quarta-feira, 5 de março de 2014


O AMOR E A DOR

PADRE JOÃO MEDEIROS FILHO (pe.medeiros@hotmail.com)

O amor e a dor são inseparáveis na vida humana. Na dinâmica da existência desejamos ser compreendidos, perdoados e amados, mas isto não exclui o sofrimento. Porque amamos, podemos sentir a dor da traição, desconfiança, indiferença, solidão, distância, ingratidão e da própria morte. A perda ou partida de uma pessoa querida faz-nos sofrer. A dor é intrínseca à vida de quem ama. A cruz de Cristo é o resultado de seu afeto sem limites, seu perdão incomensurável, sua ternura e misericórdia infinitas e sem precedentes.

Nenhum ser humano ama verdadeiramente sem passar pela dor. Mas, na medida em que ela é aceita e compreendida, poderá ser suportada. “Só quem passa pelo fogo da dor, chega ao incêndio do amor e só quem se deixa queimar por este, saberá o que nos faz sofrer”, dissera Santo Agostinho. Quem ama, supera pequenos e grandes desencontros, com a força de recomeçar. A grande preocupação está em condenar quem errou e não em tentar compreender. E isto aumenta em muitos a tristeza e a decepção. “O que importa é a solução, e não o culpado”, afirmou o Papa Francisco. Jesus não procurava saber por que alguém pecou ou errou. Com gestos e palavras, ensinou a todos que o amor é inconsistente sem misericórdia e perdão.

Falando recentemente aos fiéis, na Praça de São Pedro, o Sumo Pontífice comentou: “Supomos ser justos e julgamos os outros. Julgamos até Deus, porque pensamos que deveria punir os pecadores, condenando-os à morte em vez de perdoar”. Agimos como o primogênito da parábola do filho pródigo. Em vez de se alegrar com a volta do irmão, foi atingido pela flecha do ciúme diante da acolhida do pai. Ali, Cristo quis nos dizer que o amor não é egoísta. E se assim o for, far-nos-á sofrer ainda mais.

O amor mais sincero, profundo, leal e desinteressado, não está isento de tristezas, lágrimas, angústias, decepções e até separações. Pode parecer paradoxal, mas a plenitude do amor de Cristo realizou-se na cruz. Na verdade, devemos nos conscientizar de que a dor, na sua essência, coroa o gesto de amar.

Cabe-nos refletir. O que aconteceu com aquele que amou sem medidas, acolheu os pecadores e fez refeição com eles? O que ocorreu com quem curou os doentes e restabeleceu os paralíticos, fez os surdos ouvirem e os cegos enxergarem? Como terminou a vida daquele que realizou tantos milagres, multiplicando pães para matar a fome da multidão? Como acabaram os dias de quem perdoou sempre, escutou, acolheu, incluiu, compreendeu, enxugou lágrimas e amainou a angústia de tantos? O seu fim foi a solidão, o abandono, a condenação e a morte. Quem ama verdadeiramente, sabe disso e tem consciência de que o sofrimento também é redentor. Foi o exemplo de Jesus de Nazaré, entregando-se totalmente, numa prova de afeição pelos homens, que hoje nos capacita a compreender que o amor exige renúncia e talvez nos traga provações e dores.

Amar consiste unicamente em doar-se. Poderá tornar-se frustrante, se não entendermos que tem como objetivo fazer o outro feliz. Se assim não for, sofreremos intensamente, pois o amor autêntico tem apenas o caminho de ida. Cristo deu-se todo, por inteiro, sem esperar nada em troca. Não raro, padecemos muito, quando esperamos e até exigimos retorno ou recompensa pelo amor. Ele é dádiva total, gratuito. Deus é amor (1Jo 4, 8), por isso entregou-nos seu Filho Unigênito, de forma absoluta e incondicional, sabendo que somos frágeis, ingratos, pecadores e incapazes de retribuir!

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