POBRE MICHEL ( da
importância de ser vice)
Geniberto Paiva Campos (1) – Brasília, DF, 23 de dezembro de
2016
“ (...) Compreender
significa, em suma, encarar a realidade sem preconceitos e com atenção, e
resistir a ela – qualquer que seja. ” (1)
1. O HOMEM E SEU DESTINO
Dispensável
jogar búzios ou tarô. Consultar os astros.
O
destino dos homens parece vir marcado, em definitivo, desde seu nascimento.
É
inexorável. Os grandes homens, e aqueles menores, irão cumprir o papel que a
vida lhes reservou. Como se estivesse
escrito nas estrelas.
A Política,
às vezes, tem o dom de revelar, com indiscutível transparência e veracidade, a vocação
para a grandeza ou a miséria humanas.
A
crônica política brasileira contemporânea oferece vários exemplos que sustentam
essa tese. Graças ao nosso irredutível apego ao sistema presidencialista.
Especificamente, o desafio parece ser colocado para os que aceitam exercer a
difícil função de vice-presidente da república.
Uma categoria que poderia ser acrescentada ao
poema “ O Desespero da Piedade”, de Vinicius de Moraes: “tende piedade, Senhor, dos vice-presidentes, pois eles almejam exercer,
a qualquer custo, o cargo dos titulares. Alguns, irresistivelmente, tornam-se
traidores por profissão”.
2. AS LIÇÕES DA HISTÓRIA
Sempre
temos o que aprender com a História.
A
saga dos vice-presidentes torna-se mais evidente a partir de meados do século
XX. Poderíamos começar com Café Filho, um político progressista de origem
nordestina. Vice de Getúlio Vargas, Café Filho se envolveu na conspiração
udenista para afastar Vargas do poder. Conspiração que resultou no suicídio de
Vargas, gerando uma crise política talvez sem precedentes no país. Getúlio
Vargas “deixou a vida para entrar na
História”. Para muitos brasileiros uma das maiores expressões políticas do
século passado. O vice Café Filho assume, e logo em seguida é deposto. O
presidente da Câmara, Carlos Luz, dirige interinamente o país, até a eleição do
novo presidente. Café Filho foi devidamente esquecido, passando a ocupar os
desvãos da História.
Em
sequência, ocorre a eleição de Juscelino Kubitschek, tendo como vice João
Goulart, o líder trabalhista Jango. Após algumas tentativas desastradas de
golpes de estado, o Brasil retoma um ritmo de paz e desenvolvimento, o qual
caracterizou o período JK. Este mantinha uma convivência correta com o seu
vice. JK é sucedido pelo ex-governador de São Paulo, Jânio Quadros, tendo como
símbolo de sua campanha uma vassoura, para “varrer a corrupção do país”. Seu
vice, eleito separadamente de JQ, era, novamente, Jango. Os dois se toleravam.
Em
agosto de 1961, após sete meses de um governo instável e sinuoso, para surpresa
de todos, JQ decide renunciar. Atitude cujos verdadeiros motivos, ainda hoje,
são incertos.
Os
ministros militares vetam a posse de Jango, abrindo uma séria crise
político-institucional. Jango somente pode assumir como presidente de um regime
parlamentarista. Tempos depois recupera seus poderes presidencialistas, sendo
deposto por um golpe de estado em 1964.
No
início do período da redemocratização, pós - governos militares - em 1985, o
presidente eleito no Colégio Eleitoral, Tancredo Neves, morre às vésperas da
sua posse, sendo substituído pelo seu vice, José Sarney. O qual consegue fazer,
com êxito, a transição para a Democracia.
Na
primeira eleição direta do período democrático, é eleito o ex-governador de
Alagoas, Fernando Collor, tendo como vice-presidente Itamar Franco. Novamente,
um outro presidente não consegue completar o seu mandato. Collor, o Caçador de
Marajás, é afastado pelo Congresso Nacional. Itamar, que não participara das
tratativas para o impedimento de Collor, assume e faz um governo curto, porém
marcante: controla a inflação e institui uma moeda sólida, o real. Colocando o
Brasil numa nova perspectiva política e econômica. Fez um grande governo.
O
governo seguinte Fernando Henrique Cardoso, presidente e o pernambucano de alta
estirpe política, Marco Maciel, como vice-presidente, comandam o país por dois
mandatos seguidos (1995/2002). E fecha o ciclo dos governos liberais. Sem
maiores turbulências na relação entre o presidente e o seu vice.
O ano
de 2003 começa com uma grande inovação na política: pela primeira vez, um
retirante nordestino, Luis Inácio Lula da Silva, de origem operária, líder
sindical, chega, pelo voto direto, à presidência da república. Seu vice, José Alencar, empresário mineiro, dá
inevitável conotação simbólica à chapa vitoriosa: representantes do
empresariado e da classe operária se unem para comandar o Brasil, por dois
mandatos (2003/2010). Implantando políticas progressistas e inclusivas.. Também
sem turbulências em sua gestão. José
Alencar, mineiro da melhor estirpe, se revela um político leal e correto.
Na
eleição seguinte ocorre a terceira vitória seguida da coalizão PT/PMDB. A
petista Dilma Roussef é eleita, tendo como vice o representante da elite
paulista, o político e advogado Michel Temer, um dos líderes do PMDB. Professor
universitário (de Direito Constitucional!) e ex-presidente da Câmara dos
Deputados.
Reinaugura-se
um novo período de turbulência e deslealdade nas relações presidente x vice.
3. QUANDO, MAIS UMA VEZ, O VICE CONSPIRA E
DECIDE TRAIR
Como
fazer para ressuscitar o projeto neoliberal, repudiado pelo eleitorado
brasileiro quatro vezes seguidas?
Simples:
implodindo a coalizão presidencialista e cooptando o vice para exercer a
presidência da república. Implantando, com todo o cinismo e desfaçatez
possíveis - e uma estranha pressa - o projeto derrotado seguidamente nas urnas.
Exemplo clássico de estelionato eleitoral.
Qual
o manual golpista a ser obedecido? Simples também: Washington recomenda, e já
está colocando em prática na América Latina, o “Manual do Golpe Suave”.
Descrito com maestria por Aldo Arantes, em seu novo livro “REFORMA POLÍTICA e
novo projeto para o país” (2).
Diz
Aldo Arantes: “no manual, intitulado “Da Ditadura à Democracia”, Gene Sharp (guardem esse nome) descreve
os passos para se alcançar a derrubada de governos, no atual modelo golpista:
1)
Promova
ações para gerar um clima de mal-estar social, com a colaboração da mídia;
2)
Faça
denúncias, fundadas ou não, para debilitar a base de apoio do governo e criar
um descontentamento social crescente;
3)
Promova
luta de rua, com reivindicações políticas e sociais que se confrontem com o
governo;
4)
Combine
diversas formas de luta para criar um clima de ingovernabilidade;
5) Se for necessária a fratura institucional,
realizá-la com base em manifestações de rua e ocupação de instituições
públicas, pronunciamentos militares até a renúncia do presidente.
Fica evidente a necessidade de apoio de
outras instituições para o êxito completo do “Golpe Brando”, na tomada do Poder
Executivo: Judiciário, Legislativo e a Mídia são elos fundamentais da corrente
golpista.
Creio
não ser necessário “desenhar” para que o processo empregado no Brasil se torne
mais evidente para todos nós.
A
adesão do vice-presidente ao esquema foi essencial para dar características de
“ legalidade” à tomada do poder, tornando desnecessária qualquer tipo de
consulta popular.
Como dizem os jornalistas que fazem uma
comunicação honesta e baseada em fatos: o que faz um professor de Direito
Constitucional aderir a um esquema tão perverso e tão estúpido em seus
fundamentos?
O professor Michel deve estar convencido que
o povo brasileiro forma uma “Confraria de Tolos”. Não passam de beócios, fáceis
de enganar. Acreditam, portanto, que as medidas suicidas do “novo governo” são
corretas e salvadoras. Que vai assistir quieto e passivo ao assalto às riquezas
do país, aos direitos trabalhistas, ao estado de direito, às liberdades
públicas. E que, tão tolo é, que estaria disposto a pagar para ter direito a um
emprego. Enfim, pagar para trabalhar. Aposentadoria? Nem pensar.
Deverá acompanhar, quem sabe com aplausos e
entusiasmo cívico, a rápida destruição do seu país. Finalmente, transformado
numa nação vira-lata. Sonho neoliberal.
Pois muito se engana o pobre professor
Michel. Como diz a sabedoria coletiva, o povo não é bobo. Sobretudo diante de
tanta tolice de asnos neoliberais que se imaginam raposas, como afirmou Mino
Carta.
Não é bem assim que as coisas funcionam. A
História há de lhe cobrar explicações, professor.
POBRE
MICHEL.
Ficará na vala comum em que se acotovelam
Calabar, Silvério do Reis e outros traidores da Pátria. O povo brasileiro não
lhe concederá perdão ou descanso. Como afirmou um militar brasileiro de alta
patente e sabedoria: “a História não
fala bem dos traidores”.
(*) Do Instituto Lampião – Reflexões e
Debates sobre a Conjuntura
1) Hanna
Arendt – in “Origens do Totalitarismo” – Ed. Companhia de Bolso – SP / 2015
2) Aldo
Arantes – in “Reforma Política e Novo Projeto para o País” – Ed. Livraria Anita
- SP / 2016
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Minha observação: O artigo, escrito por respeitável cidadão conta a verdade das conspirações. A única observação em relação a Temer é que a tomada do poder não pode ser considerada "golpe" pois prevista na Constituição Federal, embora seja uma ruptura da normalidade democrática consentida pelas leis. O Vice, hoje Presidente realmente conspirou contra a própria chapa que o elegeu, mesmo que a Titular tenha cometido deslizes dos quais o Vice, de certa forma participou. Aguarda-se o pronunciamento do TSE e anseia-se por eleições diretas. Mas, vamos garimpar algum nome nessa tormenta de caráter que assola o Brasil, que mereça o nosso voto!
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