segunda-feira, 25 de maio de 2020



O PAX CLUBE E SEUS HABITANTES

Valério Mesquita*

O Pax Club de Macaíba reinou durante várias gerações, desde o início dos anos cinquenta, construído pelo prefeito Luís Cúrcio Marinho. A sua história merece um livro separadamente, evocando fatos, personagens, eventos, tudo, enfim, que serviu densamente para projetar a história social de Macaíba. A começar pelos nomes zoológicos e folclóricos dos garçons: Luís Bicho Feio, Tota Passarinho, João Cabeção, Antônio Paulino, Geraldo de Doca, os cobradores Vagareza, Chico Duzentos e Paulo Bofão, entre outros, reverenciados com humor e saudade de um tempo que não volta mais. Um fenômeno (econômico, talvez), que precisa ser melhor estudado acabou com a vida social dos municípios de médio porte como Ceará-Mirim, Macaíba, Caicó, Currais Novos, Açu, exceptuando-se apenas as festas esporádicas das padroeiras, vaquejadas, que não significam realmente atividade social clubística, efetivamente organizada. Até Natal mesmo sucumbiu e o chamado “Café Society” que foi imortalizado pelos cronistas sociais do passado e os sodalícios não existe mais. O tempo e os costumes mudaram tudo. Ficaram para trás, para a história, Gil Braz, Fred Ayres, Jota Pifa e Paulo Macedo, único sobrevivente, porque se reciclou e inovou a sua coluna. O imenso Titanic, com todas as “very important persons”, naufragou com os capitães Ibrahim Sued, Jachinto de Thormes, etc.
Que universo multifacetário reside em um clube social que abriga frequentadores de todos os matizes, boêmios e loucos, anjos e anarquistas, matrizes e meretrizes, mocinhos e bandidos, palhaços e mascarados?
O velho Pax teve o seu apogeu e decadência. Mas sobreviveu graças aos seus devotados diretores e sócios, que se expuseram por um ideal ilusório de associação, sob a égide do paletó e gravata, do bolero e do samba, da semipenumbra que escandalizava a paróquia e alimentava a homilia dominical da santa missa. E os flashes desse tempo me chegam nitidamente. Da jovem Carmita, míope, que, desfilando em passarela na Festa das Flores, caminhou demais e foi cair sobre a mesa da comissão julgadora; do carnaval de 60, onde a lança-perfume ardente e vibrante de Plácido Saraiva atingia com jatos queimantes os bumbuns, suados e frondosos, das damas da sociedade, quase registrando vitimas a lamentar; do senhor Emídio Pereira, proferindo pontualíssimas palestras todos os anos sobre a poetisa Auta de Souza e o aeronauta Augusto Severo, através do serviço de amplificadora diretamente do “sodalício tradicional e elegante” da cidade; das confusões, das brigas, do porre homérico de lança-perfume de Chiquinho Ribeiro, que o fez desabar no rio Jundiaí; das festas juninas, quadrilhas estilizadas; do programa “Data querida” que registrava aniversários e namoricos através do “serviço de divulgação da Associação Pax Club, a voz de Macaíba”, e que tantos equívocos e problemas acarretou, como o do motorista Zé Cearense, que quase apanhava da valente mulher por causa de uma falsa “oferenda musical com muito amor e carinho”.
São mais de setenta anos de história do Pax Club do Parque Governador José Varela. Há muita coisa a contar sobre ele e os seus complexos habitantes. Relembrando agora, vai atiçar a memória de muitos que direta ou indiretamente passaram pela sua portaria.

(*) Escritor.

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