CASCUDO
& LOBATO
Diogenes da Cunha Lima
Grandes amigos, eles mantiveram
correspondência por vinte anos. Monteiro Lobato (1882 - 1948), então diretor da
“Revista do Brasil”, publicou os primeiros artigos de Câmara Cascudo (1898 - 1986)
sob os títulos de “Jesus Cristo no Sertão” (1921) e
“O Aboiador” (1923).
Esses artigos publicados liquidam a
lenda de que o mestre potiguar se dedicou à ciência do folclore inspirado por
Mário de Andrade. Provam a vocação cascudiana para a cultura popular e a
valorização da paisagem sertaneja do Nordeste.
Já então, ele registra a sua tendência
ao estudo de expressão regional: o aboio com o canto sem palavras. Lembra
também a maestria de Joaquim do Riachão, que era o melhor aboiador das
cercanias. Por outro lado, sinaliza o que chamou, depois, de a
continuidade dos milênios, demonstrando a presença da aproximação da
mitologia grega com a do sertão.
Sob
diferentes concepções, mas próximas, os dois escreveram sobre temas semelhantes,
como “O Saci Pererê”, personagem viva na memória popular, e “Hans Staden”, como
herói. Lobato apresenta o alemão em suas aventuras em história infantil, “Dona
Benta conta a Pedrinho” e “Narizinho as suas Peripécias”. O Mestre de Natal registra
em “Antologia do Folclore Brasileiro” a sua empolgante narrativa histórica.
Ambos
foram pré-modernistas, na temática brasileira e na inovação estilística, ainda
que Lobato, conservador, desdenhasse de ícones da Semana de Arte Moderna: Anita
Malfatti que teria produzido arte anormal, fruto de paranoia e mistificação.
O natalense enalteceu o Modernismo Brasileiro em que fez grandes amigos, ao
mesmo tempo que dignificava a linguagem popular. O paulista criou palavras que
se incorporaram à fala brasileira, como o “Jeca”, personagem que demonstra a
preguiçosa incapacidade de caipiras no livro de contos “Urupês”, e até mesmo usou,
pela primeira vez, três sinais de exclamação para dar ênfase ao que dizia.
Muita gente passou a imitá-lo. Em Natal, o sábio juiz federal Magnus Delgado,
para mandar arquivar um processo interminável, a fim de que nada lhe
acrescentem, pediu até “pelas caridades”.
Por
costumeira gentileza da pesquisadora, dirigente do Instituto Ludovicus, Daliana
Cascudo, tomei conhecimento de uma carta datada de 1939, de Lobato ao seu
amigo. Nela, dirige-se ao Velho Amigo reclamando não ter sido por ele
visitado quando esteve em São Paulo. Registra que “a vida nos junta” e que além
de um amigo se trata de um Cascudo, menos cascudo do que você na arte e na
amizade.
A
correspondência de amizade poderia não tratar de assunto nenhum, apenas de
afeição. O missivista, que não tolerava a ditadura, termina a mensagem com
votos para que o Estado Novo lhe seja leve.
Ler
e aprender com a leveza de Cascudo e Lobato é dever nacional!!!
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