O PAX CLUBE E SEUS HABITANTES
Valério Mesquita*
O Pax Club de Macaíba
reinou durante várias gerações, desde o início dos anos cinquenta, construído
pelo prefeito Luís Cúrcio Marinho. A sua história merece um livro
separadamente, evocando fatos, personagens, eventos, tudo, enfim, que serviu
densamente para projetar a história social de Macaíba. A começar pelos nomes
zoológicos e folclóricos dos garçons: Luís Bicho Feio, Tota Passarinho, João
Cabeção, Antônio Paulino, Geraldo de Doca, os cobradores Vagareza, Chico
Duzentos e Paulo Bofão, entre outros, reverenciados com humor e saudade de um
tempo que não volta mais. Um fenômeno (econômico, talvez), que precisa ser
melhor estudado acabou com a vida social dos municípios de médio porte como
Ceará-Mirim, Macaíba, Caicó, Currais Novos, Açu, exceptuando-se apenas as
festas esporádicas das padroeiras, vaquejadas, que não significam realmente
atividade social clubística, efetivamente organizada. Até Natal mesmo sucumbiu
e o chamado “Café Society” que foi imortalizado pelos cronistas sociais do
passado e os sodalícios não existe mais. O tempo e os costumes mudaram tudo.
Ficaram para trás, para a história, Gil Braz, Fred Ayres, Jota Pifa e Paulo
Macedo, único sobrevivente, porque se reciclou e inovou a sua coluna. O imenso
Titanic, com todas as “very important persons”, naufragou com os capitães
Ibrahim Sued, Jachinto de Thormes, etc.
Que universo
multifacetário reside em um clube social que abriga frequentadores de todos os
matizes, boêmios e loucos, anjos e anarquistas, matrizes e meretrizes, mocinhos
e bandidos, palhaços e mascarados?
O velho Pax teve o seu
apogeu e decadência. Mas sobreviveu graças aos seus devotados diretores e
sócios, que se expuseram por um ideal ilusório de associação, sob a égide do
paletó e gravata, do bolero e do samba, da semipenumbra que escandalizava a
paróquia e alimentava a homilia dominical da santa missa. E os flashes desse
tempo me chegam nitidamente. Da jovem Carmita, míope, que, desfilando em
passarela na Festa das Flores, caminhou demais e foi cair sobre a mesa da
comissão julgadora; do carnaval de 60, onde a lança-perfume ardente e vibrante
de Plácido Saraiva atingia com jatos queimantes os bumbuns, suados e frondosos,
das damas da sociedade, quase registrando vitimas a lamentar; do senhor Emídio
Pereira, proferindo pontualíssimas palestras todos os anos sobre a poetisa Auta
de Souza e o aeronauta Augusto Severo, através do serviço de amplificadora diretamente
do “sodalício tradicional e elegante” da cidade; das confusões, das brigas, do
porre homérico de lança-perfume de Chiquinho Ribeiro, que o fez desabar no rio
Jundiaí; das festas juninas, quadrilhas estilizadas; do programa “Data querida”
que registrava aniversários e namoricos através do “serviço de divulgação da
Associação Pax Club, a voz de Macaíba”, e que tantos equívocos e problemas
acarretou, como o do motorista Zé Cearense, que quase apanhava da valente
mulher por causa de uma falsa “oferenda musical com muito amor e carinho”.
São mais de setenta anos
de história do Pax Club do Parque Governador José Varela. Há muita coisa a
contar sobre ele e os seus complexos habitantes. Relembrando agora, vai atiçar
a memória de muitos que direta ou indiretamente passaram pela sua portaria.
(*) Escritor.
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