sexta-feira, 27 de novembro de 2015



O SUSTO

Violante Pimentel
Era um tradicional bar do Recife (PE), ponto de encontro de poetas e boêmios, em cuja parede principal se podia ler o belíssimo poema “CHOPP”, do grande poeta Carlos Pena Filho, que diz:
Na avenida Guararapes,
o Recife vai marchando. 
O bairro de Santo Antônio,
tanto se foi transformando
que, agora, às cinco da tarde,
mais se assemelha a um festim,
nas mesas do Bar Savoy,
o refrão tem sido assim:
São trinta copos de chopp,
são trinta homens sentados,
trezentos desejos presos,
trinta mil sonhos frustrados.
Ah, mas se a gente pudesse
fazer o que tem vontade:
espiar o banho de uma,
a outra amar pela metade
e daquela que é mais linda
quebrar a rija vaidade.
Mas como a gente não pode
fazer o que tem vontade,
o jeito é mudar a vida
num diabólico festim.
Por isso no Bar Savoy,
o refrão é sempre assim:
São trinta copos de chopp,
são trinta homens sentados,
trezentos desejos presos,
trinta mil sonhos frustrados.
Como o Bar Savoy ficava próximo a um conhecido Órgão de Saúde Pública, vários médicos se reuniam ali, depois do expediente, para trocar ideias e molhar a palavra. O ponto era muito frequentado por esses profissionais, adeptos de uma boa bebida e um ambiente requintado. Entre os frequentadores, havia alguns boêmios apaixonados, médicos ou não, que diariamente ali “assinavam o ponto”. Também havia os namoradores, os que tinham a alma livre e viviam apaixonados. Eram frequentadores tradicionais e de boa situação financeira.
Certa vez, num começo de noite, um cardiologista de meia idade, assíduo frequentador do Bar Savoy, foi incomodado por uma “mariposa”. A mulher viera lhe cobrar um dinheiro prometido numa farra. O profissional mandou, discretamente, que ela se retirasse daquele ambiente, mas a criatura insistiu em escandalizar. Falou alto, chamando a atenção dos frequentadores. O homem, então, pegou, bruscamente, a sua tradicional maleta de médico e gritou:
– Espere aí que você vai ter o que merece!!! – E fez menção de abrir a maleta, dando a impressão de que iria sacar uma arma. A mulher saiu correndo, e meia hora depois retornou, acompanhada de dois policiais, que exigiram que o médico lhes entregasse a tal arma. A mulher insistia em dizer que a mesma estava dentro daquela maleta de médico. Além de exigir que o médico lhes entregasse a arma, os policiais o convidaram a acompanhá-los até a Delegacia de Polícia, no carro da Rádio Patrulha. .
Calmamente, o médico entregou sua inseparável maleta aos policiais, para que os mesmos apreendessem a questionada arma.
Um dos policiais abriu a maleta do médico, mas ficou desapontado, ao verificar que ali estavam apenas um Aparelho de Medir Pressão Arterial, um Estetoscópio, um Termômetro, e nada mais.
De imediato, todos os amigos se aproximaram do médico importunado. Os policiais logo entenderam que estavam diante de um cidadão de bem, um cardiologista de respeito, e que o mesmo não portava arma nenhuma. Com certeza, tinha havido um equívoco, e tudo era fruto da mente doentia daquela mulher destrambelhada.
A mulher foi conduzida até à Delegacia de Polícia no carro da Rádio Patrulha, e o conhecido médico continuou com os amigos no Bar Savoy, comendo, molhando a palavra, e se divertindo com o ocorrido.
Violante Pimentel – Procuradora aposentada e Escritora

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