segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

A PAQUERA

 

Valério Mesquita*

mesquita.valerio@gmail.com

 

Lá pela metade dos anos 70, o Rio Grande do Norte vivia um período pré-eleitoral. Entra em cena o velho e tradicional município de Patu com a sua política extremada que não diferia dos demais da região oeste. Ali pontificava uma liderança emergente representada no universitário de Farmácia João Ismar de Moura. Atritos e divergências entre partidários com a parcialidade da política eram comuns. Certa vez, um primo do nosso João foi agredido por um soldado. Avisado do fato o jovem político veio em defesa do parente. E recorreu ao deputado federal Vingt Rosado em Mossoró, para mandar tirar a farda do militar.

O líder mossoroense, como de costume, atendeu ao correligionário e passou a diligenciar os procedimentos. Enquanto isso, em Patu, João se sentia perseguido pelo soldado que acompanhava os seus passos a todos os lugares públicos da cidade. Temendo uma iminente agressão do praça e conhecendo muitos exemplos acontecidos ali mesmo e adjacências, recorreu a um amigo comum e ex-prefeito de Natal Jorge Ivan Cascudo Rodrigues, bastante ligado ao então secretário de segurança. “Jorge Ivan, esse rapaz se põe em pé, diante de mim, aonde eu chego e estou temendo já ser fuzilado”, queixou-se. Preocupado com a ansiedade e temor levou o problema diretamente ao coronel João Pinheiro da Veiga para receber o acadêmico e líder patuense.

Em Natal, na sede da SSP, João foi recebido em audiência. O ambiente era tenso, pois se temia uma violência presumível ante qualquer providência que se tomasse contra o militar agressor. Isto posto, inicia-se o diálogo. O coronel Veiga pedia detalhes para ajuizar melhor na decisão. “Mas, quando o senhor se encontra em lugares públicos, restaurantes, bares, farmácias, lojas, o soldado assume alguma atitude hostil, faz gestos ameaçadores ou o que ele lhe dirige?”, pergunta o secretário de segurança já curioso. João Ismar de Moura fez silêncio e sublinhou: “Olhares”. Risos. Salomonicamente, Veiga transferiu o soldado de Patu para Mossoró a fim de acabar com as suspeitas. Meses depois, João Ismar em Mossoró se encontra com o mesmo soldado. Reviveu temores antigos mas o gelo foi quebrado. O militar se dirigiu a ele e falou franco: “Doutor João, não queira saber o favor que o senhor me fez, arranjando a minha transferência aqui para Mossoró. Tô muito feliz com a minha família”. João deixou escorrer pelo abdômen e entrepernas aquele suor frio mas gostoso e pleno de alívio.

 

(*) Escritor.

 


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