quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

 

Cartas de Cotovelo – Verão de 2023 – 4

Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes

LEITURAS DE VERANEIO

Neste veraneio fragmentado os livros povoam as cercanias da minha rede e vou lendo até o sono, até ser forçado pela brisa da varanda me derrubando de corpo inteiro.

         Após o voo transcendental do sono, desperto com o volume caído sobre mim, convidando-me a continuar a leitura até outro surto de sonolência, o que me faz repetir a mesma página um punhado de vezes.

         Obras sobre genealogia potiguar é sempre do meu agrado, mas os preferidos são os aleatórios – prosa, poesia, ficções, reflexões e por assim continuar.

         Destaco alguns trabalhos que ficam empilhados na cabeceira para eventuais consultas rápidas, tais como Reflexões de um Provinciano (Caio Flávio Fernandes); 100 frases & Pensamentos (Juarez Chagas); Epigramas de Nino (Vicente Serejo); e Novos Poemas Dedicados (Francisco Ivan) - um dos quais, com justiça, em homenagem a Abimael Silva.

         No mais, os enigmas de Francisco Sobreira (Uma noite linda – Mas para quem?), tive de fazer uma segunda leitura para destrinchar a trama da morte de Romeu Aldigheri, a presença do forasteiro Douglas e o mistério da viúva Louise com a jovem Susana; as pequenas histórias de Honório de Medeiros (De uma longa e áspera caminhada); A bela narrativa do Sapo de Pedra e a Magia do Feiticeiro (Raimundo Inácio) e, por fim, temporariamente, Da Caverna à luz, de André Paganelli.

         Desse punhado de livros, atrevo-me a fazer deduções lúdicas, telúricas ou realistas? Nem sei o que! Mas sempre me encontro com A República de Platão, em sua parte sobre o Mistério da Caverna.

         A Caverna de Platão sempre está presente em variadas coisas do cotidiano – seja nas questões ideológicas políticas, na literatura, na própria existência. Explico:

I – Quando nos fechamos na interpretação das ideologias, de maneira hermética, temos a impressão apenas do que se encontra fechada naquele conteúdo teórico, fazendo juízo de valor destorcido das coisas do mundo, até que elas recebam a luz da realidade fática, daí saírem os seus intérpretes fundamentalistas ou existencialistas.

II – Na literatura, alguns se enclausuram nas suas leituras individualistas, sem o clareamento da luz e transmitem seus conhecimentos, muitas vezes abundantes, em escritos ininteligíveis porque numa linguagem que não chega aos demais viventes, tornando-se, assim, o homem, ou melhor, a criatura da caverna, conhecedor de uma realidade sem luz, sem alcance fora das sombras das paredes iluminadas pela fogueira;

III – A existência carece de conhecimento, eruditos ou populares, mas integralmente compreensíveis no cotidiano, sem a vaidade (que é uma caverna) de apenas enaltecer a si próprio, empurrando de goela abaixo publicações que, de tão pesadas, não permitem acesso à plebe rude.

         Graças ao Criador, nunca passei pela Caverna, pois tenho a certeza de que, sem erudição, consigo penetrar o coração dos meus poucos leitores, trazendo-lhes lembranças, saudades e experiência.

         Fico gratificado quando alguém informa que gostou da minha prosa. E espero que não seja só por gentileza. (O elogio gratuito é outra caverna). O silêncio tem luz própria.

Esse é o motivo da minha possível imortalidade e não a pompa de vestes acadêmicas, a pose de intelectual ou a empáfia da sabedoria – que não tenho. Tomando por empréstimo dito do Professor Mário Porto – o que interessa é o amor do meu semelhante e a salvação da minha alma.

         Como faz bem o mar, a luz e a brisa – eles nos indicam a nossa finitude, a nossa mortalidade, a humanidade de ser e até a falta de lucidez ao escrever esses mal traçado textos.

3 comentários:

  1. Como faz bem o mar, a brisa, os textos de Carlos Roberto de Miranda Gomes e o agradecimento a Deus por tê-lo como amigo. Conviver com o nobre confrade só diminue a minha ignorância!

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  2. Que texto bom professor. Grato pela oportunidade de acessá-lo por aqui.

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  3. Os bons livros nos dão sempre uma excelente oportunidade de irmos em épocas e lugares diferentes. Desejo-lhe ótimo veraneio.

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