CIRO JOSÉ TAVARES, E POR QUE NÃO?
DO
AMOR
Ciro José Tavares.
Amo-te infatigável e
indefinidamente.
Amo cada fragmento do teu
corpo desolado.
Amo-te como amei
inesquecíveis putas brancas,
acolhido no calor do leito
de lençóis macios.
Amo-te como rios que beijam
margens e sem dizer adeus
passam sôfregos numa fuga
inconsolável,
ou como ventos outonais agitando árvores
e que veem nas ruas
sonolentas o esvoaçar das folhas secas.
Amo-te como amei dias
venturosos num tempo de loucuras.
Amo-te degradada, infeliz,
cristã, vazia sem ninguém.
Amo-te na pobreza e silêncio
inquietantes porque és pura e meu amor.
DE SOMBRAS
(Ciro José Tavares)
De onde está vindo o silêncio desses passos
despertando minha quietude debruçada na poesia?
Ergo-me para encontrá-los e somem enigmáticos.
Quem anda tão doce sobre a terra e como o sol
passa veloz pelas vidraças das janelas, até afugentando
pássaros que se recolhem sob estrela vespertina?
De onde chegam essas sombras parecidas
réstias de luas fugidias diante dos meus olhos?
Revela-te. Emerge do interior desse lusco-fusco,
e vem, anjo ou demônio num corpo de mulher .
São os teus receios que me abandonam no vazio?
Confessa sombra inalcançável o medo do amor.
Evola-se na escuridão a esperança de saber
quem realmente és, e porque me atormentas.
Fico no vazio, nas mãos apenas os meus livros.
Como sombras não regressam deixo –te minha ausência no poema.
O MANTO QUE ME AQUECE O CORAÇÃO
Ciro José Tavares
Aberto e estendido sobre os ombros o manto
da Academia Cearamirinense
de letras e Artes Pedro Simões
Neto,
dá-me a sensação de
orgulhosamente ostentar
um largo colar cravejado de
ouro e esmeraldas.
Agasalha-me de telúricas
lembranças,
o brilho do olhar deitado na
extensão verdejante dos canaviais
e o louro do sol acobertando
tetos e ladeiras da cidade.
É esse manto sagrado que me
queima, refulge e borda
entre as estrelas o imaculado azul da Virgem Padroeira.
CONSTRUÇÃO
Ciro
José Tavares
Estou
pela metade submerso no que resta
do
lusco-fusco da meia luz de velas que se extinguem.
No fundo das sombras os
renovados mistérios
farão emergir minha alma
para construir
a metade mais nobre e mesmo entardecido,
cego voltarei completo aos claros, outra vez.
Árvore do Fim do Mundo
Ciro
José Tavares
Finalmente
alcancei-te árvore do fim do mundo.
À
sombra entrego meu corpo mítico ao teu,
Abandonado
ao mau e ferido pelo tempo.
E
vejo a tentativa de podar os galhos nobres,
Os
que pendiam sobre os muros espalhando flores pelo chão.
Apesar
das dores não perdeste o cheiro antigo
E
o fruto nos meus lábios tem o sabor do néctar dos deuses.
Venho
de longe, navegante de Aiola,
Trazido
pelos ventos, para deitar fadigas na terra sagrada que te cerca.
Alcancei-te
e fico sob tua quietude árvore do fim do mundo,
Cabeça
acostada no regaço contemplando estrelas,
O
orvalho das manhãs caindo no meu rosto.
Fará
lembrar as lágrimas que a brisa vespertina
enxuga
antes que nos chegue a noite,árvore do fim do mundo.