domingo, 10 de novembro de 2013

Foto: Walter Craveiro

ARIANO POETA

Publicação: 03/11/13

Marcelo Navarro Ribeiro Dantas - Desembargador federal

Quando alguém fala em Ariano Suassuna é sempre com respeito e admiração quase devotos. Não precisa ser de Pernambuco, da Paraíba ou do Rio Grande do Norte, não. Não precisa ser do Nordeste, sequer. Nem precisa ser do Brasil. Um verdadeiro homem da renascença, dramaturgo, romancista, orador, professor, agitador cultural, o lider do Movimento Armorial, polimorfo em suas múltiplas produções, todas marcadas pela excelência e autenticidade.

Ariano é uma referência do nosso tempo e um orgulho do nosso País. Mas para mim há um aspecto de sua obra não digo desvalorizado, mas não tão apreciado quanto mereceria ser. O do Ariano poeta. Porque penso que ele é um dos maiores poetas vivos do país. O danado é que ele é tanta coisa que seu lado poeta finda sendo meio ofuscado.

Desde seus primeiros poemas revela-se o fulgor de seu estro. Como em Noturno: “Têm para mim Chamados de outro mundo/ as Noites perigosas e queimadas,/ quando a Lua aparece mais vermelha...” Ou Beira-mar: “Na Praia silenciosa/ a noite cavalga o vento...”

Depois, numa missiva em forma de poema, ele se autodefine como poeta de uma peculiar sinestesia. Em Carta: “Sou, além disso, um Poeta/ cujo verso enlouqueceu/ na Procura da beleza/...//Que posso fazer, Amigo?/ Só sei escrever assim:/ todo Azul é amarelo,/ todo Claro é duro e Ruim./ a Fruta Rubra apodrece,/ todo Sol negro amanhece,/ todo Começo é fim.

Ariano é poeta de recursos vastíssimos. Sabe escrever sonetos à moda de Gregório de Matos, como Ao Cristo Crucificado, inspirado por leitura de Santa Teresa d’Ávila, de que transcreverei apenas os quartetos para deixá-los com água na boca a procurar os tercetos que o enfeixam tão lindamente: “Se esse Céu, desejado e imerecido,/ for, Coroa de crimes resgatados,/ no termo de meus Dias fatigados,/ pelo Amor, à minh’alma concedido,// sei que este Amor, que é vosso e que, ferido,/ jaz em meu Peito, cego de pecados,/ excederá de muito os sons Alados/ dos Sonhos em que vivo suspendido.”

Canta uma variedade de temas, como a paixão, em A Uma Dama Transitória: “... E eu te quero como à Vida/ doce e cruel — sem Medida/ na sua Glória imperfeita.” E domina as formas mais distintas: sextilhas, décimas e odes, entre tantas outras. Esgrima versos brancos ou rimados com a mesma competência, e trabalha a métrica, ou a ausência dela, com rara felicidade.

Seus poemas mais conhecidos, talvez, são os Sonetos com Mote Alheio, dentre os quais se destaca aquele dedicado a seu pai: “Aqui morava um Rei, quando eu menino:/...// Mas mataram meu Pai. Desde esse dia,/ eu me vi como um Cego, sem meu Guia/ que se foi para o Sol, transfigurado.// Sua Efígie me queima. Eu sou a Presa,/ Ele, a Brasa que impele ao Fogo, acesa,/ Espada de ouro em Pasto ensanguentado.”

Há muito mais na obra poética de Ariano, que a meu ver precisa ser mais lida e estudada, tanto quanto seus romances e peças. Porque ela é tão rica e bela que, na minha opinião, se ele não tivesse feito mais nada — só esses poemas, já teria inscrito seu nome entre os Grandes da literatura brasileira.

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