sábado, 16 de julho de 2016

O SIMPLESMENTE CARTOLA II


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Por: BERILO DE CASTRO, médico e escritor


O nome de Cartola passou a ser muito conhecido e reverenciado no meio musical quando gravou outros sambas para Francisco Alves e Mário Reis, como: “Perdão, meu perdão". Com o poeta da Vila Izabel, Noel Rosa, compôs “Tenho um novo amor”, interpretada por Carmem Miranda. E  com Sílvio Caldas: “Na Floresta”; além de muitos e muitos outros sucessos.
Em princípios de 1934, o sambista passou a gravar exclusivamente para a sua escola, quando vários dos seus sambas-enredo receberam premiações em desfiles de carnaval; deixou de lado assim o seu  círculo artístico e a sua produção discográfica.
Em meados da década de 1940, Cartola participava pouco no cenário musical. Não se via mais tão ligado e envolvido com a sua escola de samba Estação Primeira de Mangueira. Seus sambas passaram a ser desqualificados quando do julgamento para escolha dos  sambas-enredo para o carnaval. Este período coincidiu com um quadro mórbido de meningite, quando passou três dias em estado de coma e um ano andando de muleta. Pouco tempo depois, perdeu a sua dedicada e fiel companheira Deolinda, vítima de um ataque cardíaco.
Surgiu na sua vida uma nova companheira, Donária; foi uma paixão destrutiva, que tornou a sua vida um “inferno”, a ponto de deixar o morro e o violão. Foi morar no bairro do Caju, passando a viver de biscates: lavar carro, pintura de parede e vigia.  Sem notícias há mais de sete anos, os amigos chegaram a imaginar a sua morte, inclusive a homenageá-lo em letras de sambas.
No ano de 1957, quando trabalhava como vigia de um edifício no bairro de Ipanema, foi reconhecido pelo jornalista Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta), que, vendo o famoso compositor magro e maltrapilho, decidiu ajudá-lo, começando por divulgar a redescoberta do sambista.
O reencontro com o jornalista foi vital e definitivo para sua  retomada como músico e compositor. Nesse ínterim, entra em cena mais uma mulher em sua vida: Euzébia Silva do Nascimento, mais conhecida como Dona Zica, sua antiga admiradora e que já o conhecia desde criança. Ela passou a cuidar com carinho do seu novo companheiro, que se encontrava em estado de penúria, apresentando uma afecção no nariz: rinofima (doença do nariz que se caracteriza por um aspecto inchado, bulboso e grosseiro, e por uma infiltração granulomatosa); tempos depois foi submetido à cirurgia estética pelo famoso cirurgião plástico Ivo Pitangui.                                                                 
Zica o levou de volta para o morro da Mangueira, onde foi morar próximo da casa de Carlos Cachaça e Menina, irmã de Zica.
No ano de 1963, Zica (exímia cozinheira) e Cartola (nato sambista), incentivados por amigos, criaram  o restaurante Zicartola, uma mistura de música-comida na rua da Carioca, 53, onde se  reunia a nata do samba carioca, além de poetas-letristas como Hermínio Bello de Carvalho, jornalistas musicais como Sérgio Cabral; além de nomes como Nelson Cavaquinho, Zé Keti, Élton Medeiros, Paulinho da Viola, e cantoras como Elizeth Cardoso, Nara Leão e outros do mesmo calibre.
A boa e envolvente mistura música-comida (Zicartola) funcionou somente dois anos (1963-1965), quando faltou literalmente o ingrediente principal: o tino comercial, assim sendo, o dinheiro não entrava na mistura (e não podia dar liga).
Em 1964, Cartola e Zica se unem matrimonialmente; dez anos depois, antes de completar sessenta e seis anos, ele grava o seu primeiro disco solo, onde reuniu: “Acontece”, “Tive sim”, “Disfarça e Chora”, “O Sol Nascerá”, “Alvorada”, “Quem me vê sorrindo” (parceria com Carlos Cachaça), uma apoteose!
Em 1974, em programa especial para a Rádio Jornal do Brasil, apresentou dois sambas ainda inéditos: “As Rosas Não Falam” e “O Mundo é um Moinho”, grandes e inesquecíveis sucessos, com inúmeras e belas interpretações.
Em 1978, às vésperas de completar setenta anos, se afastou  do morro da Mangueira e foi morar em Jacarepaguá, buscando um pouco mais de tranquilidade e sossego. Já esboçava   um certo cansaço e se mostrava doente, quando foi  diagnosticado a sua enfermidade: um câncer na tireoide . Foi operado no mesmo ano (1978). Dois anos depois (1980), no dia 30 de novembro, aos 72 anos, faleceu. O  Brasil perdia naquele momento a sua figura maior do samba, o imortal, o divino, o iluminado compositor, que com uma formação escolar até o quarto ano primário conseguiu  escrever: “Bate outra vez/ Com esperanças o meu coração/ Pois já vai terminando o verão/ Enfim/ Volto ao jardim/ Com a certeza que devo chorar/ Pois bem sei que não queres voltar/ Para mim/ Queixo-me às rosas/ Mas que bobagem/ As rosas não falam/ Simplesmente as rosas exalam/ O perfume que roubam de ti, ai/ Devias vir/ Para ver os meus olhos tristonhos/ E, quem sabe, sonhavas meus sonhos/ Por fim”.                             

O “simplesmente” CARTOLA.

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