ISSO
NÃO SE FAZ, MICHEL
(Uma “Crítica Moral” ao presidente Temer)
Geniberto Paiva Campos (*) Brasília, dezembro,
2017
Sem qualquer anúncio prévio.
Sem nenhum aviso. Nem de última hora. Nenhum debate ou a mínima discussão.
Assim, o presidente em
exercício Michel Temer e seus parceiros jogaram o Brasil num abismo sem fim. Ao
assumir, ingenuamente, a teoria neoliberal, “ideologia disfarçada de ciência econômica”. (1)
Uma mentira. Uma fraude
insustentável, exceto para uma classe média cooptada e convertida por uma mídia
farsante e sem escrúpulos, que a transformou em crédulos militantes de uma
causa sem futuro: o Neoliberalismo.
O novo governo cumpre
fielmente as ordens dos seus patrões, os locais e os distantes, representantes
do mais retrógado e inviável sistema econômico, o qual somente sobrevive nas
mentes ultrapassadas da militância neoliberal.
Parecendo uma revanche
histórica.
Não satisfeitos com o
desmanche do Socialismo e da extinção da União Soviética, os ideólogos do
Capitalismo Rentista assumiram uma espécie de vingança: destruir o estado de
bem-estar social; apagar qualquer resquício de “socialismo”, e de cambulhada,
extinguir direitos trabalhistas e desmontar a previdência social. E fazer a
pronta entrega da Soberania Nacional.
Michel Temer e o seu Grupo
adotaram automaticamente essa estranha pauta, talvez sem avaliar suas
consequências, quando aplicaram o (suave) Golpe de Estado de 2016. Longamente urdido.
Tramado e executado com o apoio de forças externas.
O qual incluiu até a
“compra” de resultados de jogos da Copa do Mundo de Futebol de 2014. Aquele
estranho, inesquecível Alemanha 7 x 1 Brasil. A seleção brasileira estava impedida
de ganhar um novo título mundial de futebol. Para não interferir na eleição
presidencial. Não funcionou eleitoralmente. Mas ficou a imensa vergonha para os
que amam o Futebol.
Ao que parece, os novos
governantes estão convenientemente esquecidos de que nos últimos tempos, entre os
povos de todos os quadrantes do Mundo surgiu “uma crescente insistência de que o império da lei – ou pelo menos
padrões mínimos de decência humana – venha a governar os atos dos Estados,
assim como o de seus cidadãos.” (2)
Imaginando estar acima do
julgamento político – imediato e impiedoso - o qual já se faz perceptível,
bastando conferir as últimas pesquisas de opinião. Aliás, alguns partidos
apoiadores do Golpe estão, na prática, politicamente extintos.
Contando, ainda, com a
“memória curta” dos brasileiros para escapar do também impiedoso julgamento da
História.
Estaria, então, decretada a
completa “anestesia moral” no jogo político. Um vale-tudo que vai nos
conduzindo celeremente para desfechos imprevisíveis. Com a Política dominada
por atores desqualificados. Movidos tão somente por interesses subalternos.
Pior: arrastando o país para
o abismo sem fim da desigualdade e da injustiça. Destruindo valores
fundamentais da convivência humana. Criando um novo país de espertos e amorais.
Impondo, na prática a máxima
malufista da política, onde “feio é
perder”
Assumindo, claramente, a
política como a “arte da esperteza”.
Após quatro derrotas
seguidas nas eleições presidenciais, estava aberto um novo período, o vale tudo
para a reconquista do poder. Incluindo a compra de consciências (e do voto),
para naturalizar e legitimar a corrupção, o crime e as manobras ilegais, desde
que trouxessem os conservadores neoliberais de volta ao comando do país.
Utilizando cinicamente a
fraude e a mentira, com a certeza da impunidade, retomaram o poder. Sem a
necessidade de consulta aos eleitores.
E, imediatamente, teve início a rapinagem apressada
e cínica, “roubando o futuro e a
esperança dos brasileiros’. (3) Preparando o país para o desfrute dos 3%
mais ricos. Tornando-os mais ricos e arrogantes. Como se empurrassem o país
para um túnel escuro. Facilitando o assalto.
Michel Temer, na qualidade
de vice da presidente afastada, participou ativamente da conspiração. E com
pressa de assaltantes, o seu grupo de comparsas, sem o menor pudor, deu início
ao desmonte do país.
Embora pareça um pouco
precoce, algumas lições (morais e políticas) podem ser assimiladas deste espantoso
episódio.
- Como um professor de
direito constitucional alia-se a um esquema golpista de tal natureza? Eis uma
pergunta de difícil resposta.
- Como o vice Michel Temer
foi tão facilmente cooptado pelos agentes neoliberais, tornando-se um reles
traidor dos seus princípios e da sua Pátria?
Nessa perspectiva, vale
lembrar a saga de alguns vice-presidentes da história recente do país, que
vieram a assumir a presidência. O mais próximo do Temer seria Café Filho, o
qual sumiu na poeira do tempo, consumada a traição ao presidente Vargas.
Entretanto, o melhor exemplo
de comparação de figuras conhecidas da política brasileira com o presidente seria o ex-governador carioca Carlos Lacerda.
Lacerda foi uma das figuras
públicas mais inteligentes do país. Administrador capaz. Jornalista e orador brilhante, com grande
capacidade de convencimento. Pelos seus dotes inegáveis, esse quadro partidário
tipicamente udenista, exerceu forte influência na vida política do país, a
partir de década de 1950.
Teve intensa participação no
desfecho da crise que levou Getúlio Vargas ao suicídio, em 1954. Sua atuação foi,
também, decisiva na derrubada de João Goulart em 1964, com a instalação, por
mais de duas décadas do regime militar.
A partir desse ponto, Carlos
Lacerda entrou no seu labirinto pessoal. Talvez pela ausência de uma visão
estratégica coerente, cometeu pequenos e grandes equívocos políticos.
Imperdoáveis na vida pública.
Mudou de lado com frequência
inusitada: foi comunista na juventude; conservador e neofascista na vida
adulta; tentou voltar ao campo progressista logo nos primórdios do regime
militar, com a criação da natimorta “Frente Ampla”. Ações pessoais sinuosas que
resultaram na criação de uma imagem polêmica. Com perda da confiança de todos
os campos políticos por onde transitou.
Carlos Lacerda morreu aos 63
anos, de causas cardiovasculares. Segundo alguns testemunhos, deprimido a
alcoólatra. Jamais conseguindo realizar o sonho de se tornar presidente do
Brasil.
Um dos maiores políticos
brasileiros do século passado teve, portanto, uma trajetória polêmica e
conturbada. Traduzida numa conduta política ousada e sinuosa. Com escolhas erradas,
em horas incertas.
Seu exemplo deveria nortear
aqueles que seguem na vida política sem uma visão clara de objetivos e dos
meios disponíveis para alcançá-los. E dos limites morais permitidos, claramente
delineados na consciência de cada um.
Isso não se faz, Michel! Os
fins não justificam os meios.
A História não perdoa a
traição... E cobre de vergonha e opróbio os traidores.
(*) Do Coletivo Lampião
(1) Dani Rodrik in “Salvando a Economia do Neoliberalismo” –
2017, citado por Carta Capital, nº 980/ novembro 2017
(2) Gaddis, J.L in “História da Guerra Fria” – Ed. Nova
Fronteira, RJ, 2010
(3) Saul Leblon in Carta Maior – novembro, 2017
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