"DOSSIÊ MEGAEVENTOS" - (XXXII)
- Dra. Lúcia Capanema
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este dossiê fez um relato de graves violações aos direitos humanos associadas à promoção da Copa do Mundo 2014 e das Olimpíadas 2016. Infelizmente, somos
obrigados a confessar que este dossiê é meramente ilustrativo, e que, apesar da
gravidade dos fatos aqui narrados e dos esforços aqui investidos, estamos ainda muito longe de
termos sido exaustivos.
Não foi possível tratar das ameaças que pairam sobre crianças e
adolescentes de serem tomados como objeto de tráfico e abuso sexual, sobretudo
naquelas cidades onde estas práticas são costumeiras e podem se ampliar. Tampouco se
falou da violação dos direitos dos idosos, particularmente vulneráveis à remoção,
acompanhada quase inevitavelmente da ruptura de relações de vizinhança e laços de solidariedade e
sociabilidade, ruptura de que os mais velhos difi cilmente se recompõem.
Pouco dissemos sobre a multiplicação de ataques às populações de
rua, tanto da parte de particulares quando de autoridades teoricamente
responsáveis pela proteção dos cidadãos e de seus direitos. Tais ataques insuflam e ao mesmo
tempo se alimentam de uma ideologia de “higienização social” dos espaços públicos, que
governantes irresponsáveis pretendem legitimar em nome de uma suposta ordem pública que
afronta os valores da solidariedade social e do respeito pela dignidade humana.
Também deveríamos ter reunido e sistematizado informações sobre o
paradoxo constituído pelo paralelismo entre a extrema fragilidade das
políticas de difusão da prática do esporte entre nossa juventude, de um lado, e os maciços
investimentos no negócio esportivo, de outro lado. Aos favores e subsídios recebidos por
este se contrapõe a pobreza dos equipamentos esportivos e os baixos salários dos professores,
responsáveis por educar nossas crianças e por fazer delas cidadãos com mens sana in corpore sano. A privatização dos estádios construídos com recursos públicos expressa, por sua
vez, o desprezo oficial pelas tradições e cultura populares, de que o futebol é elemento
constitutivo. No caso do Maracanã reformado, a privatização prevê até mesmo a eliminação de
pista de atletismo, a esclarecer de maneira inquestionável que Copa e Olimpíadas são
apenas um pretexto esportivo para grandes negócios.
Mas, dentre todas as lacunas deste dossiê, certamente a maior é a
ausência de um longo capítulo sobre as lutas e organizações através das quais se
afirmam e constroem enquanto sujeitos coletivos, em todas as cidades, as populações
removidas ou ameaçadas de remoção, os movimentos populares de luta pela moradia, as
organizações de defesa dos direitos humanos, os grupos culturais dos bairros populares,
pesquisadores e centros universitários comprometidos com a realidade das comunidades
pobres deste país, mas também torcedores e esportistas que pretendem reverter a marcha
insensata da elitização e mercantilização do esporte. São estes cidadãos, somos nós que
integramos os Comitês Populares da Copa e das Olimpíadas. Nas 12 cidades que sediarão a
Copa do Mundo de 2014, entidades, movimentos sociais e organizações políticas,
criaram estes comitês e formam a Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa para se opor
às violações, abusos e ilegalidades relacionadas à realização dos megaeventos
esportivos. Fomos nós que elaboramos este dossiê com nossa luta e nossa decisão de levar
o que está acontecendo ao conhecimento de todos. Somos nós que estamos lutando para
ocupar a cena pública, lugar da Política com letra maiúscula, da Política entendida como
debate público, no espaço público, acerca dos interesses públicos e do destino coletivo de
nossas cidades.
Em todo o país, estamos organizando debates, torneios esportivos,
atos, passeatas, cortejos, mostras de vídeos, cursos de formação, cartilhas,
atividades com operários das obras, articulações com parlamentares, atletas, comentaristas
esportivos, audiências públicas, pareceres jurídicos, abaixo-assinados, manifestos, notas públicas,
entrevistas nos meios de comunicação, artigos e pesquisas.
Somos aqueles que interpelamos, com a gravidade que cabe, as
autoridades governamentais, as corporações privadas, as entidades nacionais e internacionais
que protagonizam o espetáculo do grande negócio. Somos nós que exigimos das
autoridades públicas que cumpram o papel que lhes cabe pela constituição e pela lei de
resguardar o respeito pelos direitos humanos.
Em nossas comunidades e bairros, em nossas reuniões e associações,
em nossas manifestações e ato públicos estamos dizendo não à cidade de
exceção, não à violação de direitos humanos. Estamos certos de que nossa luta crescerá e
que nossa convocação reunirá mais e mais organizações e movimentos coletivos, assim
como reunirá cidadãos individuais desejosos de um país orgulhoso por ter feito dos
megaeventos esportivos uma grande oportunidade para avançar na luta contra a injustiça social
e ambiental e pela justa distribuição dos frutos do trabalho coletivo.
COPA E OLIMPÍADAS COM RESPEITO AOS DIREITOS HUMANOS!
Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa
http://www.portalpopulardacopa.org.br
Email: articulacaonacionalcopa@gmail.com
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Com esta publicação encerramos o trabalho da Dra.Lúcia Capanema sobre a situação nacional dos preparativos para a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016 e a repercussão em relação aos direitos humanos, de onde poderemos tirar lições, advertências e pontos para meditação.
Este trabalho foi uma colaboração do nosso leitor Didi Avelino, norte-riograndense radicado no Rio de Janeiro.
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