ESTUDANTE
OU ALUNO?
PADRE
JOÃO MEDEIROS FILHO (pe.medeiros@hotmail.com)
O tempora, o mores! Como
nos faz falta o latim! Se, mesmo, outrora, fazendo parte dos componentes
curriculares das escolas, o poeta parnasiano exclamara: “A última flor do
Lácio, inculta e bela”, o que diria esse vate nos dias atuais? Indagado
sobre o significado da palavra inculta, empregada em seu soneto, respondeu
Bilac: “o termo fica por conta de todos aqueles que a
maltratam, mas que continua a ser bela”. Sem o ensino do latim nas instituições de ensino
fundamental e médio, atropelamos ainda mais o vernáculo.
Quantas vezes,
deparamo-nos com afirmações e fatos, partindo do modismo do “politicamente
correto”, sem base científica, que surgem do nada e de repente têm trânsito
livre nos campi universitários e até nas salas do Ministério da
Educação. Adotou-se agora a moda do vocábulo estudante em lugar de aluno. É um risco,
pois podemos transformar um sofisma em verdade, e, então consagrá-lo como certo
e convencer incautos neste assunto. Há um conceito distorcido, que vem sendo
divulgado inclusive entre professores e dirigentes educacionais. E diga-se, per
transennam, empregado e enfatizado por palestrantes e orientadores
pedagógicos. Trata-se da etimologia da palavra aluno.
A nova conotação vem ocupando
espaço, explicando que aluno significa "sem luz", pois a palavra é
formada pelo prefixo grego “a” (partícula de negação) e pelo elemento “lun”,
adulteração de lumen (luz em latim). E, por significar ausência dela, a
palavra seria depreciativa e antipedagógica. Para quem estudou latim, sabe
que as palavras em português provêm do acusativo, que integra a declinação
latina. Caso o étimo aluno derivasse de lumen, substantivo neutro, deveríamos
ter ad lumen (próximo da luz), como é a regra geral etimológica. Entretanto,
a palavra aluno deriva do latim: alumnus e já existia, antes de Cristo.
Tinha como significado primitivo criança de peito, que era nutrida, unida a sua
mãe. Daí, o sentido figurado de aluno ou discípulo, enquanto é alimentado, vinculado
a alguém. De acordo com o filólogo Ernesto Faria, (catedrático de latim da
antiga Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil), Cícero já
empregava alumnus, nas suas obras Verrinas e De finibus. Segundo renomados etimólogos, latinistas e
linguistas brasileiros, dentre os quais Antenor Nascentes, padre Auguste Magne,
S.J, Serafim da Silva Neto e outros, alumnus deriva do verbo alere:
alimentar, fazer crescer, desenvolver. Por analogia, tomou a acepção de
crescimento intelectual. É também nesse sentido usado por Cícero em: De
Natura Deorum e nas Catilinárias.
Seria de bom alvitre que
os leitores consultassem o verbete nos Dicionários da Língua Portuguesa
de Houaiss e Aurélio, no Dicionário Etimológico Nova Fronteira de A. G. Cunha,
nos dicionários da Real Academia Espanhola, Larousse etc. Não se pode aceitar
que em nome do “politicamente correto” desvirtue-se a semântica de uma palavra,
dando-lhe um sentido que não lhe cabe, banindo o seu uso. É aviltar e
empobrecer nosso idioma e a história da educação.
Convém por último
ressaltar que, na tradição, bem como nas culturas hebraica, grega, latina e
brasileira, aluno é sempre alguém que está inserido, ou seja, matriculado numa
instituição e vinculado a um mestre. Por isso, estão consagradas expressões
como: aluno do Ateneu, do Salesiano, da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, do curso de medicina, do professor
Otto Guerra etc. Data venia, não podemos aceitar uma conceituação equivocada
de aluno. Seria agredir os lexicógrafos e a língua pátria. Dom José Adelino
Dantas, de saudosa memória, exímio latinista, proferiu esta frase lapidar: “Sem
conhecimento do latim, podemos nos tornar apedeutas com certa pavonice".
Cabe-nos, por fim, dizer: “Foeci quod potui, potentes faciant meliora”. E,
já que não se estuda mais latim, procure-se a tradução no “doutor” Google, guru
virtual de muitos.
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