Ler, para saber
escrever
Tomislav R. Femenick – Jornalista
Por
motivos que agora não vêm ao caso, eu somente comecei a falar aos sete anos de
idade. Ao mesmo tempo comecei a ler e iniciei os meus primeiros passos na
escrita. Além dos tropeços de gramática, eu tinha outro problema: eu lia as
“palavras” e não as “silabas”. Isso é, para mim a escrita era figurativa e não
fonética. Quem corrigiu esse meu defeito foram os meus eternos gurus, Vingt-un
e América Rosado. Mas essa é outra história, a ser contada em outra
oportunidade, se a houver. O que importa agora é o fato de que eu fiquei com sequelas
e, consequentemente, falava e escrevia errado. Até desenvolvi um método para
que ninguém notasse meus erros: falava baixo e só escrevia com o dicionário à
mão.
Quando tinha doze anos, fui morar em
Alagoas e para lá levei as minhas deficiências linguísticas. Mas eu não poderia
continuar com esse carma. Um dia, um ano depois, entrei na redação do Jornal de Alagoas, órgão dos Diários
Associados, e pedi para falar com o Diretor. Fui recebido pelo mestre Otacílio
Colares. Aí se deu um diálogo surreal, como dizem meus alunos.
– Trouxe algum recado para mim?
– Não, senhor. Vim lhe pedir para
trabalhar no jornal.
– Mas nós não temos vaga de contínuo (na
época era assim que se chamavam os office-boys).
– Mas eu não quero trabalhar como contínuo.
Quero ser jornalista, repórter.
Otacílio olhou mas atentamente para mim,
um menino de treze anos, e fez-me a pergunta que eu temia:
– E você sabe escrever?
– Não, mas quero aprender aqui, onde
terei a obrigação de escrever todos os dias.
O jornalista, romancista e poeta não se
conteve e deu uma imensa e sonora gargalhada.
– E como é que eu vou lhe pagar, se você
não sabe nem escrever.
– Eu não disse que queria ganhar
dinheiro. Eu disse que queria trabalhar, escrever.
Em seguida ele me explicou que os
jornalistas deveriam saber mais do que simplesmente escrever; deveriam saber
“encontrar” as notícias e selecionar aquelas que eram de interesse público.
Depois de quase uma hora de conversa (para mim, a minha primeira aula teórica
de jornalismo), lançou-me um desafio. “Traga uma notícia, escreva-a em forma de
reportagem, sem se importar com os erros de concordância e ortográficos. Se for
um furo, eu lhe contrato como repórter, com salário regular”.
Sai da redação do Jornal, que ficava na
rua Boa Vista, e fui direto ao Palácio do Governo, ali perto, na Praça dos
Martírios, e pedi para falar com o governador Arnon de Melo (o pai de Fernando
Collor de Melo), dizendo ser do Jornal de Alagoas. Não demorou muito e fui
recebido. Contei-lhe a minha situação e que precisava de uma notícia para ser
contratado. Deu-me matérias suficientes para vários “furos” jornalísticos. Foi
assim que ganhei o meu primeiro emprego como repórter.
Escrever
foi uma doença que peguei ainda menino. O meu primeiro contágio foi através da
minha avó, leitora ávida de tudo que era jornal. O que me intrigava era que,
quando ela estava lendo, entrava numa espécie de transe, separava-se do mundo,
não ouvia e nem falava com ninguém. Aquilo me fascinava; quem escrevia para
jornal tinha o poder de encantar as pessoas.
Depois
foi um italiano, o doutor Pedro Ciarlini (pai de Augusto, meu colega), que me
perguntou o que eu gostaria de fazer. Lembrando-me da minha avó, respondi: escrever.
Então leia todos os livros que poder, foi a resposta dele. De lá para cá
escrevi bastante; 55 livros e meus artigos já saíram em mais de cem jornais e
revistas. Cheguei até a ser sócio-diretor de uma agência de notícias, a
Enterprise Press. Mas, renovar é preciso. Para me manter atualizado, também tenho
uma página na internet, a www.tomislav.com.br, que nos últimos cinco anos vêm
recebendo, em média, mais de um milhão de visitas, oriundas de mais de trinta
países.
Tribuna do Norte. Natal, 13 mar.
2020.
Nenhum comentário:
Postar um comentário