depois de terem sua produção fonográfica gravada pela Mocambo, elas demonstraram interesse,
como a gravadora RCA Victor, que produziu e distribuiu grande parte da obra musical
de Capiba. As multinacionais da época, como a Columbia e a RCA se negavam a gravar
a produção nordestina, salvo mediante uma compra antecipada de três mil cópias.
Essa prática de antecipação era comum entre as gravadoras da época.
Resumo
A fábrica de discos Mocambo representou para a cultura nordestina a valorização do
artista local. Fundada pela família Rozenblit, que se instalou no Recife nos anos 1950 a gravadora teve altos e baixos, porém nunca abandonou o papel de incentivadora da música nordestina. Foi apontada como conservadora demais na sua política de promover os artistas da terra. Apesar disso, na época da jovem guarda, chegou a gravar e distribuir discos de artistas que tomaram parte daquele momento da música brasileira, como Martinha, De Kalafe e a Turma, Os Baobás, e outros. O sonho dos Rozenblit literalmente foi de água abaixo quando as enchentes do rio Capibaribe, em Recife,inundaram toda a fábrica na Estrada dos Remédios, fechando um ciclo importante para a cultura regional.
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2 Professor adjunto da UFRN, coordenador do curso de Comunicação Social. Pesquisa a história da mídia sonora, com ênfase na indústria fonográfica e a evolução tecnológica da radiodifusão. Blog:http://www.historiadoradio.myblog.com.br E-mail: moacirbs8@oi.com.br; moacirbs@click21.com.br
3 Professor adjunto da UFPE e Faculdade Maurício de Nassau. Pesquisa a história do rádio pernambucano. Foi diretor da TV Universitária e Rádio Universitária.
4 Rozenblit em russo quer dizer rosa de sangue.
5 Principal fundador da gravadora Mocambo e sócio majoritário, nunca foi reconhecido por seu trabalho. Apenas no
carnaval de 2003 foi homenageado no carnaval do Recife. Faleceu em 2007.

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