sábado, 3 de julho de 2021


 

Doutor Ernani Rosado, o bisturi da memória

* 1934

+ 2016

 Por: BERILO DE CASTRO

No dia 1º de dezembro de 1934, nasceu,  na cidade de Mossoró, a capital do Oeste Potiguar, Carlos Ernani Rosado Soares (Doutor  Ernani). Filho de Manoel Messias Soares e Maria de Melo Rosado Soares, conhecida na intimidade por  Nelita. Ele, funcionário da Caixa de Aposentadoria e Pensões dos Operários da Estiva (CAPOE) e ela, do lar. O ofício obrigou a família a enfrentar e se habituar a muitas transferências para as cidades portuárias das regiões Norte e Nordeste do Brasil, como: Areia Branca-RN, Cabedelo-PB, São Luiz-MA, Belém-PA, Manaus-AM, Fortaleza-CE, Recife-PE e Maceió-AL.

Iniciou seus primeiros estudos, curso primário, em Natal, no Ginásio Rui Barbosa,  e terminou em Manaus, no Colégio Dom Bosco; o curso ginasial, em Belém do Pará, no Colégio Moderno, e concluíu em Fortaleza, no Colégio Castelo Branco; fez o curso científico, inicialmente, em Fortaleza e terminou  em Recife, no Colégio Nóbrega.

No ano de 1952, foi aprovado em primeiro lugar para o vestibular de medicina na Universidade do Recife, concluindo o curso no ano de 1957, com uma ressalva: aprovado por média em trinta e uma das trinta e quatro disciplinas do currículo. Foi escolhido pelos colegas para ser o orador da turma.

No início do ano de 1958, com a inscrição do Conselho Regional de Medicina (CRM-RN) de número 67, iniciou sua atividade profissional em Natal. Dois anos depois (1959), foi convidado, pelo Professor Clóvis Travassos Sarinho, para lecionar como assistente da cadeira de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da Faculdade de Medicina de Natal, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), recém-criada.

Em 1975, foi aprovado no concurso para exercer a função de cirurgião geral do Departamento Administrativo do Serviço Publica (DASP). Em 1978, exerceu a função de Coordenador Regional da Administração Médica do Instituto Nacional de Previdência Social (INAMPS) durante o período de 1978 a 1987.

Em 1979, com a aposentadoria do Professor Clóvis Sarinho, assumiu a chefia da Cadeira de Técnica Operatória.

Conheci o Professor Ernani Rosado no ano de 1964, quando fui aprovado para o curso de medicina, juntamente com o seu irmão, Roberto Rosado,  e o seu primo, Laire Rosado. Fizemos e construímos uma sólida e aprazível amizade. Frequentei a residência dos seus pais, na avenida Deodoro, próxima ao Colégio Marista, onde formamos um grupo de estudos; momento que aproveitava para compartilhar bons  papos com seu Messias, figura simpática, alegre e divertida, assim como apreciar dona Nelita tomar seu cálice de aperitivo para o almoço – o gostoso conhaque São Raphael. Vez por outra, recebíamos a visita simpática e alegre do  Doutor Ernani.

No ano de 1967, fui encontrá-lo nas salas de aulas, na cadeira de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental. Professor de uma simplicidade imensurável, sempre aberto ao diálogo, de uma gentileza ímpar, ávido para repassar seus vastos e qualificados conhecimentos ao alunato. Conviveu com muita naturalidade, simpatia e amizade com a nossa turma, o que motivou o grupo a escolhê-lo como homenageado quando da diplomação do curso.

Em 2012, quando iniciei e me lancei na literatura com  o meu primeiro livro “Do futebol à medicina”,  o escolhi para o prefaciá-lo. De pronto, atendeu  a minha solicitação, o que muito me enalteceu e honrou. 

Tínhamos algumas paixões em comum: o futebol, que o levou ao ar como locutor e comentarista  à cidade de Fortaleza, na Rádio Iracema; Flamenguista como eu, de coração preto e vermelho; a música, um conhecedor e admirador das boas músicas brasileiras e americanas; a medicina, um incansável, dedicado e competente executor da arte hipocrática e, na  literatura, um bom escriba, com artigos científicos publicados em revistas nacionais e internacionais; memorialista,  admirador e consumidor de bons livros.

De memória prodigiosa, foi um cinéfilo na expressão da palavra; na radiofonia potiguar, trabalhou na Rádio Poti; no ano de 1950, integrou a equipe de locução na campanha política vitoriosa de seu primo  Dix-Sept Rosado, ao governo do Rio Grande do Norte.

O Doutor Ernani Rosado ocupou posições de destaque na medicina local, nacional e internacional: foi Diretor do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN); Presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Norte (CRM-RN); Vice-presidente do Instituto de Proteção e Assistência à Infância do Rio Grande do Norte – Hospital Infantil Varela Santiago; Diretor do Hospital Professor Luiz Soares (Policlínica) de 1966 a 2001. Membro titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, Fellow International College of Surgeons; Membro fundador da Academia de Medicina do Rio Grande do Norte; Mestre do Capítulo do Rio Grande do Norte do Colégio Brasileiro de Cirurgiões; ocupante da cadeira número 2 da Academia Norte-Rio-grandense de Letras, cujo patrono é a escritora Nísia Floresta Brasileira Augusta.

Foi agraciado com várias homenagens: “ Amigo da Marinha”, pela Marinha do Brasil; “Medalha Santos Dumont”, pelo Ministério da Aeronáutica. Em 1988, recebeu,  do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, a Medalha de Honra ao Mérito pelos relevantes  serviços prestados à cirurgia brasileira; o título de Professor Honoris Causa da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), sendo um dos responsáveis pela implantação do curso de medicina em Mossoró-RN.

Falava e escrevia fluentemente inglês e francês. No ano de 1963, esteve no Karolinsk Sjukhuset, em Estocolmo, Suécia, como bolsista da Agência Sueca de Assistência Internacional. No ano de 1958, estagiou no Maine Medical Center, Portland, Maine-EUA. Fez parte do Comitê Diretivo da Aliança Francesa de Natal; foi Vice-presidente da Sociedade Cultural Brasil Estados Unidos; conquistou o Certificate of Proficiency in English for the University of Ann Arbor, Michigan-EUA, título que lhe permitiu ingressar na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da UFRN, onde obteve a licenciatura em Língua e Literatura Inglesa, no ano de 1965.

Como escritor, foi um admirado memorialista, deixou publicados: “A memória permanente” e “O tempo não passou”, no ano de 2002, editados pela Fundação Guimarães Duque, “Lembrando Máximo Medeiros Filho” (1982) e “Máximo Medeiros Filho – o cientista (1989).

Foi casado com Madalena Maria Galvão Soares e, dessa união,  tiveram dois filhos: Lorena e Herman.

O Doutor Ernani faleceu em Natal, no dia 8 de outubro de 2016, aos 82 anos, vítima de complicações decorrentes de um câncer renal. Seu corpo foi velado no Centro de Velório São José, no bairro de Lagoa Seca,  e sepultado no Cemitério de Nova  Descoberta.

Foi um dedicado operador com precisão cirúrgica;  mãos divinais sobre o campo operatório, desprovido de vaidades, cercado,  envolvido e iluminado em seus atos e ações por uma riqueza humana imensurável. Era assim, a figura do Doutor Ernani.

 

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