quinta-feira, 6 de outubro de 2022

 Desintoxicar-se e desapaixonar-se 

Padre João Medeiros Filho 

Após o primeiro turno das eleições, vamos dar uma chance à paz, desarmar os corações e serenar os espíritos. Urge desintoxicar-se e desapaixonar-se. Cristo pregou no Sermão da Montanha: “Bem-aventurados os mansos, pois eles herdarão a terra” (Mt 5, 9). Não esqueçamos que somos todos brasileiros e irmãos (para quem professa o cristianismo). As eleições devem ser concebidas como espaço da democracia. É assim que se precisa entender. Vivemos dias e semanas apreensivos, num clima raivoso, de intimidação, desconstrução de pessoas, radicalismo e agressões. Não é justo nem salutar quebrar os laços familiares e de amizade, dividindo o nosso lar, odiando nosso próprio sangue por conta de política. Podemos ser adversários, mas nunca inimigos. É necessário que assim ajam as pessoas civilizadas e cristãs. O ódio não faz bem, por isso foi condenado pelo Mestre da Galileia. “Fazei o bem aos que vos odeiam. Abençoai os que vos amaldiçoam. Orai pelos que vos caluniam (Lc 6, 27-28). Durante a campanha, sofismas e mentiras confundiram, desorientaram, desvirtuaram fatos e enlamearam pessoas. Como fazer cessar a aversão e a ira, o desrespeito vil e a agressividade? Primeiramente, é preciso desarmar os corações. Somos efêmeros, peregrinos na vida, “cidadãos de uma outra pátria” (Fl 3, 20). E para fazer esta experiência é necessário envolverse e conviver. O que nos une, supera aquilo que nos separa. Somos participantes de uma mesma natureza, temos problemas idênticos ou semelhantes, dificuldades análogas, pertencemos a uma só família. Deus nos dá a chance de nos realizar juntos, apesar de nossas limitações e pecados. Saibamos compreender e perdoar. “Ninguém é perfeito no país dos homens”, afirmava o Pequeno Príncipe. Ou como proclama com mais precisão o Evangelho: “Quem dentre vós não tiver pecado, atire a primeira pedra” (Jo 8, 7). Durante a campanha eleitoral, talvez tenhamos caído na armadilha de alguns, que em vez de unir, nos polarizaram. Em lugar de agregar, nos tornaram inimigos, desejando que eliminássemos com violência e rapidez os rivais. Esqueceram que precisamos de todos para superar e sair das ruínas, juntar os cacos deixados pela pandemia e outras desgraças que possam nos ter atingido. Importa desintoxicar-se de tanta coisa que veicularam as redes sociais e a mídia. Vamos nos voltar para as nossas tradições de povo pacífico, generoso, hospitaleiro e fraterno. As campanhas passam. O poder não é eterno. Lembremo-nos da imagem de Cristo do Corcovado, plantado como símbolo e ícone de nossa hospitalidade e do acolhimento cristão. Ele está de braços abertos para nos receber. A filosofia ensina que o homem é um ser inacabado. Necessita dos outros para se completar. Por isso, é preciso aprender a dialogar, buscar convergências, transigir, unir e aproximar. É ilusório pensar que o vencedor nas eleições só receberá os louros. Ele terá diante de si antigos, novos e gigantescos desafios. Quem foi derrotado nas urnas, não pode fazer uma oposição irresponsável e raivosa. Não sejamos egoístas, pensando tão somente em nós, em nossos interesses e partidos. O Brasil vale mais que as ideologias e suas concepções. É preciso ter em mente o futuro. A pátria não pertence apenas aos que vivem agora. Não há nenhuma escritura passada em cartório de que grupos, pessoas ou partidos são proprietários desta rica e querida Terra de Santa Cruz. Vencedores e vencidos precisam estar conscientes de que o Brasil é de todos! É hora de pensar alto e grande, como fazem os verdadeiros políticos, estadistas e pacifistas da história. Sigamos os ensinamentos de São Francisco de Assis: “Senhor, fazei de mim instrumento de vossa paz. Onde houver ódio, que eu leve o amor”. Nossa pátria precisa de serenidade. O Brasil é um país cristão. Jesus não veio incendiar o mundo com rancor e violência. Pregou e ensinou o amor. “Nisto conhecerão que sois os meus discípulos, se tiverdes amor uns para com os outros” (Jo 13, 35). Que Deus nos conceda alegria, esperança e coragem, para trilharmos juntos um caminho de união, justiça, paz e solidariedade. E que o Senhor esteja sempre no meio de nós. Meditemos as palavras do salmista: “Vede como é bom e agradável os irmãos viverem unidos” (Sl 133/132, 1).

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