Incendiar os corações!
“As palavras...
devemos fazer amor com elas. Os poetas sabem disso”. (Rubem Alves, filósofo
brasileiro)
(*) Rinaldo Barros
É
verdade. Tenho um caso de amor com a vida.
Acho
o mundo fascinante. Tenho olhos parecidos com os olhos de uma criança.
Acredito
que é fundamental ver o mundo com olhos de criança, como se o estivesse vendo
pela primeira vez. Na verdade, a gente sempre vê o mundo pela primeira
vez. O mundo se renova a cada dia.
O
mundo que vi há um segundo, não existe mais. Tudo se transforma
permanentemente.
Quero
aqui confessar que, nos meus tempos de ginásio, hoje ensino médio, e de
faculdade, minhas leituras nada tinham a ver com as obrigações escolares. Eram prazeres.
No
velho casarão, o Colégio Estadual de Pernambuco - onde somente fui aceito após
haver sido aprovado no Exame de Admissão - havia aulas de leitura: o professor
lia poemas para nós estudantes, por puro prazer. Não ia cair na prova. Nem no vestibular...nem
no Enem. Na escola pública, o ensino era de qualidade.
As
crianças, logo que aprendiam a ler, aprendiam também o prazer de consultar os dicionários.
Quantos estudantes consultam hoje os dicionários? Hoje, em que escola tem
letramento no currículo?
Aliás,
aprendi com o filósofo Rubem Alves que, ao retirar a imprecisão da linguagem
falada, os dicionários cometem um assassinato. Os dicionários não, os
gramáticos. Os gramáticos são os anatomistas da língua. Lidam com um corpo
morto. A língua, felizmente, é viva, no espaço e no tempo.
Quando
escrevo, brinco com a alma, tentando tocar a mente e o coração de quem me lê.
Por
isso, confesso também que continuo desconfiado do formato “técnico” do atual
Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), lançado pelo PT governo em 2007,
com “índices e metas qualificadas”.
Apresentado
como uma das grandes apostas do segundo mandato do presidente Lula, o Plano de
Desenvolvimento da Educação (PDE) poderia, de fato, atingir o seu objetivo e
ajudar a melhorar a educação no país. Mas, como sói acontecer no patropi, ainda
não saiu do papel. Nossas escolas não têm qualidade.
Contudo,
para que saísse do papel seria necessário superar uma série de desafios: desde redefinir
de onde serão retirados os bilhões que o governo prometeu (mas não cumpriu)
investir, até uma mudança de mentalidade, que inclui a “aceitação generalizada
de uma cultura de gestão baseada em indicadores e metas”.
A
propósito, o Orçamento federal de
2014 previsto para o Ministério da Educação, é de apenas R$ 42,2 bilhões, numa previsão de receita total de R$ 2,488 trilhões. Faça a conta. Na prática, a teoria é outra...
Não
consigo acreditar nessa possibilidade do PDE, acho muito técnica, sem alma. Sem
compromisso.
Temo
que essa gestão escorada apenas em indicadores e metas objetivas não seja
suficiente para acordar o patropi, entorpecido de miséria, exclusão e
banalização da vida.
Aprendi
que a vida humana não se define tecnicamente. Educar exige amor solidário.
Esse Plano
(PDE) trouxe o tema da avaliação para o centro do debate educacional, revelando
sua complexidade e ao mesmo tempo a necessidade de se ter em conta as múltiplas
facetas nele implicadas.
Temo que
as metas sejam cumpridas mecanicamente, apenas para “mostrar serviço”. Temo o
resultado da fome crônica no cérebro de milhões. Temo que deficientes auditivos
ou disléxicos, por exemplo, sejam considerados, objetivamente, inaptos. Temo
que se aprofunde a exclusão. Não vou nem falar no crack.
Creio que está na hora de discutirmos também o papel da Universidade
no Brasil, por uma ciência pública voltada para o desenvolvimento, e contra a
ciência corporativa que privilegia o produtivismo, em detrimento do uso social
do conhecimento.
Dados preliminares do Mapa da Violência relativos a 2012
indicam que 56.337 pessoas foram assassinadas naquele ano em todo o país. É
maior do que em qualquer guerra ao redor do mundo, com alta de 7,9% sobre 2011.
Em 2013, deve ter-se agravado. O brasileiro enfrenta uma batalha diária que se
desenrola sob o olhar estranhamente desinteressado do governo federal. Que
fazer?
Somente
alcançaremos um efeito verdadeiramente transformador e sustentável na melhoria da
qualidade da vida e da educação se governantes, parlamentares, gestores,
professores, pais e alunos colocarem suas almas nesta luta, como se fora a
missão para a qual decidiram dedicar suas vidas. Estou convicto de
que somente um extraordinário movimento de reencantamento de toda a Nação será
capaz de incendiar
os corações para cumprir esse desafio.
É preciso pensar grande. É preciso inaugurar
uma Nova Era! Ousar sonhar!
É
preciso ter um Projeto de Nação, um caso de amor com o povo brasileiro. Com os olhos no futuro.
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