quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

O homem que queria ser preso

Elísio Augusto de Medeiros e Silva

Empresário, escritor e membro da AEILIJ
elisio@mercomix.com.br


Tudo começou com uma discussão besta de mesa de bar – por causa de times de futebol. Por causa dos efeitos da bebida, aos poucos, os ânimos foram se alterando. Bem que os amigos comuns tentaram apaziguar – em vão, eles não chegavam a um acordo.
Quando menos esperavam, Joãozinho deu um soco em Manuel, que, prontamente, reagiu à agressão. A confusão estava formada, e logo os dois engalfinhavam-se no chão do bar. Os amigos tentavam apartar a briga, mas sem sucesso. Para sorte ou azar dos dois antagonistas, uma viatura da polícia ia passando na ocasião, e os levou presos para a delegacia de plantão.
O delegado, diante do flagrante, não via outra providência senão lavrar o auto e os mandar recolher ao xadrez. Que vexame!
Os amigos logo chegaram à delegacia e tentavam, junto ao delegado, evitar a autuação, alegando que os dois eram pessoas de família, honestas, trabalhadoras, etc.
Diante dos argumentos, o delegado aquiesceu – afinal, tinha sido uma coisa boba, sem ferimentos, e até os dois brigões já se mostravam arrependidos da besteira.
Então, os dois foram colocados à frente da autoridade policial, que lhes comunicou da sua intenção de liberá-los.
- Atendendo aos pedidos de seus amigos, e como vocês tem bons antecedentes, vou liberá-los com a condição de que façam as pazes e acabem com essa besteira.
- Obrigado doutor, disse Joãozinho, estendendo a mão ao Manuel.
- Eu também faço as pazes, disse o Manuel. Mas quero continuar preso, complementou.
Todos se olharam estupefatos, inclusive o delegado.
- Você quer ficar preso, seu Manuel?
- Quero sim, seu delegado.
Bem, neste caso, terei que lavrar o auto que, naturalmente, envolve as duas partes.
- Mas eu não quero ficar preso, disse Joãozinho.
- Eu quero, disse Manuel. Devo pagar pelo mau comportamento na prisão.
Diante disso, não houve mais acordo e o auto de prisão foi lavrado pelo escrivão da delegacia.
Tentando resolver a situação, os amigos se prontificaram a pagar a fiança dos dois. Joãozinho ficou alegre, mas Manuel não aceitou, pois queria continuar preso e ficava repetindo: Quero ser transferido para a detenção!
A essa altura até o delegado, o escrivão, e outros policiais duvidavam das faculdades mentais do Manuel. Onde já se viu isso?! Nunca tinha ocorrido nada parecido antes na delegacia.
Depois de conversarem entre si, os amigos acharam por bem chamar a esposa de Manuel para tentar convencê-lo e fazê-lo mudar de ideia.
Ela veio. Mas, mesmo com muita argumentação e lágrimas, Manuel não mudou sua opinião. Pelo visto, ele queria mesmo era mofar alguns meses atrás das grades.
Aquela tarde foi agitada na delegacia, com amigos, parentes, todos tentando convencer Manuel a aceitar o pagamento da fiança. Até um psicólogo foi chamado pelos familiares.
Somente por volta das onze horas da noite, depois de ouvir conselhos e pedidos de uma porção de parentes e amigos, é que ele consentiu que fosse prestada fiança e liberado.

O difícil mesmo foi se livrar dos repórteres do jornal que aguardavam ansiosos na porta da delegacia. No dia seguinte, os jornais traziam na capa: “Homem se recusa a ser solto”.

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