Desintoxicar-se
e desapaixonar-se
Padre João
Medeiros Filho
Após o primeiro turno das eleições, vamos dar uma chance à paz, desarmar
os corações e serenar os espíritos. Urge desintoxicar-se e desapaixonar-se.
Cristo pregou no Sermão da Montanha: “Bem-aventurados os mansos, pois eles
herdarão a terra” (Mt 5, 9). Não esqueçamos que somos todos brasileiros e
irmãos (para quem professa o cristianismo). As eleições devem ser concebidas
como espaço da democracia. É assim que se precisa entender. Vivemos dias
e semanas apreensivos, num clima raivoso, de intimidação, desconstrução de
pessoas, radicalismo e agressões. Não é justo nem salutar quebrar os laços
familiares e de amizade, dividindo o nosso lar, odiando nosso próprio sangue
por conta de política. Podemos ser adversários, mas nunca inimigos. É
necessário que assim ajam as pessoas civilizadas e cristãs. O ódio não faz bem,
por isso foi condenado pelo Mestre da Galileia. “Fazei o bem aos que vos
odeiam. Abençoai os que vos amaldiçoam. Orai pelos que vos caluniam (Lc 6,
27-28). Durante a campanha, sofismas e mentiras confundiram, desorientaram,
desvirtuaram fatos e enlamearam pessoas.
Como fazer cessar a aversão e
a ira, o desrespeito vil e a agressividade?
Primeiramente, é preciso desarmar os corações. Somos efêmeros,
peregrinos na vida, “cidadãos de uma outra pátria” (Fl 3, 20). E para fazer
esta experiência é necessário envolver-se e conviver. O que nos une, supera
aquilo que nos separa. Somos participantes de uma mesma natureza, temos
problemas idênticos ou semelhantes, dificuldades análogas, pertencemos a uma só
família. Deus nos dá a chance de nos realizar juntos, apesar de nossas
limitações e pecados. Saibamos compreender e perdoar. “Ninguém é perfeito no
país dos homens”, afirmava o Pequeno Príncipe. Ou como proclama com mais
precisão o Evangelho: “Quem dentre vós não tiver pecado, atire a primeira
pedra” (Jo 8, 7).
Durante a campanha eleitoral,
talvez tenhamos caído na armadilha de alguns, que em vez de unir, nos
polarizaram. Em lugar de agregar, nos tornaram inimigos, desejando que
eliminássemos com violência e rapidez os rivais. Esqueceram que precisamos de
todos para superar e sair das ruínas, juntar os cacos deixados pela pandemia e
outras desgraças que possam nos ter atingido. Importa desintoxicar-se de tanta
coisa que veicularam as redes sociais e a mídia. Vamos nos voltar para as
nossas tradições de povo pacífico, generoso, hospitaleiro e fraterno. As
campanhas passam. O poder não é eterno. Lembremo-nos da imagem de Cristo do
Corcovado, plantado como símbolo e ícone de nossa hospitalidade e do
acolhimento cristão. Ele está de braços abertos para nos receber.
A filosofia ensina que o homem
é um ser inacabado. Necessita dos outros para se completar. Por isso, é preciso
aprender a dialogar, buscar convergências, transigir, unir e aproximar. É
ilusório pensar que o vencedor nas eleições só receberá os louros. Ele terá
diante de si antigos, novos e gigantescos desafios. Quem foi derrotado nas urnas, não pode fazer
uma oposição irresponsável e raivosa. Não sejamos egoístas, pensando tão
somente em nós, em nossos interesses e partidos. O Brasil vale mais que as
ideologias e suas concepções. É preciso ter em mente o futuro. A pátria não
pertence apenas aos que vivem agora. Não há nenhuma escritura passada em
cartório de que grupos, pessoas ou partidos são proprietários desta rica e
querida Terra de Santa Cruz. Vencedores e vencidos precisam estar conscientes
de que o Brasil é de todos!
É hora de pensar alto e
grande, como fazem os verdadeiros políticos, estadistas e pacifistas da
história. Sigamos os ensinamentos de São Francisco de Assis: “Senhor, fazei de
mim instrumento de vossa paz. Onde houver ódio, que eu leve o amor”. Nossa
pátria precisa de serenidade. O Brasil é um país cristão. Jesus não veio incendiar o mundo com rancor e
violência. Pregou e ensinou o amor. “Nisto conhecerão que sois os meus
discípulos, se tiverdes amor uns para com os outros” (Jo 13, 35). Que Deus nos
conceda alegria, esperança e coragem, para trilharmos juntos um caminho de
união, justiça, paz e solidariedade. E que o Senhor esteja sempre no meio de
nós. Meditemos as palavras do salmista: “Vede como é bom e agradável os irmãos
viverem unidos” (Sl 133/132, 1).
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